Poderes precisam voltar a zelar pelo equilíbrio institucional
Por O Globo
Cabe ao plenário rever decisão do decano que
estabeleceu impeachment especial para os ministros do STF
A democracia brasileira tem demonstrado
resistência tenaz aos desafios que lhe têm sido impostos nas últimas quatro
décadas. O arcabouço institucional criado pela Constituição de 1988 se mostrou
eficaz para promover o impeachment de presidentes e governadores, punir
políticos e empresários corruptos e, recentemente, condenar um ex-presidente e militares
graduados por tentativa de golpe. Nos últimos tempos, contudo, o equilíbrio
institucional tem sofrido abalos, com Poderes esboçando avanços incompatíveis
com seus atributos e prerrogativas constitucionais.
A tensão do Legislativo com o Executivo fica patente na multiplicação desarrazoada de emendas parlamentares, na derrubada constante de vetos presidenciais por mera vendeta ou nos embates em torno da sabatina do indicado ao Supremo Tribunal Federal (STF). Com frequência, decisões do Judiciário têm sido acusadas de invadir competências do Parlamento. O Executivo também virou alvo frequente de críticas por decretos e Medidas Provisórias considerados abusivos ou pela tentativa de aparelhar e interferir em decisões de agências reguladoras.
Independentemente do mérito de cada caso,
ninguém tem nada a ganhar com o confronto entre os Poderes, nem com abalos ao
sistema de freios e contrapesos instaurado pela Constituição. Por isso desperta
questionamentos sensatos a decisão liminar do ministro Gilmar
Mendes, do STF, relativa a processos de impeachment contra ministros do
próprio Supremo.
Têm vigorado nos processos de impeachment as
regras estabelecidas pela Lei 1.079 de 1950. Em sua decisão, Gilmar invalidou
trechos da lei relativos aos ministros do Supremo e determinou novas regras que
deverão ir a referendo do plenário. De acordo com elas, pedir impeachment de
ministros passa a ser prerrogativa da Procuradoria-Geral da República (PGR),
e não mais de qualquer cidadão; a acusação passa a ser admitida no Senado
apenas por maioria de dois terços, e não mais por maioria simples; e decisões
dos ministros deixam de ser argumentos aceitáveis para pedidos de impeachment.
A liminar ignora a característica essencial
dos processos de impeachment: a forma é jurídica, mas a natureza é política.
Não se trata de ação penal, portanto não faz sentido atribuir a titularidade à
PGR. Muito menos criar uma nova regra que viola o estabelecido na lei que
continuará valendo para todos os demais cargos, de acordo com a jurisprudência
firmada pelo próprio STF para os processos julgados até agora no país. É certo
que decisões dos magistrados devem continuar independentes e não podem ser
justificativa para pedidos de impeachment (como jamais foram). Mas criar uma
situação excepcional para o Supremo torna o tribunal uma espécie de “fortaleza
inexpugnável”, imune a controles exercidos sobre os demais Poderes.
Num clima já conflagrado, a decisão cria o
risco de agravar conflitos, desencadeando uma crise institucional. Nenhum dos
Poderes pode se declarar inocente nas tentativas de avanço sobre os demais, mas
todos têm o mesmo dever de demonstrar serenidade e maturidade. Cabe ao plenário
da Corte corrigir a decisão do decano. Porém também é essencial que haja, da
parte do Parlamento, do governo, de políticos e figuras públicas, comedimento e
temperança para evitar reações que testem ainda mais a tenacidade e a
resistência da democracia brasileira.
Prisão de Bacellar evidencia infiltração do
crime organizado na política
Por O Globo
Suspeitas são gravíssimas. Mínimo a esperar
do Legislativo é que mantenha presidente da Alerj preso
A prisão do presidente da Assembleia
Legislativa do Rio (Alerj)
e pré-candidato ao governo estadual, Rodrigo
Bacellar (União), expõe de modo chocante até que ponto o crime
organizado está infiltrado na política fluminense. Bacellar é suspeito de obstruir
investigações e vazar informações sigilosas de uma operação da Polícia Federal
(PF) destinada a prender o também deputado estadual Thiego Raimundo dos Santos
Silva (MDB), conhecido como TH Joias, apontado como braço político do Comando
Vermelho (CV). No carro oficial de Bacellar, foram apreendidos R$ 91 mil em
espécie.
