O cancelamento da “visita de Estado” que a presidente Dilma Rousseff faria em outubro ao colega Barack Obama (após recusa de mais um apelo dele em sentido contrário, e oficializado como adia-mento consensual, sem data prevista) já se havia tornado praticamente certo ao emergir como recomendação do encontro – realizado sexta-feira última no Palácio da Alvorada – do estado-maior da campanha pela reeleição, à frente a candidata e o antecessor e tutor político Lula. O contencioso gerado por denúncias de espionagem eletrônica da presidente e da Petrobras por agência ligada ao governo norte-americano, ao invés de um trata-mento diplomático exigente de explicações e desculpas consistentes, passou a ser trabalhado como uma peça oportuna e importante da campanha reeleitoral , especialmente para a mobilização das bases do PT. E também utilizado, de imediato, para compensar com a bandeira da soberania nacional o novo desgaste do lulopetismo decorrente do re-torno do mensalão às manchetes do conjunto da mídia. Inclusive no discurso que Dilma fará no co-meço de outubro na Assembleia Geral da ONU.
Na referida campanha, a prática da recomendação daquele encontro se traduzirá numa retomada da antiga ênfase petista no “inimigo externo”, no “imperialismo ianque”, a ser responsabilizado , juntamente com seus aliados internos, pelos entraves à expansão da economia e pelos problemas sociais. Com a combinação entre o radicalismo dos palanques e recados do ex-presidente Lula aos empresários e financiadores da campanha, através do pragmático ex-ministro Antonio Palocci, de que isso significará apenas retórica eleitoral.
Mais grave, porém, do que essa retórica é o que o cancelamento da visita representa como reforço das tendências terceiro-mundistas de nossa política externa. Agravando as distorções diplomáticas impostas ao Itamaraty nos últimos anos. Entre as quais a grosseira forma de intervenção pró-Zelaya em Honduras; a suspensão do Paraguai para a entrada da Venezuela bolivariana em seu lugar no Mercosul; a passividade diante da recusa ilegal da Bolívia de Evo Morales, durante mais de 15 meses, da concessão de salvo-conduto ao senador Roger Pinto Molina, seguida da ameaça de levá-lo preso de volta a La Paz, feita a seu advogado por alto funcionário do governo brasileiro. Reforço esse que aumenta as dificuldades do próximo governo – da própria Dilma ou do seu adversário num 2º turno – para uma reorientação realista, não ideologizada, da política externa. E acentua a marginalização atual do país ante as novas e decisivas cadeias produtivas globais, cuja ultrapassagem passa em grande medida por um relacionamento político e econômico qualificado com os EUA.
Quanto ao mensalão, a possibilidade (mais que isso, a probabilidade) de um novo julgamento fortaleceu os réus dentro do PT e também no governo Dilma. No caso deste, com a troca do cauteloso distanciamento em relação a eles, e até da preferência por um fecho rápido do processo para evitar o “mal maior” de sua extensão ao ano eleitoral de 2014, pela aposta, agora, na desqualificação e redução das penas, explicitada ontem numa entrevista à Folha de S. Paulo do secretário-geral da Presidência, Gilberto Carvalho – “Ministro diz que mensalão foi caixa 2”. Aposta indicativa de confiança no acolhimento hoje dos “recursos infringentes” pelo ministro Celso de Mello, bem como nessa desqualificação em novo julgamento. Mas que não leva em conta outra possibilidade que será criada por uma reabertura do processo: a retomada de manifestações de rua como as de junho contra a impunidade dos mensaleiros.
Jarbas de Holanda é jornalista
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