A antecipação do debate eleitoral torna a paz entre aliados, neste momento, desinteressante. Corda tensionada, o poder de barganha se multiplica
Com a oposição extremamente enfraquecida, especialmente depois da diáspora promovida pela criação do PSD, era questão de tempo a transformação da própria base aliada em principal adversária do Palácio do Planalto. Um tempo eleitoral, claro. Com uma base estimada em cerca de 420 deputados, a presidente da República, Dilma Rousseff, deveria ter facilidade para aprovar o que bem entendesse. Nos primeiros anos de governo, noves fora questões de forte cunho ideológico, como a reforma no Código Florestal, o Planalto aprovou o que bem entendeu, enterrou as comissões parlamentares de inquérito (CPIs) que quis e reteve ao máximo o pagamento de emendas parlamentares. Até mesmo a principal pedra no sapato do Orçamento, a definição do salário mínimo, foi removida com uma fixação prévia do índice de reajuste até o fim do governo.
Tudo ia relativamente bem até que... bem. Até que o período pré-eleitoral foi antecipado. Na disputa presidencial, Dilma parece ter diminuído a disposição para um voo solo do aliado e governador de Pernambuco, Eduardo Campos (PSB). O problema é que a movimentação se estendeu, quase que por inércia, às definições estaduais. E elas estão ligadas, diretamente, à atual crise na base aliada. Muito do mantra repetido por peemedebistas e petistas “falta diálogo do Planalto com a base” tem como objetivo manter a relação entre base e governo federal sob tensão.
Existem problemas sérios de diálogo, é verdade, mas a antecipação do debate eleitoral torna a paz entre aliados, neste momento, desinteressante. Corda tensionada, o poder de barganha se multiplica. Sem se esquecer dos interesses individuais, Eduardo Cunha (PMDB-RJ) também cria dificuldades a rodo na Câmara dos Deputados de olho na corrida fluminense, onde o governador, Sérgio Cabral (PMDB), tenta a todo custo evitar que Lindbergh Farias (PT-RJ) entre na disputa contra Luiz Fernando Pezão (PMDB). A cada entrevista concedida, Cunha promete transformar o plenário da Casa Baixa em um campo minado para Dilma. Deixa, assim, um grau de tensão suficiente para colocar em dúvida os benefícios do Planalto em se manter como fiador da campanha de Farias.
Os petistas adotaram estratégia semelhante e o presidente do partido, Rui Falcão, deixou claro que a legenda também merece atenção na costura. O político paulista repetiu o “falta articulação política ao governo”. O recado é claro: se ceder demais ao PMDB nas definições estaduais, o Planalto que se prepare para encarar no PT um adversário no Congresso. A falta de quórum para votar a Medida Provisória da Energia na segunda-feira é mais uma demonstração de que peemedebistas e petistas pretendem jogar com a tensão entre base e governo para colher vantagens nas alianças estaduais em 2014. Na prática, a MP caducar na próxima segunda-feira não significaria problema algum ao governo. Como o texto foi editado no ano passado, poderia ser repetido em nova MP, que passaria a valer a partir de terça-feira, sem deixar lacunas para o consumidor no desconto da conta de luz. A mesma manobra foi utilizada a rodo pelos governos de Fernando Henrique Cardoso e de Luiz Inácio Lula da Silva. Simbolicamente, no entanto, o governo não conseguir levar sua base aliada numa segunda-feira ao Congresso representa demais. Um tensionamento medido a régua para não provocar rupturas.
Não é apenas a disputa no Rio de Janeiro que acende o pavio no parlamento. A situação não é menos tensa no Rio Grande do Sul, onde o PMDB lançará candidato contra o governador Tarso Genro (PT). Nos maiores estados ao sul do país, os dois partidos ainda serão adversários no Paraná, com Roberto Requião (PMDB) e Gleisi Hoffmann (PT), e, provavelmente, em São Paulo, estado em que os nomes das duas legendas ainda estão indefinidos. Em Pernambuco, a chance de uma chapa única também é próxima de zero, mesma realidade da Bahia. No Nordeste, ainda caberá aos petistas cederem espaço para os principais caciques peemedebistas, em Alagoas, com Renan Calheiros; e no Maranhão, com a sucessão de Roseana Sarney. Da mesma forma, Amazonas é um estado onde Eduardo Braga (PMDB) deve contar com o apoio petista, e no Pará e no Ceará, Jader Barbalho e Eunício Oliveira, respectivamente, também pressionam por apoio. Os peemedebistas se preparam para devolver a “gentileza” no Acre, com apoio a Tião Viana, e no Distrito Federal, com Agnelo Queiroz. A lógica em todas essas disputas, tanto para petistas quanto para peemedebistas, é tentar eliminar o adversário/aliado já no ponto de partida e garantir a exclusividade de Dilma e de Lula no palanque. Onde isso não for possível, que o Palácio do Planalto se comprometa à neutralidade. Ficar em cima do muro, contudo, é uma posição que Dilma não conseguirá tomar até a formatação final das alianças, em meados do ano que vem. Até lá, que não espere facilidade.
Fonte: Correio Braziliense
Nenhum comentário:
Postar um comentário