A polícia afirma que TH usava o mandato na
Alerj para favorecer o crime organizado. Ele é acusado de tráfico de droga,
corrupção, lavagem de dinheiro e intermediação na compra e venda de fuzis e
equipamentos antidrones para bandidos do CV. TH retirou de sua casa documentos
e objetos que poderiam servir de prova para incriminá-lo. Imagens de câmeras de
segurança mostram um caminhão carregado às vésperas da operação. Mensagens
revelam que Bacellar foi consultado sobre o esvaziamento do imóvel, diz a PF.
Ele também limpou o celular e passou a usar outro aparelho. Quando a polícia
chegou, não estava em casa e foi detido noutro endereço. No documento em que
determinou a prisão, o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal
Federal (STF), considerou o fato “gravíssimo”. Não se sabe como Bacellar obteve
conhecimento prévio da operação.
Um dos desafios do governo do Rio é combater
organizações criminosas que controlam partes significativas do território. Ao
redor de 4 milhões de cidadãos — ou 35% da Região Metropolitana — vivem sob
domínio de grupos armados ligados ao tráfico ou à milícia, revela pesquisa do
Grupo de Estudos dos Novos Ilegalismos, da Universidade Federal Fluminense
(Geni/UFF) e do Instituto Fogo Cruzado. O CV é a facção com maiores domínios.
A Alerj ainda terá de analisar a prisão de
Bacellar. A julgar pela tradição de corporativismo e pela liderança do
presidente da Casa (reeleito por unanimidade), não surpreenderia se os
deputados a revogassem, apesar dos indícios consistentes apurados pela PF.
Seria uma lástima. É certo que ainda não há condenação, mas as acusações são graves.
O Legislativo não pode ignorá-las.
É inadmissível que líderes políticos mantenham relação promíscua com organizações criminosas combatidas pelo estado em batalhas sangrentas. Cada vez mais o crime organizado se infiltra no mercado formal e nas Casas Legislativas em busca de blindagem. A suspeita de envolvimento do líder do legislativo estadual com o crime é por si só estarrecedora. A investigação deve prosseguir com independência e ir a fundo para livrar a política fluminense dessa chaga. Ela deveria representar o início de uma depuração necessária para impedir o uso das instituições em favor de práticas ilegais. O mínimo a esperar do Legislativo é empenho no combate a esse flagelo que há décadas atormenta a população fluminense — e não que se alie a criminosos.
Gilmar fragiliza imagem do STF com blindagem
absurda
Por Folha de S. Paulo
Ao mudar Lei do Impeachment, ministro avança
de modo descabido sobre prerrogativa do Legislativo
A soberania popular é um dos pilares mais
valiosos da Constituição, e não cabe ao Judiciário limitá-la, sobretudo em
benefício próprio
Fã ou "hater"? A pergunta, em tom
jocoso, circula na internet sempre que alguém age de forma ambígua em relação a
outra pessoa, grupo ou instituição. Pois a dúvida, com doses reforçadas de
sarcasmo, se aplica agora a Gilmar Mendes,
do Supremo Tribunal Federal.
Com uma canetada leviana, o ministro
suspendeu trechos da Lei do Impeachment que
tratam do afastamento de membros do STF. Sua
decisão de quarta-feira (3), individual e provisória, ainda passará pelo crivo
de seus colegas —e espera-se que tenham o discernimento que faltou a Gilmar.
O decano da corte se manifestou em ações
propostas pelo Solidariedade e pela Associação dos Magistrados Brasileiros
(AMB). Em termos rebuscados, sustentou que alguns dispositivos da lei são
incompatíveis com a Constituição de
1988. Em palavras simples, ele blindou
os ministros do Supremo contra processos por crime de
responsabilidade.
Para Gilmar, a lei está ultrapassada ao
permitir, por exemplo, que qualquer cidadão apresente ao Senado um
pedido de impeachment de integrantes do STF. O caminho legítimo, na visão
distorcida do ministro, seria que apenas o
procurador-geral da República pudesse fazê-lo.
É estarrecedor que um magistrado tão
experiente enuncie tamanho disparate. Primeiro porque a soberania popular é um
dos princípios mais valiosos da Constituição em vigor, e não caberia ao Poder
Judiciário limitá-la, sobretudo em benefício próprio.
Ademais, o artigo 41 da lei, alvejado por
Gilmar, também autoriza qualquer cidadão a denunciar o procurador-geral da
República por crimes de responsabilidade. A valer a lógica confusa do decano,
somente o procurador poderia processar a si próprio?
A Lei do Impeachment, isto deve ficar claro,
está longe de ser perfeita. Datada de 1950, ela já embasou ações pelo
afastamento de dois presidentes eleitos sob a égide da assim chamada
Constituição Cidadã, Fernando
Collor e Dilma
Rousseff, mas isso não a livra de lacunas e contradições.
