O Estado de S. Paulo
É hora de a cúpula militar concordar com
Aziz: os bons das FA devem estar envergonhados
Durou menos de 24 horas a tentativa do
presidente Jair Bolsonaro de usar um fato
verdadeiro, seu quadro de saúde e suas dores, para criar um efeito eleitoral a
seu favor, via internet, fotos e vitimização. Ontem mesmo, o foco, as atenções
e o noticiário já estavam de volta à CPI da Covid e às suas revelações
sobre não mais a já grave inação do governo, mas sobre a sua ação duvidosa, ou
escandalosa, na negociação de vacinas.
Aquela foto de Bolsonaro sem camisa, cheio de fios, num leito hospitalar, não foi divulgada com outra intenção senão política e ilustrou um texto em que ele dá um jeito de dizer que o esfaqueador era do PSOL, “braço esquerdo do PT”, e cometeu um crime não só contra ele, mas “contra a democracia”. Quem é mesmo que ameaça a democracia?! E falou em sua pretensa proposta de “prosperidade”, terminando com o slogan de campanha. Bota campanha nisso!
Ontem, porém, a principal pauta política
foi o depoimento de Cristiano Carvalho à CPI da Covid.
Vem a ser aquele que se dizia representante da empresa americana Davati, agora
admite que apenas “ajudava” e não consegue nem mesmo explicar por que cargas
d’água recebeu auxílio emergencial na pandemia. Pelo visto, R$ 600 por mês era
pouco. Ele queria um “auxílio” de milhões – em dólares.
Que Carvalho é um picareta, seu parceiro
Luiz Paulo Dominghetti também e o tal pastor Amilton Gomes não fica atrás,
ninguém tem dúvida. A grande dúvida é como o Ministério da Saúde abriu sua
portaria, seus gabinetes, seus ouvidos e e-mails para esse tipo de gente.
Inacreditável. Só não mais inacreditável do que o número de coronéis e
tenentes-coronéis envolvidos, de alguma forma, na lambança.
Carvalho confirmou que sabia do pedido de
propina feito por gente graúda da Saúde, como confirmou a sofreguidão do
governo em negociar com a Davati e reuniões no ministério com até oito
autoridades – a maioria delas militares. Militares falam tanto em
“inteligência”, em “informação”, mas na Saúde não consultavam nem o básico: o
Google. Bastavam alguns cliques para abortar qualquer contato com Davati,
reverendo, cabo PM, o tal Cristiano do auxílio emergencial. A não ser que a
intenção fosse outra...
Ao todo, Cristiano citou pelo nome oito
militares, mas acrescentou uma boa pitada de pimenta: a guerra na Saúde não era
entre militares e Centrão e, sim, entre os grupos de Roberto Dias, diretor de
Logística, e do coronel da reserva Elcio Franco, número dois do ministério, com
os militares do general da ativa Eduardo Pazuello se dividindo entre
os dois. Pode uma coisa dessas?
No centro de tudo está Elcio Franco,
conhecido pelos ex-colegas de caserna por ser íntegro e estudioso, mas
estourado, um “galinho de briga”. Até por isso, não chegou ao generalato,
apesar de ser o terceiro da sua turma na Infantaria. Não é pouco. Agora, ele
precisa usar sua disciplina e seu temperamento estourado, não para atacar, mas
para detalhar para a CPI e o povo brasileiro como funcionavam e como podem ser
eliminados os “pixulés” citados por Pazuello ao sair da pasta.
Em qualquer hipótese, os militares da Saúde
não ficam bem nessa foto das vacinas. Ou eram uns bobos, que não entendiam nada
de SUS, pandemia, vírus, curva epidemiológica, vacinas e negociações
internacionais, ou... Bem, a outra hipótese é ainda pior. E as duas confirmam:
Bolsonaro jogou Pazuello na fria, Pazuello atraiu duas dezenas de militares e o
que era uma fria ficou gelada.
É hora de o ministro da Defesa e os comandantes da Aeronáutica, da Marinha e do Exército jogarem fora a nota desaforada contra o senador Omar Aziz, presidente da CPI, para concordar plenamente com ele: “Os bons das Forças Armadas devem estar muito envergonhados”. Se não estão, deveriam...
Nenhum comentário:
Postar um comentário