À medida que avançamos, o Conselho de Segurança
enfrenta uma série de desafios que destacam a inadequação de seu modelo atual.
A ascensão de novos atores globais, incluindo economias emergentes e potências
regionais, tem ampliado a disparidade entre a composição do Conselho e a
distribuição real do poder. Países com influência significativa, mas não
representados permanentemente, sentem-se sub-representados no órgão de decisão
mais importante da ONU.
Além disso, a natureza dinâmica das ameaças à paz e à segurança internacional exigiu uma resposta mais ágil e flexível do Conselho. Questões como terrorismo, mudança climática, pandemias e conflitos internos demandam abordagens multifacetadas e soluções inovadoras, muitas vezes impossíveis dentro do atual quadro institucional do Conselho de Segurança. Por exemplo, a crise climática, que está se tornando cada vez mais urgente, requer a cooperação internacional em níveis sem precedentes, no entanto, o Conselho, com sua estrutura rígida, muitas vezes lutou para oferecer respostas eficazes e abrangentes a essas ameaças, sem obter sucesso.
Desde 1945, os membros permanentes do Conselho
de Segurança usaram o veto mais de 200 vezes, com a Rússia e os Estados Unidos
sendo os países que mais recorreram a esse mecanismo. Embora o poder de veto
dos membros permanentes tenha sido concebido como um mecanismo para evitar
ações unilaterais que poderiam comprometer a estabilidade global, o uso do veto
de forma unilateral, muitas vezes paralisou o Conselho e impediu a adoção de
medidas necessárias para proteger civis em situações de crise, como observado
em conflitos na Síria, Ucrânia, Sudão do Sul e Gaza. Nesses casos, o impasse
resultante do uso do veto levou a um prolongamento do conflito e ao sofrimento
contínuo da população civil.
Diante desses desafios, várias propostas de
reforma foram apresentadas ao longo dos anos. Uma das sugestões mais comuns é a
expansão do Conselho de Segurança para incluir novos membros permanentes e não
permanentes, a fim de refletir melhor a diversidade e a distribuição do poder
global. Essa expansão poderia incluir países importantes geopoliticamente, como
Brasil, Índia, Japão, Alemanha e África do Sul, como membros permanentes, além
de aumentar o número de membros não permanentes para garantir uma representação
mais equitativa de todas as regiões do mundo.
No entanto, a implementação dessas mudanças
enfrenta desafios significativos, incluindo a necessidade de consenso entre os
membros existentes e a possível resistência de estados que temem uma diluição
de seu próprio poder. Ban Ki-moon, ex-secretário-geral da ONU, afirmou: "A
reforma do Conselho de Segurança é uma necessidade urgente. A
representatividade é fundamental para a legitimidade e eficácia da ONU”.
Segundo um relatório do International Peace Institute, "A inclusão de
novas potências emergentes no Conselho de Segurança poderia trazer uma
perspectiva mais global e melhorar a velocidade de resposta às crises
contemporâneas."
Além da questão da representação, há um
crescente consenso sobre a necessidade de reformar os procedimentos e métodos
de trabalho do atual Conselho, isso incluiria tornar o processo decisório mais
transparente e inclusivo, envolvendo mais ativamente países não membros e
organizações da sociedade civil em discussões e deliberações do Conselho.
Também é essencial fortalecer a cooperação entre o Conselho de Segurança e
outras agências e órgãos da própria ONU, bem como com organizações regionais e
não governamentais, para abordar os fatores subjacentes aos conflitos e
promover uma paz mais duradoura. Por exemplo, a cooperação estreita com
agências de ajuda humanitária pode garantir uma resposta mais coordenada e
eficaz às crises humanitárias resultantes de conflitos armados.
Apesar do consenso sobre a necessidade de
reforma, a questão em si permanece altamente controversa e politicamente
sensível, os interesses divergentes dos membros permanentes, juntamente com a
relutância de alguns Estados-membros em renunciar a privilégios e prerrogativas
há décadas estabelecidas, têm dificultado o progresso e postergado
indefinidamente uma solução. No entanto, a inação não é uma opção diante dos
desafios urgentes que enfrentamos como comunidade global. É essencial que os
Estados-membros trabalhem em conjunto para superar suas diferenças e encontrar
soluções que fortaleçam a capacidade do Conselho de Segurança de cumprir sua
missão fundamental de manter a paz e a segurança internacionais, como veremos
na proposta de reformulação a seguir:
Proposta para um Novo Conselho de Segurança da
ONU
Composição do Conselho:
1. Membros Permanentes:
-
Expansão para incluir novas potências emergentes: Brasil, Índia, Japão,
Alemanha e África do Sul.
- Os
membros permanentes atuais: Estados Unidos, Rússia, Reino Unido, França e China
permanecem.