Modernizá-la é necessário. Tal missão, porém,
compete ao Congresso
Nacional, não ao STF. Este deve se recolher, como fez no passado, ao
papel de supervisor da aplicação da lei e da Carta Magna, assegurando que sejam
seguidos à risca os procedimentos ali estabelecidos, sem espaço para manipulações
oportunistas.
Gilmar tomou o sentido contrário. Talvez se
enxergando como último bastião da democracia, resolveu reescrever a lei com o
próprio punho, decerto no intuito de proteger o STF contra eventuais investidas
de senadores ávidos por se vingar da corte.
Ao usurpar prerrogativa do Legislativo,
porém, o ministro abala a já
debilitada credibilidade do Supremo. Contribui para torná-lo mais
fraco, não mais forte. Favorece o argumento daqueles que, nem sempre com razão,
criticam a corte por seu apetite de poder.
Até os maiores inimigos do Supremo têm
dificuldade de provocar estrago desse quilate.
A sombra do crime organizado na política
Por Folha de S. Paulo
Risco de interferência de facções nas
eleições exige inteligência financeira e fiscalização de campanhas
Se o crime organizado se infiltra na
econômica e no Estado, pode influenciar pleitos, moldar decisões e capturar
políticas públicas
Relatório
recém-divulgado pela Agência Brasileira de Inteligência (Abin)
alerta para o risco de atuação de organizações criminosas nas eleições de
2026.
A interferência desses grupos na política e
na gestão pública se dá como extensão da diversificação
dos negócios ilícitos —que não se restringem mais ao tráfico
de drogas—
na economia formal,
seja com a comercialização de produtos adulterados ou contrabandeados, lavagem
de dinheiro, aplicações financeiras e participação em contratos públicos.
Operações recentes da Polícia
Federal, como Fim da Linha, Carbono Oculto, Poço de Lobato e
Compliance Zero, revelaram a engenharia criminosa que sustenta essa influência
nefasta.
Controle de concessões de transporte, lavagem
por ditas fintechs, fraudes tributárias e fragilidades do sistema financeiro
constituem um cenário de imbricação de dinheiro lícito e ilícito no qual a
política pode ser capturada por meio de recursos destinados a partidos e
campanhas.
Os riscos envolvem candidaturas de fachada,
investidores fictícios, ausência de controle padronizado da origem de verbas e
patrocínios, lacunas na regulação de gastos e estruturas de fiscalização
insuficientes para o volume e a complexidade das operações que ocorrem em
eleições.
Se o crime organizado se
infiltra na atividade econômica e no Estado, amplifica sua capacidade não só de
influenciar resultados de pleitos, mas de moldar decisões e capturar políticas
públicas.
A Operação Zargun, deflagrada em setembro,
oferece um recorte dessa cooptação. A investigação de um esquema de corrupção entre
lideranças da facção Comando
Vermelho e diversos agentes públicos no Rio de
Janeiro, ainda em andamento, levou às prisões do deputado estadual
TH Joias (MDB)
e de ninguém menos que o presidente
da Assembleia Legislativa fluminense, Rodrigo Bacellar (União Brasil).
A resposta exige coordenação institucional e
adesão a boas práticas já recomendadas por organismos internacionais,
como ONU, OCDE e
Grupo de Ação Financeira Internacional (GAFI).
Entre elas, reforço da inteligência
financeira, rastreamento aprofundado do beneficiário final de empresas e
doadores, auditorias contínuas de campanhas eleitorais, transparência de
contratos públicos em tempo real e responsabilização efetiva pela Justiça de
candidatos e partidos apoiados por recursos ilícitos.
Um esforço integrado na mitigação de riscos é imperativo para preservar a integridade das eleições —e, em última instância, a confiança na democracia.
Correios, um cadáver caro
Por O Estado de S. Paulo
Lula prefere empurrar o problema dos Correios
com a barriga a encará-lo, mas, a continuar nessa toada, empréstimos, aportes e
mudanças na meta das estatais vão se tornar rotineiros
O governo de Luiz Inácio Lula da Silva
provavelmente terá de mudar a meta fiscal das estatais federais no ano que vem
por causa dos Correios. O Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO) de
2026 permitia um déficit de até R$ 6,75 bilhões para o conjunto de empresas
públicas da União, mas o número foi proposto em abril, antes do irrefreável
processo de deterioração pelo qual os Correios passariam ao longo dos meses
seguintes.
