terça-feira, 2 de novembro de 2021

O que a mídia pensa - Editoriais / Opiniões

EDITORIAIS

A perigosa permanência do lavajatismo

O Estado de S. Paulo

A Lava Jato chegou ao fim, mas o espírito lavajatista ainda existe. Para combater a corrupção, seria permitido e autorizado usar todos os meios disponíveis, inclusive os ilegais

A Lava Jato chegou ao fim, mas seu espírito permanece. Para combater a corrupção, seria permitido usar todos os meios, inclusive os ilegais.

Toda operação de investigação deve ter início, meio e fim. Em vez de efetividade, a eventual perpetuidade de uma operação revelaria sua ineficiência. O fim da Lava Jato não é, portanto, nenhum problema. Na verdade, depois de sete anos, com 80 fases realizadas, era passada a hora de a famosa operação acabar. Por óbvio, terminou a Lava Jato, mas isso não significa que o Estado passe a ser omisso na investigação de malfeitos e suspeitas de crime. Basta ver o que a CPI da Covid descobriu em relação a negociações de vacinas no entorno do Ministério da Saúde. Não pode haver impunidade.

A Lava Jato chegou ao fim, mas – eis ponto que merece ser destacado – continua existindo o que se pode chamar de espírito lavajatista. Segue viva uma específica mentalidade que vai muito além do princípio republicano de que todos são iguais perante a lei e, portanto, todos devem responder à luz da lei por seus atos. Partindo de uma ideia bastante discutível (com bons argumentos de apoio e outros de refutação) – a de que a corrupção seria o grande problema do País, causa e estímulo de todas as mazelas da vida nacional –, essa visão pretende justificar uma conclusão inteiramente antirrepublicana: a de que, para combater a corrupção, seria permitido e autorizado utilizar todos os meios disponíveis, também os ilegais.

Haveria uma guerra entre corruptos e heróis. E, nessa guerra, os heróis não poderiam ser privados de nenhum meio, uma vez que os corruptos são ardilosos, poderosos e incrivelmente capazes de se perpetuar.

Trata-se, a rigor, de um raciocínio profundamente incoerente. Para combater ilegalidades, seria possível cometer novas ilegalidades. Por óbvio, tal proposta desrespeita a Constituição, que exige fins adequados e meios igualmente adequados. Num Estado Democrático de Direito, os fins não justificam os meios.

No entanto, a mentalidade lavajatista (também seria possível chamá-la de jacobina) reveste-se de outras cores, mais sutis. Dificilmente alguém vai dizer, com todas as letras, que o Ministério Público deve, para combater a corrupção, cometer ilegalidades. A tática tem tons aparentemente civilizatórios, ou mesmo constitucionais. Por exemplo, em vez de pleitear a prática impune de ilegalidades, defende-se uma autonomia irrestrita do Ministério Público, a impedir qualquer controle sobre eventuais ilegalidades de procuradores. Sob o manto da autonomia, não haveria ato ilegal.

A tática ficou especialmente visível na tramitação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 5/21, a respeito do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP). Note-se que o conselho já existe desde a reforma do Judiciário, com a Emenda Constitucional (EC) 45/2004. Ou seja, a PEC 5/21 não vinha criar um novo controle, mas apenas dar alguma efetividade ao que já existe. No entanto, valendo-se da mentalidade lavajatista, isto é, recorrendo à ideia de que o combate à corrupção exigiria procuradores inteiramente irresponsáveis sobre seus atos, setores do Ministério Público conseguiram inviabilizar o debate sobre o tema.

Em boa medida, a PEC 5/21 foi rejeitada pelo plenário da Câmara pelo modo atropelado com que a presidência da Casa tratou o assunto. No entanto, seria ingenuidade ignorar como procuradores e algumas entidades privadas de natureza associativa conseguiram impor, uma vez mais, a ideia de que controle sobre a legalidade dos atos do Ministério Público seria sinônimo de mais impunidade e menos efetividade investigativa.

