Valor Econômico
No Egito, sítios históricos; em Brasília,
contas a pagar
No país onde até o passado é incerto, como
bem definiu o ex-ministro da Fazenda Pedro Malan, cotidianamente aparecem do
nada contas bilionárias para o Tesouro Nacional pagar. Se já não bastasse o
fato de as contas do setor público, considerando-se todas as suas esferas
(União, Estados e municípios) e poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário),
serem estruturalmente deficitárias, uma vez que o volume de impostos recolhidos
é insuficiente para bancar as despesas, de tempos em tempos o cidadão é
surpreendido com a informação de que se descobriu, em algum lugar, um
"esqueleto" no armário, uma nova fatura bilionária a ser paga.
No Egito, há mais de um século arqueólogos surpreendem com a descoberta de sítios históricos que ajudam a contar a história da humanidade. Uma missão arqueológica descobriu, em abril deste ano, uma cidade soterrada perto de Luxor, no Sul do Egito. Calcula-se que se trata de um sítio urbano cujo florescimento se deu há três mil anos. A descoberta é considerada uma das mais importantes desde a tumba de Tutancâmon, há quase um século, e está sendo chamada de "a maior cidade antiga do Egito" e, também, de "a cidade dourada perdida". Em comunicado oficial, a equipe de escavação informou que a cidade estava "perdida sob as areias".
Em Brasília, advogados vivem para
"descobrir" que, em algum momento, o Estado brasileiro fez algo
errado contra grupos específicos da sociedade e, por isso, precisa ressarci-los
dos prejuízos sofridos. Os processos correm na Justiça e, de repente, contas de
valor indizível são apresentadas aos governantes (leia-se, aos contriibuintes)
pelo Poder Judiciário.
Não é preciso ter o dom da sagacidade para
presumir que são aquinhoados, nesses processos, os grupos que têm dinheiro para
bancar os melhores advogados do país. Ademais, há "esqueletos" de
toda natureza sendo "escavados" no Planalto Central, alguns, sequer
chegam a ser conhecidos do grande público _ um exemplo: reconhecimento de
diferenças salariais e de benefícios a serem pagas a funcionários públicos de
forma retroativa e corrigidos pela variação da inflação _ e, outros, são
decididos no âmbito administrativo, ou seja, não passam nem pelo crivo da
Justiça.
Uma particularidade chama a atenção e exige
revisão urgente para aumentar as chances de o erário público não perder de
lavada as ações judiciais movidas contra a União: quem julga uma boa parte dos
processos é parte interessada em muitas das ações, logo, nem goza da necessária
independência para analisar os casos nem do incentivo para diremir as
consequências, para a sociedade como um todo, de sentenças bilionárias
aprovadas contra o Tesouro Nacional.
Os números oficiais mostram que, de 2018 a
2022, a despesa com sentenças judiciais (precatórios) saltou de R$ 36 bilhões
para R$ 89,1 bilhões. Trata-se de um salto de 102% (ver gráfico). Como
precatório é uma despesa primária, isto é, obrigatória, deve ser pago porque
não recurso possível, uma vez que a decisão é judicial e, portanto, definitiva.
Se aplicado o teto constitucional de gastos, instituído na Constituição desde
2017, o gasto possível dessa rubrica estaria limitado a cerca de R$ 40 bilhões.
O governo propôs mudança na Constituição
para se ter regra permanente de pagamento dos precatórios. A ideia seria
compatibilizar a despesa de precatórios com a principal âncora fiscal do país
(o teto de gastos). Na regra atual, parcela de sentença judicial superior a 15%
do montante total dos precatório, a União pagaria 15% à vista e o restante, em
5 parcelas. O governo mandou proposta para mudar a Constituição para instituir
regra permanente para o pagamento dessas despesas. Será que é o caso de prever
regra permanente para algo transitório? Há em Brasília que a recente explosão
de sentenças está intimamente ligada ao fato de que, na pandemia, na
"solidão" de seus lares, juízes aumentaram a tendência de julgar favoravelmente
ações que exigem pagamentos bilionários à União.
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