Esse ajuste, evidentemente, não visa a
alterar a trágica trajetória dos Correios em direção à ruína. A questão é que,
se a previsão de déficit das empresas públicas não for adequada, o Executivo
será obrigado a cortar outras despesas para cumprir a meta fiscal do ano que
vem, que prevê um superávit de 0,25% do Produto Interno Bruto (PIB), de cerca
de R$ 34 bilhões. E tudo que Lula não quer é cortar gastos, ainda mais em um
ano eleitoral.
Foi exatamente o que ocorreu neste ano. Em
pleno mês de novembro, a projeção de déficit das estatais, que era de R$ 5,5
bilhões, teve de ser ampliada para R$ 9,2 bilhões por causa dos Correios. A
situação obrigou o governo a cortar R$ 3 bilhões em gastos dos ministérios a
poucas semanas do fim do ano, quando o Executivo imaginava que
contingenciamentos não seriam mais necessários.
Esse é apenas mais um capítulo da longa e
dolorosa decadência dos Correios. O governo Lula até tenta fingir surpresa, mas
a verdade é que menosprezou o problema até que ele virasse um problemão.
Enquanto os resultados financeiros dos Correios pioravam a olhos vistos, o
Executivo recorria a discussões semânticas para diferenciar déficit de prejuízo
e gastos de investimentos.
Em julho, o governo já estava ciente de que a
empresa precisaria de ajuda. À época, o socorro, estimado em R$ 5 bilhões,
derrubou o então presidente dos Correios, Fabiano Silva dos Santos. Três meses
depois, seu sucessor, Emmanoel Schmidt Rondon, anunciou que a estatal
precisaria de nada menos que R$ 20 bilhões para pagar as contas em dia e
executar um tardio plano de reestruturação.
O aporte virou empréstimo e, em conjunto,
alguns bancos aceitaram participar da operação de salvamento. Exigiram, no
entanto, que a União assumisse a bronca em caso de calote e, como não rasgam
dinheiro, pediram juros equivalentes a 136% do CDI, superior ao teto com que o
Tesouro Nacional trabalha. O governo chiou, a oferta foi rejeitada e a
possibilidade de um aporte da União na empresa, que custou o cargo do
presidente anterior, voltou à mesa.
Entre idas e vindas, todo esse esforço seria
defensável se ao menos servisse para solucionar de vez os problemas dos
Correios, mas é difícil ser otimista diante da visão do governo sobre o papel
“estratégico” das estatais na economia.
Afinal, enquanto o prejuízo escalava, os
Correios realizaram um concurso para contratar mais de 3,5 mil empregados no
fim do ano passado. Pior: em vez de enterrar de vez os planos depois dos
rombos, mesmo porque conta com mais de 80 mil funcionários, a empresa ainda
pensa em convocar os aprovados.
Para recompor as receitas que os Correios
perderam nos últimos anos com o avanço de empresas privadas na área de
logística e encomendas, a ideia da estatal é cobrar uma espécie de
“indenização” do Tesouro Nacional pelos custos que tem com a universalização
dos serviços postais, por ela estimados em alguns bilhões.
Esses dois singelos exemplos mostram que
qualquer ajuste, se é que haverá, será insuficiente frente ao desafio da
empresa. É importante destacar que as dificuldades dos Correios não são
exclusividade nacional. No mundo todo, empresas tradicionais do setor de
logística e entregas tentam se adaptar às mudanças tecnológicas e aos novos
hábitos da população, seja via parcerias com a iniciativa privada, seja pela
assunção de outros serviços e funções públicas.
No Brasil, no entanto, por questões ideológicas
que beiram a teimosia, o governo prefere empurrar o problema com a barriga a
encará-lo. A continuar nessa toada, novos empréstimos, aportes e mudanças na
meta das estatais serão necessários muito em breve. A sociedade que se vire
para pagar a conta.
Caso Master toma rumo estranho
Por O Estado de S. Paulo
Ao arrogar para si o controle da investigação
de Daniel Vorcaro, e ainda sob inexplicável sigilo, Dias Toffoli estimula uma
percepção de acobertamento que só degrada a integridade do Supremo
O ministro Dias Toffoli arrogou para o
Supremo Tribunal Federal (STF) o controle da investigação de crimes financeiros
envolvendo Daniel Vorcaro, dono do Banco Master. Ademais, decretou elevado grau
de sigilo aos atos processuais, concentrando em seu gabinete o fluxo de
informações sobre o caso. Essa decisão de Toffoli não resiste a um exame
jurídico primário, muito menos ao confronto com o ideal de transparência que
deve nortear os Poderes da República.