É parte essencial das liberdades de pensamento e opinião que cada um possa eleger livremente o que considera ser o principal problema nacional. Exercendo sua autonomia individual, muitas pessoas veem a corrupção como o grande mal a ser combatido no País. Outra coisa, que causa muitos danos e injustiças – pois autoriza o uso arbitrário e abusivo do poder estatal –, é pretender que, em razão do juízo da gravidade sobre a corrupção, agentes da lei possam atuar impunemente fora da lei. Ninguém, nem mesmo o Ministério Público, está acima da lei.

As vítimas da indiferença

O Estado de S. Paulo

Ao que parece, o evidente crescimento da população que dorme nas ruas, sobrevive de esmolas e faz fila para comprar ossos não incomoda muita gente em Brasília

Qualquer morador das grandes cidades do País que não tenha seus olhos embaçados pela indiferença é capaz de notar o aumento significativo do número de pessoas vivendo nas ruas. Nem as cidades mais ricas do Brasil, como São Paulo e Rio de Janeiro, deixam de expor ao olhar mais sensível este pungente retrato de uma tragédia social.

Os menos desafortunados ainda conseguem se abrigar em barracas instaladas em praças e calçadas, o que ao menos lhes assegura um mínimo de privacidade e alguma proteção contra intempéries do clima, insetos e até agressões. A grande maioria dos desabrigados, porém, só pode contar com o que encontra pelo caminho, além das doações que recebe dos cidadãos mais empáticos e de instituições de amparo humanitário, sobretudo as de natureza religiosa.

A bem da verdade, a chaga dos sem-teto não é nova e representa uma das faces mais perversas da desigualdade que há séculos marca os brasileiros lançados na extrema pobreza como cidadãos de segunda classe, como se desprovidos fossem dos direitos mais comezinhos que são assegurados aos cidadãos mais abastados – ou apenas menos miseráveis. A pandemia de covid-19 e a grave crise econômica que dela derivou só ampliaram a dimensão desta tragédia de muitas causas e múltiplos desdobramentos.

Milhões de brasileiros perderam emprego e renda da noite para o dia em decorrência da queda abrupta da atividade econômica. A fim de conter a velocidade de disseminação do coronavírus e reduzir o número de mortes, não havia alternativa a governantes responsáveis a não ser impor medidas que assegurassem o distanciamento entre as pessoas. O comércio não essencial, as empresas e as escolas tiveram de ser fechados por longos períodos.

Em um primeiro momento, diante de uma crise sem precedentes, o governo federal e o Congresso fizeram o mínimo: instituíram um auxílio emergencial que permitiu que a população mais vulnerável não morresse de fome. Contudo, era preciso ter ido muito além da elementar obrigação de garantir a sobrevivência dos mais afetados pela crise sanitária e econômica.

Estivessem genuinamente preocupados com o bem-estar dos cidadãos e o futuro do País, o presidente Jair Bolsonaro e o Congresso deveriam estar dedicados dia e noite a encontrar soluções para a crise e transmitir um mínimo de esperança para milhões de cidadãos em insegurança alimentar. Mas, ao que parece, o evidente crescimento da população que dorme nas ruas, sobrevive de esmolas e faz fila para comprar ossos não incomoda muita gente em Brasília.

Bolsonaro só tem olhos para a reeleição – não para fazer o bem pelos seus governados, pois é sabidamente incapaz disso, mas para manter-se no poder e, assim ele espera, retardar a responsabilização política e jurídica por sua série de malfeitos. Já seus suseranos do Centrão só estão interessados em encontrar formas de explorar o despreparo e a fraqueza do presidente a fim de dragar cada vez mais recursos do Orçamento com o único objetivo de obter ganhos pessoais, tanto para fins eleitoreiros como para enriquecimento ilícito.

É fundamental destacar que Brasília só é indiferente à tragédia que se abate sobre o Brasil além de seus muros de mármore porque grande parte da sociedade também se mostra indiferente. Nem Bolsonaro nem os parlamentares que lá estão tomaram o poder à força. A consciência de cada cidadão sobre sua parcela de responsabilidade, portanto, é crucial para pôr fim à infâmia.

