Com
plano de pavimentar candidatura em 2022, tucano chama cúpula do partido para
jantar
Preocupado
com o racha no PSDB apresentado na eleição da Câmara dos Deputados, quando
boa parte do partido apoiou o candidato de Jair Bolsonaro à presidência da
Casa, o governador João Doria (SP) decidiu apresentar um ultimato à
cúpula tucana.
Em
jantar na noite desta segunda (8) no Palácio dos Bandeirantes, Doria irá
colocar na mesa a proposta de expurgar o partido do grupo de Aécio Neves (MG) e
de absorver dissidentes do DEM ligados ao ex-presidente
da Câmara, Rodrigo Maia.
O
deputado do PSDB mineiro é visto pelo entorno do governador como o motor do
governismo latente no partido e principal obstáculo interno para a candidatura
de Doria, hoje
maior rival de Bolsonaro em cargo eletivo, à Presidência no ano que
vem.
A
proposta será servida de entrada no Bandeirantes, já que foi informada no
convite aos comensais desta noite. Na prática, ela coloca o partido alinhado à
tese da postulação de Doria em 2022, reforçando sua posição no momento em que
até aqui aliado DEM rachou e assumiu ares neobolsonaristas.
A alternativa, pela lógica, seria a saída de Doria do PSDB. Mas seus aliados não consideram essa hipótese provável hoje.
A
contrariedade com o mineiro é partilhada pela ala histórica do partido, a velha
guarda liderada por Fernando Henrique Cardoso. O ex-presidente e outros
integrantes do grupo, como o senador José Serra (SP) e o ex-senador Aloysio
Nunes Ferreira (SP), foram convidados para o jantar.
Devem
participar membros da cúpula tucana, como o presidente do partido, Bruno
Araújo, e o líder do partido na Câmara, Rodrigo de Castro (MG), que é próximo
de Aécio.
O
plano de Doria havia sido delineado já na véspera da eleição no Congresso,
ocorrida na segunda passada (1º), quando
ficou clara a implosão do DEM.
O
partido de Rodrigo Maia deixou naquele domingo (31) o apoio ao candidato dele à
sua sucessão, Baleia Rossi (MDB), que também era o nome
de Doria na disputa com Arthur Lira (PP-AL), o rei do centrão apoiado pelo
Planalto.
A
desistência do DEM, patrocinada pelo presidente da sigla, ACM Neto, quase levou
o PSDB junto. Na noite de domingo, Bruno Araújo ligou para Doria e o informou
que seria muito difícil segurar o partido no bloco de apoio a Baleia.
No
começo da madrugada de segunda, os deputados Rodrigo de Castro, Carlos Sampaio
(SP) e Eduardo Cury (SP) foram à casa de Lira anunciar que o partido deveria
ficar independente —na prática, liberando os cerca de 15 ou 20 de 31 deputados
que votariam de qualquer forma no líder do centrão.
Maia
entrou em ação e contatou Aécio,
visto como apoiador dos deputados. O mineiro argumentou que os
deputados estavam votando porque a torneira de emendas parlamentares do
Planalto havia secado para eles nos dois últimos anos, mas disse que
trabalharia para o PSDB se manter nominalmente no bloco de Baleia.
Esse
relato dá matizes à crise na segunda cedo, quando só transparecera que Doria e
FHC haviam trabalhado para que o partido ficasse no bloco. Para seus
interlocutores, foi uma prova de que Aécio não teria operado para Lira.
Mas,
na visão dos aliados do governador paulista, o gesto de Aécio foi apenas um ato
de respeito prestado a Maia na despedida do cargo.
No
domingo (7), Doria recebeu o ex-presidente da Câmara e o seu vice-governador,
Rodrigo Garcia, que também é do DEM. Ambos foram convidados para integrar o
PSDB, algo que o tucano confirmou em entrevista coletiva nesta tarde de
segunda.
"Ficaremos
muito felizes se eles aceitarem", disse. "Fez bem o PSDB em convidar
Rodrigo Maia para entrar no partido. Presidiu corretamente a Câmara e é bom
quadro político. Tomara que aceite", escreveu FHC no Twitter no começo da
noite.