A defesa do empresário argumentou que Vorcaro
teria mantido negócios com o deputado federal João Carlos Bacelar (PL-BA). Com
base nisso, o empresário acionou o STF para tirar o processo da primeira
instância da Justiça Federal de Brasília em razão da prerrogativa de foro do
parlamentar baiano. O busílis é que o documento que cita Bacelar, como revelou
o Estadão, diz
respeito a uma transação imobiliária de R$ 250 milhões que nem sequer foi
consumada, além de não guardar relação com a investigação de fraude na venda de
carteiras de crédito do Banco Master ao Banco de Brasília (BRB), operação
suspeita que pode ter injetado R$ 12 bilhões na instituição financeira
controlada por Vorcaro.
Mas, abstraindo-se a evidente falta de nexo
causal, Dias Toffoli poderia perfeitamente ter mantido no STF somente a
investigação de Bacelar, deixando a cargo da primeira instância as providências
relativas aos demais investigados sem prerrogativa de foro, como Vorcaro e seus
sócios.
Para piorar, ainda há o sigilo inexplicável.
O art. 5.º , inciso LX, da Constituição determina com clareza solar que somente
a intimidade ou o interesse social legitimam a eventual restrição à publicidade
dos atos processuais. Mais abaixo na hierarquia normativa, o Código de Processo
Civil enumera as quatro hipóteses em que se admite o segredo de Justiça, a
saber: (i) situações em que o interesse público ou social o imponha; (ii)
processos de família; (iii) casos que envolvam dados íntimos (como, por exemplo,
estado de saúde de uma das partes); e (iv) processos que versem sobre
arbitragem.
Ora, enquadrar as atribulações judiciais do
sr. Vorcaro em quaisquer das alíneas acima requer uma mui criativa hermenêutica
jurídica. A rigor, à luz do interesse público, o caso do Banco Master e seu
controlador exige o exato oposto: absoluta transparência.
As peripécias de Vorcaro transbordam de
relevância pública. Seus desdobramentos envolvem potenciais impactos
financeiros para fundos públicos de aposentadoria, suspeitas de tráfico de
influência e indícios de proximidade muito além dos limites republicanos entre
o empresário e autoridades dos Três Poderes. Ou seja, é precisamente o tipo de
ação que não pode tramitar nas sombras, resguardadas às partes, por óbvio,
todas as garantias do devido processo legal.
Some-se a tudo isso dois dados incômodos, que
qualquer magistrado minimamente cioso de sua responsabilidade teria considerado
suficientes para se declarar impedido. Em 2024, Dias Toffoli participou de um
evento empresarial em Londres patrocinado, ora vejam, pelo Banco Master. Até
hoje, o ministro não prestou o devido esclarecimento sobre quem custeou suas
despesas de viagem. Como se isso não bastasse, a mulher do ministro, Roberta
Rangel, foi sócia de um dos advogados que hoje atuam na defesa de Vorcaro
perante o Supremo. A simples aparência de parcialidade já seria óbice
incontornável à permanência de Dias Toffoli como relator do processo.
Não há razão factual ou jurídica que sustente
a manutenção do caso de Vorcaro no STF nem tampouco o sigilo determinado por
Dias Toffoli. Há, isso sim, a imperiosa necessidade de que o próprio STF não
deixe sua imagem ser tisnada pela suspeita de acomodação de conveniências
empresariais ou proteção de relações pessoais mal explicadas.
Este jornal quer acreditar que Dias Toffoli e
o Supremo estão tratando do caso do Banco Master de maneira republicana, mas,
por ora, a sensação é de que há algo inconfessável sendo escondido dos olhos
dos cidadãos. Considerando-se que o sr. Vorcaro habilmente soube cultivar
relações com os altos escalões de Brasília, não é uma desconfiança infundada.
O novo reitor e o futuro da USP
Por O Estado de S. Paulo
Professor de Medicina assume universidade com
seu modelo de financiamento em xeque
O governador Tarcísio de Freitas escolheu o
professor da Faculdade de Medicina Aluísio Segurado para assumir o cargo de
reitor da Universidade de São Paulo (USP), numa clara demonstração de respeito
à tradição e à democracia paulistas. O chefe do Executivo optou pelo docente
mais bem votado da lista tríplice, muito embora tivesse a prerrogativa de
indicar qualquer uma das três chapas que analisou. Mas o governador preferiu
manifestar seu apreço pela opinião da comunidade universitária, formada por
professores, funcionários e estudantes.