A superação da tragédia social haverá de vir de um governo e de um Legislativo fiscalmente responsáveis. Não porque a responsabilidade fiscal seja um fim em si mesma, um fetiche de economistas, mas porque sem ela tudo é falácia, tudo é bravata populista. Não há milagre. O País precisa de políticas sérias para voltar a crescer de forma sustentável e criar empregos. É preciso cortar gastos alheios às necessidades mais prementes da sociedade. Não há saída além das reformas estruturais e de investimentos em saúde, educação e infraestrutura.

As eleições do ano que vem representarão a escolha entre insistir em falácias que mantêm o Brasil cronicamente aferrado ao atraso – cujo resultado é a miséria de milhões de concidadãos que vagam pelas ruas em busca de alimento e abrigo – ou pavimentar o caminho que poderá levar a um futuro mais auspicioso. É isso que está em jogo.

Fiasco em Roma

Folha de S. Paulo

Com isolamento no G20 e agressões a jornalistas, Bolsonaro produz novo vexame internacional

Na agenda dos líderes mundiais que se reuniram para o encontro de cúpula realizado em Roma no fim de semana, havia assunto para todos que tivessem alguma contribuição a oferecer. Não era este o caso de Jair Bolsonaro.

Sua participação na reunião do G20, grupo que congrega as maiores economias do planeta, serviu apenas para manchar ainda mais a combalida reputação internacional do Brasil, reforçando o isolamento a que sua gestão ruinosa conduziu o país.

Sem ter aproveitado a oportunidade para dialogar com os demais chefes de Estado presentes, restou ao presidente brasileiro o papel de figurante nos encontros oficiais, vagando pelos salões como um bufão, o olhar perdido em busca de alguém para conversar.

Como mostraram as imagens constrangedoras que vieram a público, Bolsonaro foi ignorado até quando tentou puxar assunto com os garçons. O melhor que conseguiu foram dois minutos de interação com o presidente da Turquia, Recep Erdogan, em que contou lorotas sobre a situação do país.

Sentado à frente do diretor-geral da Organização Mundial da Saúde, Tedros Ghebreyesus, o brasileiro debochou das acusações que sofreu no Brasil por causa de sua negligência no enfrentamento da Covid-19. Seu ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, gargalhou a seu lado.

Bolsonaro deixou quatro vezes a embaixada brasileira em Roma, onde se hospedou, para passear pela cidade e confraternizar com pequenos grupos de admiradores que foram vê-lo. Em toda parte encontrou também manifestantes que expressaram reprovação a seu desgoverno, inclusive estrangeiros.

No domingo (31), seguranças brasileiros e italianos que acompanhavam sua comitiva agrediram e tentaram intimidar jornalistas brasileiros que cobriam mais um de seus passeios e tentavam se aproximar dele para fazer perguntas.

Bolsonaro ignorou os questionamentos dos repórteres, chegando a hostilizar um deles, e assistiu impassível à truculência dos agentes que investiram contra os profissionais, encerrando a caminhada após menos de dez minutos.

Houve mais tumulto nesta segunda-feira (1º), quando ele foi receber uma honraria em Anguillara Vêneta, cidade em que um de seus bisavós nasceu. Na vizinha Pádua, por onde também passou, a polícia usou jatos de água para dispersar uma manifestação de opositores.

Felizmente, o presidente desistiu de participar da reunião de cúpula sobre a crise do clima que se iniciou em Glasgow, na Escócia. Seu descaso com o meio ambiente tornou o encontro especialmente desafiador para a diplomacia brasileira. Pelo que se viu na Itália, sua presença só serviria para atrapalhar.

Escolher morrer

Folha de S. Paulo

Legalização da eutanásia avança em vários países, mas Brasil parece distante de debate maduro

Martha Sepúlveda tinha um encontro marcado com a morte no último dia 10, mas ele foi cancelado —e contra a sua vontade. Sepúlveda, 51, sofre de esclerose lateral amiotrófica, doença degenerativa incurável e progressiva, que vai paralisando os músculos do paciente.

Por enquanto, ela está bem, sendo ainda capaz de falar e sorrir. Nada indica que irá morrer por causa da moléstia em poucos meses, ou mesmo nos próximos anos.

Mas Sepúlveda vive na Colômbia, único país da América Latina que regulamentou a eutanásia. E Sepúlveda deseja morrer. Para ela, a angústia com o que a doença lhe reserva causa sofrimento intolerável.