2. Membros Não Permanentes:
-
Aumento do número de membros não permanentes de 10 para 15, totalizando 20
membros não permanentes.
- Distribuição regional equitativa para garantir representação global.
Processo de Votação:
1. Resoluções:
- As
resoluções do Conselho de Segurança exigem a aprovação de pelo menos dois
terços dos membros (20 dos 30 membros).
- As
resoluções devem ter a maioria dos votos de cada grupo de membros: pelo menos 5
dos 10 membros permanentes e 10 dos 20 membros não permanentes.
2. Voto de Veto:
- Os
membros permanentes mantêm o poder de veto, mas com algumas modificações:
-
Para que um veto seja válido, deve ser apoiado por pelo menos dois membros
permanentes.
- Um
único membro permanente não pode vetar uma resolução sozinho; deve haver
consenso entre pelo menos dois membros para vetar.
- Um
membro permanente que deseja vetar uma resolução deve fornecer uma
justificativa por escrito, que será discutida publicamente antes da votação.
3. Votação de Emergência:
- Em
casos de emergências globais (como crises humanitárias, genocídios ou desastres
naturais de grande escala), uma votação de emergência pode ser convocada.
- Para
aprovar uma resolução de emergência, é necessário um apoio de três quartos dos
membros (23 dos 30 membros).
-
Nestes casos, o veto dos membros permanentes requer consenso de três membros
permanentes para ser válido.
Participação e Transparência:
1. Inclusão de Países Não Membros:
- Os
países diretamente afetados pelas questões discutidas devem ter o direito de
participar das deliberações, mesmo que sem direito a voto.
-
Organizações da sociedade civil e regionais relevantes devem ser convidadas
para fornecer informações e perspectivas durante as deliberações.
2. Transparência:
- Todas
as sessões do Conselho de Segurança devem ser transmitidas ao vivo e gravadas,
exceto em casos de segurança nacional altamente sensíveis.
- As
justificativas para vetos e abstenções devem ser publicadas juntamente com as
resoluções e atas das reuniões.
3. Comitês Especializados:
-
Criação de comitês especializados para questões específicas (por exemplo,
mudança climática, terrorismo, pandemias), compostos por especialistas e
representantes de países afetados.
- Os
comitês devem fornecer recomendações e relatórios detalhados ao Conselho de
Segurança para apoiar a tomada de decisões informadas.
Fortalecimento da Cooperação:
1. Cooperação com Outras Agências da ONU:
-
Fortalecer a colaboração com outras agências da ONU (como o UNHCR, OMS, UNICEF)
para garantir uma resposta coordenada e abrangente às crises.
- As
agências da ONU devem ter assentos consultivos no Conselho de Segurança para oferecer
propostas e atualizações sobre suas áreas de especialização.
2. Parcerias Regionais:
-
Incentivar a cooperação com organizações regionais (como a União Africana,
União Europeia, Mercosul, ASEAN) para abordar conflitos e crises regionais de
maneira mais eficaz.
-
Representantes dessas organizações regionais devem participar das deliberações
do Conselho quando questões regionais estiverem em pauta.
Implementação e Avaliação:
1. Fase Piloto:
-
Implementar as mudanças propostas em uma fase piloto de 2 anos para avaliar sua
eficácia e identificar áreas de melhoria.
-
Realizar revisões trimestrais durante a fase piloto para ajustar os
procedimentos conforme necessário.
2. Avaliação Contínua:
-
Estabelecer um comitê independente de avaliação composto por acadêmicos,
ex-diplomatas e representantes de ONGs para monitorar e avaliar o desempenho do
novo Conselho de Segurança.
-
Publicar relatórios anuais sobre a eficácia, transparência e representatividade
do Conselho reformado.
A grande maioria dos países tem convicção de que
a reforma do Conselho de Segurança da ONU é essencial para fortalecer a
governança global e enfrentar os desafios emergentes do novo século. Ao
expandir sua representação, reformar seus métodos de trabalho e ampliar sua
agenda para abordar questões emergentes, o Conselho poderá desempenhar um papel
crucial na promoção da paz, da estabilidade e do desenvolvimento sustentável em
todo o planeta.
No entanto, alcançar esses objetivos exigirá um
compromisso renovado e uma colaboração construtiva entre os estados-membros, essa
tarefa é um desafio complexo e multifacetado, mas também é uma oportunidade
única para fortalecer a governança global e construir um mundo mais seguro, justo
e pacífico para as gerações futuras. Com determinação e cooperação
internacional, podemos moldar as Nações Unidas como um verdadeiro baluarte da
paz entre as nações.
Cláudio Carraly, advogado, ex-secretário
executivo de Direitos Humanos de Pernambuco
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