
A decisão do BC tem dois aspectos: a) o aumento da taxa Selic em 0,5 ponto percentual para 11,25%; e b) e o anúncio de que este é apenas "o início de um processo de ajuste da taxa básica".
Com o aumento de 0,5 ponto percentual, o Brasil distancia-se ainda mais do resto do mundo em termos de taxas básicas. Os juros nominais comparáveis estão próximos de zero nos EUA e no Japão e em 1% na área do euro. Segundo levantamento da Cruzeiro do Sul Corretora, a taxa de juro real ex ante (deduzida a inflação esperada para os próximos doze meses) chega a 5,5% no Brasil. Nos EUA e no Reino Unido, a taxa básica é negativa em 1,2% e 3,1%, respectivamente. No Japão, a taxa real está em zero. Na Alemanha, negativa em 0,7%. Com esses enormes diferenciais de juros a favor do real, será difícil evitar que a moeda brasileira continue se valorizando. A expectativa de valorização reforçará a entrada de capitais, tornando-se uma "profecia autocumprida".
As razões do BC serão explicadas na ata da reunião do Copom, que sairá na próxima semana. Sabe-se, em todo caso, que a favor da decisão pesam os sinais de aquecimento da economia, notadamente as pressões inflacionárias e o desequilíbrio crescente das contas externas correntes. São muitos os indicadores preocupantes tanto no que diz respeito à inflação quanto ao balanço de pagamentos. Preocupa, em especial, que com tanto fortalecimento da moeda, a inflação tenha subido de modo tão significativo.
Isto dito, fica ainda a impressão de que o Copom talvez tenha carregado na mão, principalmente por ter combinado um aumento expressivo da Selic com a declaração formal de que isso é apenas o começo.
Não se deve perder de vista que o desequilíbrio externo corrente reflete também, e em grande medida, a sobrevalorização do real. A provável valorização adicional induzida pela alta da Selic agravará ainda mais o problema.
E parte do aumento recente da inflação se deve não a pressões de demanda, mas a choques exógenos (internos e externos) sobre os preços dos alimentos e outros produtos primários.
Além disso, o governo já vinha tomando medidas na área do crédito e anunciando outras na área fiscal. Corre-se o risco de uma overdose em termos de medidas de contenção da economia.
Outro risco (no sentido oposto) é que as autoridades fazendárias decidam moderar ou adiar o ajuste fiscal em face do endurecimento talvez exagerado da política monetária. Isso levaria à perpetuação de uma combinação inadequada entre política fiscal excessivamente flexível e política monetária excessivamente dura. Essa combinação tem implicações adversas para a taxa de câmbio e para as finanças do governo.
O ideal seria enfrentar o aquecimento da demanda com uma variedade de instrumentos: um ajuste fiscal importante, regulação da entrada de capitais externos, contenção dos empréstimos dos bancos públicos, restrições sobre o crédito dos bancos privados e, se necessário, um aumento moderado da taxa Selic.
Paulo Nogueira Batista Jr. é economista e diretor-executivo pelo Brasil e mais oito países no Fundo Monetário Internacional, mas expressa os seus pontos de vista em caráter pessoal.
FONTE: O GLOBO
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