Em julho, a Corte Constitucional colombiana revisou o alcance da legislação e passou a autorizar o procedimento também para pacientes não terminais. Abreviar a própria vida com auxílio médico tornou-se assim factível para Sepúlveda.

Na véspera da sessão de eutanásia que já estava marcada, porém, a clínica que a realizaria, por razões que ainda não estão de todo claras, decidiu cancelá-la. Sepúlveda recorreu à Corte Constitucional, que ainda não se pronunciou.

É possível considerar que Sepúlveda se precipita, ou que sua atitude contraria ensinamentos religiosos, mas soa até ofensivo sugerir que a decisão sobre viver ou morrer não cabe exclusivamente a ela. Na Colômbia, a eutanásia, cumpridos os requisitos legais, é um direito.

O número de países que regulamentam o procedimento tem crescido. A Holanda foi pioneira, em 2001. Em seguida vieram Bélgica, Canadá, Colômbia, Coreia do Sul, Espanha, Luxemburgo, Nova Zelândia e várias entidades subnacionais, como os estados de Oregon, nos EUA, e Victoria, na Austrália.

O movimento lembra bastante o da legalização do aborto, que começou em alguns países europeus e se espalhou por todo o mundo. Hoje, praticamente todas as democracias avançadas autorizam a interrupção voluntária da gravidez.

O Brasil, infelizmente, não está entre os países que já começaram a discutir a regulamentação da eutanásia de forma madura. Decerto não estamos no melhor momento para fazê-lo, com Jair Bolsonaro na Presidência e um Congresso de perfil conservador.

Para piorar, a pandemia lançou desconfianças sobre o sistema de saúde, especificamente sobre como ele lida com a morte. Não é, portanto, o caso de insistir agora, mas esse não é um debate que possa ser adiado indefinidamente.

Brasil se tornou uma República da Rachadinha

O Globo

Consagrou-se o uso de aumentativos para batizar grandes escândalos brasileiros de corrupção: mensalão, petrolão etc. No país sob Bolsonaro, porém, a modalidade de corrupção que tomou as manchetes é identificada no diminutivo: rachadinha. Apesar de o nome sugerir uma roubalheira miúda, trata-se de prática de impacto nada desprezível, disseminada por vários níveis do Legislativo, como demonstram não apenas os casos associados ao clã Bolsonaro, mas também a denúncia recente contra o gabinete do senador Davi Alcolumbre.

De acordo com reportagem na revista Veja, seis assessoras de Alcolumbre entregavam cartão e senha bancários a um alto funcionário do gabinete do senador, que lhes devolvia pequena parte do salário. Uma delas afirmou receber R$ 1.350 dos R$ 14 mil pagos no contracheque. Outra disse embolsar R$ 800 de R$ 5 mil. Ao todo, a reportagem estima em R$ 2 milhões o desvio de verbas no esquema, que diz ter funcionado desde 2016 até março. Alcolumbre nega conhecimento da maracutaia, que atribuiu ao chefe de gabinete.

A denúncia é em tudo similar às acusações que pesam contra o senador Flávio Bolsonaro, quando deputado na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj) — o famigerado Caso Queiroz —, ou contra o vereador Carlos Bolsonaro na Câmara Municipal carioca. Não são os únicos. Trata-se de hábito arraigado. Funciona no país uma espécie de República da Rachadinha.

Há no Brasil mais de 58 mil parlamentares, entre senadores, deputados federais, estaduais e vereadores. Um senador como Alcolumbre tem direito a R$ 300 mil mensais para contratar os assessores que bem entender. Deputados federais fazem jus a R$ 112 mil de “verba de gabinete”. Os estaduais e vereadores também costumam ter acesso a recursos generosos, embora nem sempre a verba fixa. Na Alerj, há 2.368 assessores para 70 deputados. Cada gabinete pagou em média R$ 189.400 em salários em agosto. Cada um dos 51 vereadores cariocas tem a seu alcance a nomeação de 20 funcionários.

Em maior ou menor grau, a situação se repete em todo o país. Difícil haver uma Casa Legislativa em que funcionários-fantasmas não sejam usados para o desvio desavergonhado de verbas. Basta fazer uma conta banal de multiplicação para perceber que, apesar do nome no diminutivo, a rachadinha tem poder de corrosão superlativo, equivalente a escândalos bilionários.