Dito isso, a partir de 25 de janeiro de 2026,
Segurado e a professora da Escola Politécnica Liedi Légi, a nova vice-reitora,
assumirão seus mandatos de quatro anos com grandes desafios no horizonte. Não
há por que duvidar das credenciais dos escolhidos. Segurado foi pró-reitor de
Graduação, comandou o Instituto Central do Hospital das Clínicas e se destacou
como pesquisador em infectologia, com atuação no enfrentamento do HIV/aids e da
covid-19. Légi, por sua vez, foi a primeira mulher diretora da Escola
Politécnica.
Com experiência na pesquisa, no ensino e na
gestão, a dupla comandará a USP num dos momentos mais sensíveis de sua
história. Promulgada a reforma tributária, a partir do ano que vem haverá o
progressivo desaparecimento do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e
Serviços (ICMS), a principal fonte de custeio não só da USP, mas também da
Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (Unesp) e da
Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Todos os anos, o Estado repassa às
três universidades públicas paulistas 9,57% da arrecadação com o ICMS.
Essa cota-parte é assegurada desde 1989 por
meio de um instrumento normativo frágil na forma, mas forte nos resultados. Foi
um simples decreto e depois a renovação anual de sua essência em lei que
conferiu a autonomia financeira da USP ao mesmo tempo em que permitiu a sua
consolidação como o mais relevante centro de ensino e pesquisa do Brasil.
Assegurar a manutenção desse mínimo, portanto, é a maior e mais importante
missão de Segurado e Légi à frente da USP. Para isso, precisarão intensificar
as negociações com o Palácio dos Bandeirantes e a Assembleia Legislativa do
Estado de São Paulo (Alesp), a fim de costurarem um arranjo normativo que
garanta o financiamento e, sobretudo, a autonomia da instituição.
Será ainda mais benéfico para a universidade se os dois gestores forem capazes de buscar novas formas de financiamento para a USP, com o incentivo à participação de fundos e da iniciativa privada no fomento de suas pesquisas. Mas não só isso: será bastante proveitoso para a universidade se as assinaturas de convênios e parcerias com instituições nacionais e, sobretudo, internacionais forem ampliadas. Pois somente quando for inserida de fato no mundo globalizado e entrar de vez no século 21 a USP conseguirá avançar nos rankings internacionais, onde está estacionada. Segurado e Légi terão muito trabalho.
Exportação e gasto público contêm
desaceleração
Por Valor Econômico
O PIB brasileiro ficou praticamente estagnado
no terceiro trimestre, com um crescimento de apenas 0,1% sobre o trimestre
anterior
A economia brasileira ficou praticamente
parada no terceiro trimestre, com crescimento de apenas 0,1% sobre o trimestre
anterior. O Produto Interno Bruto (PIB) teria sido negativo se as exportações
líquidas (vendas externas menos importações) não tivessem garantido
contribuição positiva de 0,5 ponto percentual nas contas nacionais. No
trimestre, além das exportações, as despesas de consumo do governo, com avanço
de 1,3% e peso de 18,8% na composição do PIB, foram o item da demanda que mais
cresceu, superando o consumo das famílias e os investimentos. A demanda
doméstica desacelerou e reduziu as importações, cabendo à maior exportação e
aos gastos do governo garantirem alguma expansão.
Com consequências importantes para a inflação
e para a trajetória da taxa de juros, os serviços e seu espelho na demanda — o
consumo das famílias — progrediram 0,1% no terceiro trimestre ante o segundo.
Na comparação com o mesmo trimestre de 2024 o avanço foi pequeno, de 0,4%, mas
nos quatro trimestres até outubro ante o mesmo período anterior ainda exibem
bom desempenho, 2%. Em quase todas as comparações temporais, o consumo das
famílias tem avançado em linha ou abaixo da evolução do PIB, que, ao ritmo
previsto (2,2% em 2025), deixará de crescer acima de seu potencial.
A evolução dos salários em um mercado de
trabalho com pleno emprego faria prever uma reação do consumo superior à
observada. Há outros fatores interferindo na conta, porém. Um é estatístico: o
IBGE revisa sempre suas séries, e um dos itens que mais se moveram foi o
consumo. Em 2024, sua expansão foi ajustada de 4,8% para 5,1%. Ante uma base de
comparação maior, a queda é maior. O outro fator é conjuntural. A inadimplência
é elevada e há evidências significativas de que os ganhos salariais (evolução
acima da inflação de 3,9% no trimestre encerrado em outubro) não têm
desembocado no consumo ou sido poupados (a taxa de poupança se manteve em 14,5%
do PIB), mas foram usados no pagamento de dívidas.
