Ranier Bragon, Laís Alegretti – Folha de S. Paulo
BRASÍLIA - A Câmara dos Deputados aprovou em segundo turno nesta terça-feira (25) o texto-base da chamada PEC do Teto dos gastos, que limita, por 20 anos, as despesas do governo à inflação oficial dos 12 meses anteriores. A medida é a prioridade do governo Michel Temer no Congresso em 2016.
O placar mostrou 359 votos favoráveis, 116 contrários e 2 abstenções. No primeiro turno, no dia 10, 366 deputados votaram a favor da PEC e 111, contra (houve 2 abstenções).
Foram 14 horas de sessão. Às 2h desta quarta (26) a última das seis propostas de alteração apresentadas pela oposição foi derrubada. Agora, a PEC segue para análise do Senado.
Temer se envolveu diretamente na articulação para a aprovação da medida, realizando um jantar para mais de 200 parlamentares antes da votação em primeiro turno, no Palácio da Alvorada, e participando de um segundo na casa do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), nesta segunda (24). O presidente da República ainda exonerou ministros nas duas votações para que eles reassumissem temporariamente os mandatos e engrossassem o placar a favor da proposta.
Assim como no início do mês, a oposição tentou esticar ao máximo a sessão, com o objetivo de encerrá-la sem votação, mas acabou vencida. Os ânimos chegaram a se acirrar no início da madrugada. Em discussão com o deputado Paulo Teixeira (PT-SP), que estava de dedo em riste, Rodrigo Maia se exaltou: "Não tenho medo do seu dedo, coloque o seu dedo onde vossa excelência quiser".
PT, PDT, PC do B, PSOL e Rede, além de dissidentes da base de Temer, argumentam que o novo regime fiscal irá cortar investimentos, principalmente nas áreas de educação e saúde.
Já os governistas ressaltaram a visão de que a medida é imprescindível para evitar a falência do Estado e recuperar a confiança na condução da economia. Neste ano, o calculo do governo é fechar suas contas com um rombo de até R$ 170,5 bilhões.
CONGELAMENTO
A proposta de emenda à Constituição restringe as despesas do governo ao IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo) dos 12 meses anteriores, e tem duração de duas décadas, com possibilidade de mudança na forma de limitar os gastos a partir do décimo ano.
O texto final prevê maior folga em saúde e educação. Nessas duas áreas, a correção do piso dos gastos só valerá a partir de 2018, ou seja, o ano base levado em conta para cálculo do quanto poderá ser gasto a mais será 2017, quando se espera que a receita seja mais alta que em 2016.
Além disso, o relatório estabelece ainda que a base de cálculo do piso da saúde em 2017 será de 15% da receita líquida, e não de 13,7%, como previa o texto original.
A mudança permitirá um piso de cerca de R$ 113,7 bilhões na área no ano que vem, ou seja, R$ 10 bilhões a mais do que estava previsto inicialmente.
Apesar disso, os críticos da medida ressaltam que a longo prazo ela representará uma perda gigantesca para esses setores. O deputado Arnaldo Faria de Sá (PTB-SP), por exemplo, diz que haverá uma redução de R$ 808 bilhões no dinheiro da área assistencial nos 20 anos de duração do congelamento.
Magistrados também criticam a proposta de Temer sob o argumento principal de que ela fere a regra constitucional de autonomia entre os poderes.
DEBATE
Assim como na votação em primeiro turno, a oposição bateu na tecla de que a PEC atinge só os pobres pois não afeta o pagamento com juros da dívida pública.
"O governo pode aumentar a despesa com pagamento de juros e serviços da dívida para fazer a alegria de meia dúzia de rentistas e de banqueiros, pode aumentar 500.000% que não há problema nenhum. Enquanto a saúde, a educação, os investimentos públicos da infraestrutura, tudo isso fica condicionado tão somente ao reajuste pela inflação", reclamou o deputado Pepe Vargas (PT-RS), que foi ministro da articulação política de Dilma Rousseff.
Líder de Dilma na Câmara, José Guimarães (PT-CE) reforçou: "Não se faz ajuste desse jeito em nenhum país do mundo. Esse ajuste fiscal penaliza os de baixo, não mexe na despesa financeira da dívida, não mexe em nada, só corta daqueles que precisam das políticas públicas".
"Parem de mentir! Esse dinheiro é de brasileiros que emprestaram", rebateu o relator da PEC, Darcísio Perondi (PMDB-RS). "O dinheiro da dívida interna é dos brasileiros, desde a vovozinha da Caixa ao banqueiro que lucrou, ou o empresário, e eles têm que ser respeitados. Ou vocês querem dar calote?"
Apesar de ser da oposição e de ter se destacado como um dos principais defensores de Dilma, Silvio Costa (PT do B-PE) votou a favor da proposta: "Eu estou votando a favor da PEC pela manutenção do Bolsa Família, pela manutenção do Prouni, pela manutenção do Pronatec, pela manutenção da aposentadoria dos menos favorecidos do Brasil. Eu estou votando a favor da PEC porque eu tenho responsabilidade pública e não sou demagogo".
Manifestantes contrários à aprovação da PEC fizeram protesto na galeria. "Um, dois, três, quatro, cinco, mil, ou para essa PEC ou paramos o Brasil", gritavam.
A sessão chegou a ser interrompida e o presidente da Câmara disse que o ambiente estava "começando a ficar muito ruim", mas os manifestantes puderam continuar nas galerias com o compromisso de não impedirem o andamento da sessão. Maia disse que "não há parlamento sério no mundo" em que o público se manifeste.
FAZENDA
Nesta terça, o Palácio do Planalto divulgou vídeo em que o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, defende a proposta e diz que a aprovação dela coloca o Brasil "em uma rota de crescimento sustentável". No vídeo, Meireles afirma que, se o prazo proposto fosse menor, seria um "esforço grande para morrer na praia".
"Se fizéssemos um prazo muito curto, digamos metade desse, por exemplo, no momento em que a dívida começa a se estabilizar para cair, já estaria terminado o prazo de vigência da PEC. Portanto, o efeito disso na economia seria inócuo. Nós faríamos um esforço grande para morrer na praia", disse.
O ministro disse, ainda, que a aprovação da PEC representa "uma mensagem da maior importância para os agentes econômicos do Brasil".
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