No
caso de Garcia, a possibilidade é bastante grande, já que o DEM deixou de ser
um partido com o qual Doria conta para 2022.
O
tucano tem um compromisso de deixar o cargo para que Garcia dispute a reeleição
como governador. Apesar de estar no DEM/PFL desde 1994 e hoje comandar o
partido no estado, sempre trabalhou com os tucanos.
De
quebra, se ele estiver no PSDB, são
tolhidas as eventuais pretensões de Geraldo Alckmin, com quem Doria almoçou
recentemente, de voltar a disputar o Bandeirantes. A aliados, contudo,
o ex-governador cita que considera quem estiver na cadeira e puder concorrer é
o "candidato nato".
Garcia
já foi sondado por Baleia para migrar para o MDB, mas esse movimento parece
muito difícil. O partido já apoia o governo Doria e teve a
vaga de vice da chapa vitoriosa de Bruno Covas (PSDB) na capital
paulista ofertada pelo tucano em nome de um acerto em 2022.
ACM
Neto ainda está tentando convencer Garcia a ficar no DEM. Ele marcou para esta
terça (9) uma visita a ele e a Doria para discutir o assunto, mas as chances
são baixas.
Já
a realidade de Maia é algo diferente. Entrar no PSDB significaria dar o
controle partido no Rio, seu estado, para o deputado. Mas ele colocou como
condição para tal um processo que chamou de purificação da sigla.
Entre
outros nomes que devem migrar para o PSDB está o de Luiz Henrique Mandetta, o
ex-ministro da Saúde demitido por Bolsonaro devido a divergências no manejo da
pandemia.
O
embate entre Doria e Aécio, que quase foi eleito presidente no segundo turno em
2014 e
caiu em desgraça após a divulgação do áudio em que pedia dinheiro para
o empresário Joesley Batista, é antigo.
O
governador considera o mineiro um fardo político incontornável em termos de
imagem, além de rival na política interna da sigla.
O
paulista buscou
a expulsão do mineiro da sigla, mas foi derrotado na Executiva Nacional.
Depois, viu o deputado quase emplacar um nome seu, Celso Sabino (PA), na
liderança do partido na Câmara.
A
força de Aécio na bancada, apesar de seu ostracismo público, é grande e
transcende o PSDB. Mas ele sofreu reveses recentes: Sabino está com o pedido de
expulsão da sigla em análise pela Comissão de Ética do partido.
Aí
entra a confluência com a velha guarda do PSDB, tradicionalmente pouco afeita a
Doria e que acalenta desde 2018 uma candidatura do apresentador Luciano Huck à
Presidência.
Com
o "embaixador" de Doria em Brasília Antonio Imbassahy de mediador, os
dois grupos concordam que é preciso isolar Aécio e talvez mais seis deputados
—preferencialmente os expulsando do PSDB.
O
vácuo seria ocupado por nomes ligados a Maia e a Garcia egressos do DEM e que
estão irritados com a condução de ACM Neto.
A
guerra ficou escancarada em uma entrevista concedida por Maia ao jornal Valor
Econômico nesta segunda, na qual disse que o ex-prefeito de Salvador entregou
"a cabeça do partido para Bolsonaro".
O
baiano retrucou nesta tarde, dizendo
à Folha que o deputado "se
encastelou no poder conquistado e, agora, demonstra surpreendente
descontrole".
Doria
namora o que seus aliados chamam de "DEM do bem", avessos à
aproximação com o centrão e o Planalto.
Há
resistências contra esse movimento na bancada federal. Um aliado de Aécio
afirma que pelo metade do partido na Câmara não concorda com o que chama de
"exibicionismo" do tucano paulista, ainda que reconheça seu peso
relativo pela cadeira que ocupa e pelo protagonismo
no combate à pandemia do novo coronavírus.
Esse
deputado afirma, contudo, que prefere ver uma disputa interna no PSDB entre
Doria e Eduardo Leite, o governador gaúcho que já foi especulado para tal
missão pela velha guarda.
Com o racha instalado no partido, contudo, o tempo corre para que os tucanos se decidam. Na avaliação de seus aliados, a projeção nacional dada pelo patrocínio da vacinação contra a Covd-19 deu a Doria o carimbo que faltava para suas pretensões presidenciais.
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