O desaquecimento dos serviços está ocorrendo
no item que tem maior influência no PIB, o de “outras atividades de serviços”
(peso de 17,4% no setor, que por sua vez perfaz 68,9% do PIB). Esse item
engloba os serviços prestados às famílias, movidos à renda dos salários e que
tem empurrado o IPCA para cima. É possível que, mantidas as atuais condições e
sem estímulos adicionais do governo à economia, os preços dos serviços
arrefeçam. Nos 12 meses findos em outubro a inflação de serviços foi de 6,2%,
bem acima do IPCA de 4,68%.
Com a desaceleração moderada da atividade, a
demanda doméstica foi negativa e reduziu o ímpeto das importações. No início do
ano, o setor externo roubou pontos do crescimento do PIB, mas isso é passado.
Exportações superiores a importações acrescentaram 0,5 ponto percentual,
segundo cálculos de Alberto Ramos, diretor de Pesquisa Econômica para a América
Latina do Goldman Sachs, um pouco menor que a contribuição também positiva de
0,7 ponto no segundo trimestre.
Nos três trimestres decorridos do ano, em
relação aos de 2024, a agricultura teve o melhor desempenho (11,6%), a
indústria desacelerou (mais a de transformação que a extrativa), mas avançou
1,7%, e os serviços subiram 1,8%. Do lado da demanda, o consumo das famílias
acumula crescimento de 1,4%, as despesas de consumo do governo voltaram a subir
(de 1,4% no trimestre anterior para 1,6% agora), enquanto os investimentos
perdem força e ainda aumentam 5%.
De todos os componentes do PIB, a taxa de
formação bruta de capital fixo é a que está mais distante do seu pico
histórico: 17% abaixo do segundo trimestre de 2013. Os investimentos foram
maiores nos últimos anos do governo Bolsonaro. Nos de Lula, caíram um pouco, e
com recuo mais acentuado da taxa de poupança (pelo peso dos déficits públicos).
A distância entre investimento e poupança no terceiro trimestre foi de 2,8%, o
que explica o aumento do déficit em transações correntes — em novembro foi de
3,4% do PIB. As previsões para o crescimento da economia em 2026 rondam 1,7%.
Os gastos do governo voltaram a aumentar no
terceiro trimestre, com o pagamento dos precatórios, e claramente impediram
esfriamento maior das atividades, objetivo perseguido pelo Banco Central. Há
mais gastos a caminho. Na votação do PLOA de 2026, o relator acrescentou mais
R$ 10 bilhões das estatais fora da meta fiscal, além dos R$ 5 bilhões gastos
por elas no PAC. Como o Valor informou, há no orçamento aumento do Imposto de
Importação que renderá R$ 13 bilhões, para mais despesas e pagamento de
emendas.
O governo está abrindo seu baú de benesses eleitorais quando a política contracionista do BC faz sentir plenamente seus efeitos. A persistência de juros de 15% traz um custo formidável para as contas públicas e deixará uma herança maldita para o sucessor de Lula — que pode ser ele próprio. O Planalto, ao que tudo indica, continuará agindo para impedir que os juros possam ser reduzidos com segurança. A conta recairá sobre todos os contribuintes.
O espaço da economia criativa no Brasil
Por Correio Braziliense
Diante da diversidade, riqueza artística e
força do empreendedorismo popular, essa cadeia de negócios pode contribuir mais
para o crescimento do país
Espalhada por diversas áreas, a economia
criativa vem se consolidando no Brasil nas últimas décadas. Presentes em
segmentos da indústria, serviços, gastronomia, turismo, moda, tecnologia, entre
outros, as atividades que transformam criatividade em valor econômico têm
conquistado espaço e demonstrado vitalidade. Os números indicam um panorama
promissor, mas em um país com tantas desigualdades esse horizonte pode ser mais
amplo.
Levantamento feito pelo Observatório Nacional
da Indústria (ONI), núcleo de informações da Confederação Nacional da Indústria
(CNI), indica que 1 milhão de vagas de trabalho serão criadas pela economia
criativa até 2030. Hoje, esse modelo emprega 7,4 milhões de pessoas, conforme a
Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad contínua), do Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), para o 4º trimestre de 2022.
Segundo as projeções, esse incremento ocorrerá no mercado formal, com carteira assinada,
e no informal.
A questão é que, diante da diversidade,
riqueza artística e força do empreendedorismo popular, essa cadeia de negócios
pode contribuir mais para o crescimento brasileiro. O conjunto de ações para
estimular inovações e renovar meios tradicionais do mercado precisa avançar ao ponto
de ser uma alternativa estratégica de desenvolvimento do país.
