- O Estado de S. Paulo
O primeiro foi deposto, cassado e preso por corrupção. O segundo, embora breve, dá vergonha de lembrar. O terceiro pediu intervenção militar e conseguiu. São os três presidentes da Câmara dos Deputados da legislatura que consolidou o parlamentarismo oculto no Brasil. Presidentes caem, mas ela segue mandando – com suas dezenas de investigados, da base à cúpula. Seu próximo feito é escolher o chefe do Executivo.
Não adianta Rodrigo Maia (DEM-RJ) dizer que pediu “apenas” soldados da Força Nacional a Michel Temer. Seu pedido deu a desculpa para um presidente isolado no palácio colocar 1,2 mil homens do Exército na Esplanada a fim de dissolver as manifestações que pedem sua renúncia – e fazer sabe-se lá mais o quê. No papel, a tal Garantia da Lei e da Ordem (GLO) prevê de “dissuasão” a ações de “inteligência” militar. Arapongagem.
Se estava em seus planos virar presidente em uma eleição indireta por seus pares, Maia não precisa mais se preocupar. Ele já entrou para a história, talvez não como sonhasse, mas entrou.
O presidente da Câmara não precisava ter feito o pedido de intervenção para ajudar o aliado acuado no Planalto. Não se sabe qual história lhe contaram, mas o presidente da República tem prerrogativa para invocar a GLO por iniciativa própria. Obviamente, Temer preferia dividir a responsabilidade com o Congresso. É assim que funciona em um parlamentarismo oculto. Envolver a todos nas decisões mais comprometedoras é uma forma de comprar lealdades quando as malas da JBS escasseiam.
Temer já tinha entrado para a história. Acrescentou, agora, um parágrafo que vai desmentir todas as descrições que o pintavam como hábil negociador e político tolerante. Bastou um pouco de pressão e cheiro de gás lacrimogênio para revelar-se. Por comparação, vai ficar abaixo de Fernando Collor. Quando estava na mesma situação que Temer, o ex-presidente também chamou a tropa de choque. A diferença é que a sua não usava farda.
Não apenas por isso. Em toda a investigação do esquema PC Farias que abastecia as malandragens colloridas, nunca assistiu-se ao vídeo de um aspone presidencial arrastando mala de dinheiro pela calçada após se encontrar com o preposto de um empresário que se notabilizou por fazer churrasco com recurso público. Tampouco ouviu-se falar de alguém que devolvesse R$ 500 mil à polícia com desconto de R$ 35 mil– uma espécie de CPMF da propina.
Seja qual for o destino que a Justiça der a Temer, o Congresso seguirá mandando. Seus próceres articulam celeremente para ver quem será o próximo títere movido pelos cordéis parlamentares. Não que com isso estejam traindo o atual. É apenas precaução. Vai que Temer resolva engolir as próprias palavras e renunciar. Ou que o Tribunal Superior Eleitoral acorde e decida cassá-lo.
Mesmo que o pior dos seus pesadelos se realize e os congressistas sejam obrigados a aturar uma eleição direta para presidente, sabem que, passado o susto, tampouco é motivo para preocupação. A eleição não abrangeria seus mandatos, e o eleito teria que compartilhar o poder com o Congresso que esta aí.
Fosse quem fosse o eleito, ao final das comemorações ele teria que cooptar uma base parlamentar para conseguir governar. E, por mais moralizante que venha a ser seu discurso eleitoral, terá que recorrer aos métodos de sempre: lotear cargos e nacos do orçamento federal. Talvez não sobre tanta picanha por algum tempo, mas 2018 está logo ali na esquina e outros fornecedores de recursos não-contabilizados de campanha aparecerão.
A crise é do sistema político. Quem pode mudá-lo é quem mais se beneficia dele. Mudam os carregadores, as malas não.
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