É inaceitável que isso continue assim. Não basta apenas punir este ou aquele caso que venham à tona nas denúncias da imprensa, por mais que isso também seja necessário. É preciso, antes de tudo, reduzir ao mínimo as nomeações à disposição dos parlamentares e estabelecer critérios rígidos para contratação de assessores, com base em mérito, conhecimento técnico e formação acadêmica. Só será possível acabar com as rachadinhas fechando os caminhos usados para a contratação dos funcionários-fantasmas.

A descoberta de grupos organizados que desviam bilhões do Estado costuma revoltar a opinião pública. Pois a corrupção miúda também deveria causar a mesma indignação. Não apenas pela desonestidade intrínseca daqueles que a praticam, mas também porque os pequenos desvios se somam para totalizar milhões ou bilhões. Como numa floresta de árvores frondosas, é idêntico o impacto de machados e motosserras ou dos pequenos cupins que carcomem a madeira por dentro.

Ações contra o passaporte sanitário afrontam os fatos e o bom senso

O Globo

Com o avanço da vacinação e o “liberou geral” das normas de prevenção contra a Covid-19 em todo o país, a adoção do passaporte sanitário se tornou instrumento eficaz de controle da pandemia. Cada vez mais, a comprovação da vacinação é exigida por empresas, repartições públicas, atrações turísticas, arenas esportivas e outros lugares onde há aglomerações. Nada muito diferente do que ocorre no exterior, onde a iniciativa tem contribuído para a retomada das atividades.

Na contramão dos fatos e do bom senso, parlamentares bolsonaristas e militantes antivacina têm lançado ofensiva contra o passaporte sanitário, contestando a obrigatoriedade da vacinação. Como mostrou reportagem do GLOBO, pelo menos 29 projetos de lei com esse objetivo tramitam na Câmara (quatro) e em algumas das maiores Assembleias Legislativas do país, como as do Rio (nove) e de São Paulo (seis). Em argumentações que vão do apenas absurdo ao flagrantemente ofensivo, parlamentares alegam que o passaporte promove um “apartheid sanitário”, fazem comparações estapafúrdias com medidas adotadas pelo nazismo e invocam o artigo 5º da Constituição, que trata do direito à liberdade.

Curioso é que a própria Câmara passou a exigir que os deputados apresentem prova de vacinação. Na verdade, os parlamentares ecoam o discurso desvairado do presidente Jair Bolsonaro, que não se vacinou e é um crítico contumaz do passaporte sanitário. Ontem mesmo o ministro do Trabalho, Onyx Lorenzoni, editou portaria que proíbe empregadores de exigir carteira de vacinação dos empregados. Recentemente, o Ministério da Educação, impregnado por essa ideologia retrógrada, proibiu universidades federais de exigir a comprovação.

Ainda que os projetos sejam aprovados, é improvável que a iniciativa prospere. Juízes de primeira instância já deram liminares para barrar o passaporte sanitário sob o argumento de que a medida fere o direito de ir e vir, mas todas foram derrubadas no Supremo, cujo presidente, ministro Luiz Fux, reafirmou a prerrogativa de governadores e prefeitos para tomar essas decisões. O próprio STF, que retoma atividades presenciais neste mês, exige a comprovação para acesso à Corte.

Depois de um início claudicante, principalmente devido à compra tardia de imunizantes pelo governo, a campanha de vacinação engrenou, mas ainda estamos longe de atingir os percentuais que conferem a imunidade coletiva. Apenas perto de 55% da população está com a vacinação completa, percentual insuficiente para deter a circulação do vírus. A bem-vinda queda no número de infectados e mortos não é garantia de que a pandemia esteja controlada. Num momento em que governadores e prefeitos, de forma açodada, liberam máscaras e permitem estádios com capacidade máxima, o passaporte sanitário ganha importância. A liberdade invocada pelos críticos deve ser vista pela ótica coletiva. Não existe liberdade para que alguém saia por aí contaminando os outros. Vacina é para o bem de todos, inclusive dos que a recusam.

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