O Globo
Jair Bolsonaro lançou uma desculpa
esfarrapada para tentar fugir da polícia. Com medo de ter sido gravado, o
capitão desistiu de negar a conversa com o deputado Luis Miranda. Mas informou
que não pode ser investigado por prevaricação no escândalo das vacinas.
“O que eu entendo é que prevaricação se
aplica a servidor público, não se aplicaria a mim”, disse, na segunda-feira.
Espera-se que o autor da tese não seja André Mendonça, o ministro
“terrivelmente evangélico” que ele acaba de indicar ao Supremo.
O Código Penal considera funcionário
público “quem, embora transitoriamente ou sem remuneração, exerce cargo,
emprego ou função pública”. Isso inclui o presidente, que deveria se considerar
o servidor número um do país.
No início do mandato, Bolsonaro chegou a encenar esse papel. Desfilou de crachá funcional e almoçou no bandejão do Planalto. A marquetagem deixou de interessar quando a PF bateu à porta.
Em depoimento à CPI, Luis Miranda disse ter
avisado o presidente de que havia maracutaia na negociação da Covaxin. De
acordo com o relato, Bolsonaro culpou seu líder na Câmara, mas não tomou as
providências devidas. Na segunda-feira, ele arranhou outra versão para o
episódio: “Os papéis que ele deixou lá eu passei pra frente isso daí”.
A frase de que presidente não é servidor
expõe mais que uma estratégia de defesa mambembe. Também ajuda a entender a
mentalidade de Bolsonaro. O capitão considera que o Estado existe para
servi-lo, não o contrário. Sempre pensou assim, desde os tempos de baixo clero.
Antes da descoberta da rachadinha, o então
deputado declarou que usava o auxílio-moradia para “comer gente”. Ele tinha
apartamento próprio em Brasília, mas não se envergonhava de embolsar um
adicional de R$ 6 mil.
Na Presidência, Bolsonaro continuou a
confundir o público com o privado. Já interferiu na PF, na Receita e no Coaf
para blindar o filho mais velho. Depois tentou emplacar o caçula como
embaixador em Washington.
No sétimo mês de governo, ele forneceu uma
nova definição para o velho vício do patrimonialismo: “Pretendo beneficiar um
filho meu, sim. Se puder dar filé-mignon pro meu filho, eu dou”.
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