Um dos grandes desafios a serem enfrentados
está relacionado às diferenças regionais — o que fica claro ao analisar o
relatório produzido pela CNI. Há uma concentração elevada de empresas de
economia criativa no Sudeste (56.222) e no Sul (31.643) do Brasil. Nas regiões
Norte, Nordeste e Centro-Oeste, um movimento crescente tem acontecido, porém
inferior ao potencial que possuem. Entre os estabelecimentos, cerca de 111 mil
estão concentrados em micro e pequenas empresas — 86.917 e 24.381,
respectivamente, segundo os dados da CNI. As médias e grandes, juntas,
representam menos de 6 mil.
Esse quadro revela a realidade da economia
criativa no país: está atrelada ao empreendedorismo de seus idealizadores. E,
apesar de toda a sua capacidade de reinvenção, o setor precisa de uma atuação
decisiva dos governos. À administração pública cabe fomentar formação técnica,
ampliar editais e garantir marcos regulatórios que protejam os trabalhadores,
além de viabilizar a automação.
A iniciativa privada também tem seu papel,
com a responsabilidade de reconhecer o potencial desse vetor, investindo em
parcerias e compra de serviços criativos. A sociedade, por sua vez, deve
acreditar na qualidade do que é produzido e oferecido por esse ramo da
economia, apoiando os empreendedores e cobrando incentivos.
O entendimento de que a economia criativa é um ativo estratégico para o desenvolvimento precisa ser disseminado. Os relevantes impactos econômicos e sociais desse modelo, com sua capacidade de proporcionar receita de forma sustentável e promover o desenvolvimento humano, são determinantes para o futuro do país. Em um cenário global de demanda por novidades, renunciar ao talento brasileiro significa desperdiçar um diferencial na desenfreada competição do mercado mundial.
É preciso mais pressa para reduzir
desigualdades
Por O Povo
Relatório do IBGE mostra queda na pobreza e
na extrema pobreza no Brasil
Diferentes dados divulgados recentemente
revelam que o País vem obtendo resultados positivos em questões sociais, que
significam a melhoria nas condições de vida de milhões de brasileiros.
No entanto, é preciso alertar que esses
avanços ainda são insuficientes para corrigir problemas estruturais, que
impedem que a evolução aconteça na medida das necessidades dos segmentos mais
vulneráveis da população.
O relatório mais recente do Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostra avanços importantes na
redução da pobreza e da extrema pobreza. De acordo com os dados do IBGE, a
proporção de pessoas vivendo na pobreza caiu de 27,3% em 2023 para 23,1% em
2024.
Esse é o menor nível registrado desde o
início da série histórica, em 2012, com mais de 8,6 milhões de pessoas saindo
dessa condição. Da extrema pobreza saíram 1,9 milhão de pessoas, com o índice
baixando de 4,4% para 3,5% da população. Em agosto do ano passado, o País foi
retirado do Mapa da Fome, como registrou a Organização das Nações Unidas (ONU).
Em novembro, o IBGE divulgou informações sobre o aumento da expectativa de vida
entre os brasileiros.
São considerados em situação de pobreza os
domicílios com renda inferior a US$ 6,94 por pessoa. Na extrema pobreza,
residências com renda inferior a US$ 2,18 por pessoa. Para fazer os cálculos, o
IBGE adota os parâmetros do Banco Mundial.
Os índices positivos são reflexo de uma
combinação de fatores, como o aquecimento do mercado de trabalho e a
transferência de renda, proporcionada por programas como o Bolsa Família, que
beneficiam um setor expressivo da sociedade.
No entanto, os benefícios do recuo da pobreza
e da extrema pobreza, como de outros índices, impactam de forma diferente
regiões e segmentos sociais. A pobreza é mais elevada nas áreas rurais do que
nas urbanas. Pessoas pretas e pardas são mais atingidas pela vulnerabilidade em
comparação com a população branca.
Quanto às regiões, o Nordeste concentra a
maior parte da população em situação de vulnerabilidade. Essas questões
precisam ser consideradas na implementação das políticas públicas, de modo a
evitar essas disparidades.
Também é preciso lembrar que, quando milhões de pessoas conseguem sair da pobreza e da extrema pobreza — devido a políticas públicas e ao aumento da oferta de empregos —, outras tantas continuam vivendo nessas condições inaceitáveis. No Brasil existem muitas urgências, é verdade, mas nenhuma mais premente do que acabar com a miséria em um País que é considerado o "celeiro do mundo", pela quantidade de alimentos que produz. É preciso mais pressa para reduzir as injustiças e as desigualdades.

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