Grupo
de Renan venceu Alcolumbre em palco secundário
As
velhas raposas do Congresso ensinam que se pode cobrar quase tudo de um político
no cemitério: que conforte a viúva, segure uma das alças do caixão, encomende a
coroa de flores. Só não se pode exigir desse político que pule no buraco e se
aconchegue do lado do morto.
Político
tem instinto de sobrevivência como os animais. Um decano do Congresso ilustra,
por exemplo, um erro de articulação de amador cometido pelo ex-presidente da
Câmara Rodrigo Maia (DEM-RJ), ao tentar atrair deputados para o bloco de Baleia
Rossi (MDB-SP) no papel de franco atirador contra o presidente Jair Bolsonaro.
Este
político veterano lembra que os deputados no segundo biênio do mandato estão
focados na reeleição. Por isso, não querem confronto com o governo - qualquer
governo.
Ao
contrário, procuram afinar a relação com o Executivo para assegurar emendas
para sua base eleitoral, fidelizar prefeitos, e assim, pavimentar o caminho
para o sucesso nas urnas.
Convencer um parlamentar a brigar com o governo a dois anos de sua reeleição é o mesmo que convidá-lo para saltar no buraco e se aconchegar ao morto dentro do caixão. Na vida real, discurso de independência na relação com o Executivo é conversa para boi dormir.
Um
dos políticos mais experientes da cena política, o ex-senador Heráclito Fortes,
do DEM do Piauí - um quadro que conviveu com figuras como Ulysses Guimarães e
Eduardo Campos - costuma lembrar que, em política, fundo de poço - ou de buraco
- tem mola.
Seu
partido agonizou na era Lula, e emergiu como uma das principais forças
políticas do último pleito. Independente do embate público entre Rodrigo Maia e
ACM Neto, o DEM voltou com protagonismo ao palco político.
A
metáfora do poço com mola no fundo vale para o MDB de Renan Calheiros (AL) no
Senado. O observador distraído dirá que a bancada perdeu pela segunda vez a
luta contra Davi Alcolumbre (DEM-AP) pela presidência da Casa. Mas um
observador atento alertará que Renan ganhou a revanche contra Alcolumbre no
fundo do palco.
O
grupo de Renan derrotou um importante aliado de Alcolumbre na eleição para a primeira
vice-presidência, o segundo cargo na hierarquia do Senado.
Num
segundo “round”, o grupo liderado por Renan mira mais dois cargos estratégicos,
com poder de fogo para elevar a pressão contra o governo: a presidência da
Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), cobiçada por Alcolumbre; e a
presidência da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Saúde.
Nas
articulações pelo apoio à candidatura de Rodrigo Pacheco (DEM-MG), um astuto
Alcolumbre prometeu a primeira vice-presidência ao PSD e também ao MDB. Os
emedebistas dobraram a aposta e levaram a disputa para o voto. Ao fim,
Veneziano do Rêgo (MDB-PB) derrotou o aliado de Alcolumbre, o senador Lucas
Barreto (PSD-AP), por 40 votos contra 33.
A
vitória de Veneziano simboliza a revanche do MDB contra Alcolumbre, ainda que
num palco menor, porque o senador da Paraíba representa o grupo autêntico de
Renan e José Sarney. Apesar da passagem pelo PSB, Veneziano é um
emedebista-raiz, irmão do ex-senador Vital do Rêgo, hoje ministro do Tribunal
de Contas da União (TCU), e aliado de berço de Renan. Vital foi alçado ao TCU
pelo voto de 63 senadores em 2014, e mantém até hoje vínculos com a Casa. Vital
encabeçou ao lado de Renan a articulação do jantar de reconciliação entre o
ministro da Economia, Paulo Guedes, e o então presidente Rodrigo Maia no
começou de outubro.
Nos
próximos “rounds”, o grupo de Renan quer nocautear Alcolumbre na disputa pela
presidência da CCJ. E senadores ouvidos pela coluna não descartam que Renan
assuma um cargo na CPI da Saúde: a presidência ou a relatoria.
Outro
candidato a cargo de direção da CPI é o líder do MDB, Eduardo Braga, senador do
Amazonas, e aliado de Renan, que tem demonstrado profunda indignação com o
descontrole da pandemia em sua base eleitoral.
Com
o MDB com fôlego renovado, Rodrigo Pacheco terá de demonstrar a mesma destreza
que utilizou para atrair o PT para sua candidatura.
Completando
uma semana no cargo, vai sofrer dupla pressão nos próximos dias. A pressão de
31 senadores - inclusive Renan e Braga - pela leitura do requerimento de
criação da CPI da Saúde, que abre caminho para a instalação do colegiado.
Autor
do requerimento da CPI da Saúde, o líder da Rede, senador Randolfe Rodrigues
(AP), receia que Pacheco tentará adiar a leitura do requerimento até a
realização da audiência para ouvir o ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, na
esperança de que a temperatura baixe até lá.
O
governo ainda pode agir para retirar assinaturas da CPI até meia-noite do dia
da leitura, mas Randolfe não acredita em recuo dos senadores que apoiaram a
investigação dos erros e responsabilidades das autoridades no enfrentamento da
pandemia, em especial no Amazonas. “Quem retirar a assinatura vai pagar um
preço além do comum junto à sociedade”, diz Randolfe.
Em
outro foco de pressão sobre Pacheco, Bolsonaro tem de decidir até o fim do mês
sobre o pedido da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) de veto ao
artigo que fixou prazo de cinco dias para que a agência se manifeste sobre uso
emergencial das vacinas, e possa chancelá-las, caso tenham sido autorizadas por
uma das nove autoridades sanitárias estrangeiras relacionadas na lei.
Se
o veto se consumar, o Congresso já está armado para derrubá-lo, em sessão que
será presidida por Pacheco.
Se há controvérsia em torno da eleição da deputada Bia Kicis (PSL-DF) para a presidência da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), está praticamente certa a nomeação do deputado Darci de Matos (PSD-SC) para relatar a PEC da reforma administrativa no colegiado. O presidente Arthur Lira (PP-AL) já elencou a proposta entre os itens prioritários da agenda econômica. Mudando regras apenas para os futuros servidores, lideranças da Casa acreditam que a matéria pode avançar.
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