segunda-feira, 22 de janeiro de 2024

Marcos Strecker - 2024 será uma reedição de 1968?

Revista IstoÉ  

Há 60 anos, a sociedade também estava rachada e a direita crescia. Mas, ao contrário do momento atual, a democracia se fortalecia

Mal o ano começou, dois eventos bombásticos mostraram as fortes emoções que devem sacudir o planeta em 2024. O ataque dos militares americanos e britânicos contra o grupo terrorista Houthi no Mar Vermelho confirma que o conflito israelense em Gaza começa a se espalhar para o Oriente Médio, o que, ao lado da guerra na Ucrânia, ameaça a economia mundial. Em Davos, os líderes mundiais apostam em desaceleração nos próximos meses. Nos EUA, a vitória acachapante de Donald Trump nas prévias de Iowa confirma que ele será o candidato republicano e provavelmente voltará à Presidência do país.

Este ano eleitoral nos EUA será, tudo indica, uma reedição de 1968. Naquela época, a Guerra do Vietnã incendiava as universidades e a sociedade estava em pé de guerra por causa da lei de direitos civis, que garantiram a integração e os direitos dos negros. Martin Luther King e Robert Kennedy foram assassinados, enquanto os democratas sucumbiram por brigas internas e pela a impopularidade de Lyndon Johnson.

A vitória de Richard Nixon marcou o início da nova direita que ameaçou a democracia com Watergate, triunfou com Ronald Reagan e desembocou em Donald Trump.

Em 2024, a polarização racha novamente os EUA, mas o momento atual parece ainda mais grave que há 60 anos. A Suprema Corte pode referendar o avanço autoritário do trumpismo, envergando a democracia mais forte do planeta — ao invés de garanti-la, como aconteceu nos anos 1970. A volta do isolacionismo e do protecionismo, assim como o apoio de Donald Trump a ditadores, no cenário que se desenha, tem o potencial nefasto de enfraquecer democracias pelo mundo. A China, maior rival dos EUA, está na grande corrida armamentista do pós-Segunda Guerra.

Os ecos de 1968, porém, mostram que nem tudo está perdido: aquele período conturbado permitiu uma revolução comportamental e uma explosão criativa nas artes. Por outro lado, eles servem de alerta.

A renovação intelectual construída desde então sobre os escombros do comunismo evoluiu para a ideologia identitária, divisiva e autoritária, que alimenta um novo segregacionismo. Naquela época, a imprensa se fortaleceu. Agora, as redes sociais armam os populistas. Nova Guerra Fria, conflitos mundiais, democracia ameaçada e crise climática inédita: não há nostalgia que resista ao arriscado mundo novo que este ano descortina.

Nenhum comentário: