- O Globo
Nos primeiros dois encontros na TV, os presidenciáveis seguiram a cartilha dos marqueteiros. Houve pouco confronto de ideias e muita conversa fiada para tapear o eleitor
Numa eleição confusa, os debates deveriam ajudar o eleitor a distinguir os candidatos e ouvir o que eles tentam esconder na propaganda. Não tem sido assim em 2018. Nos primeiros dois encontros na TV, os presidenciáveis seguiram a cartilha dos marqueteiros. Houve pouco confronto de ideias e muita conversa fiada para tapear a plateia.
“Eu não sou político”, recitou Henrique Meirelles, na abertura do debate da RedeTV!. O discurso não poderia soar mais falso. Ele já se elegeu deputado, filiou-se a três partidos e foi ministro de dois governos. O emedebista também mostrou estar treinado para esquecer a palavra “banco”. Agora ele só diz que presidiu um “grande grupo financeiro”.
“É mentira que eu defendi, em qualquer época da minha vida, que mulher deve ganhar menos do que homem”, jurou Jair Bolsonaro. O deputado já sustentou a tese machista ao menos duas vezes. Numa delas, estava no mesmo estúdio usado no debate. “Eu não empregaria com o mesmo salário”, afirmou, diante da apresentadora Luciana Gimenez.
Marina Silva tropeçou nas próprias incoerências. Ela acusou Aécio Neves de cometer “graves crimes de corrupção”, mas omitiu sua aliança com o tucano em 2014. Depois afirmou que o governo Temer “não tem legitimidade”, mas se esqueceu de dizer que apoiou o impeachment.
Em outra passagem, Geraldo Alckmin reescreveu a história e afirmou que “foi o governo do presidente Fernando Henrique, o PSDB, que fez o Plano Real”. Quando a moeda foi idealizada, FH era ministro da Fazenda do governo Itamar Franco.
É verdade que o formato engessado atrapalha os debates. A lei eleitoral exige a presença de oito candidatos. Em breve serão nove, quando o PT formalizar a indicação de Fernando Haddad.
Mas os programas poderiam ser menos aborrecidos se os presidenciáveis não insistissem na tática da repetição. No debate da Band, Ciro Gomes prometeu cinco vezes tirar o nome dos inadimplentes da lista do SPC. Alvaro Dias disse quatro vezes que entregaria o Ministério da Justiça ao juiz Sergio Moro. Guilherme Boulos repetiu três vezes a tirada dos “50 tons de Temer”.
Com uma Bíblia surrada na mão, Cabo Daciolo tem dado um toque de surrealismo aos debates. Quem troca de canal durante as suas pregações exaltadas deve pensar que caiu na “Sessão do Descarrego”. Na Band, ele virou piada ao praguejar contra a Ursal, uma união de repúblicas socialistas que só existe no mundo da imaginação. Na RedeTV!, citou Deus dez vezes e Jesus outras seis. Depois esclareceu: “Não estou aqui pregando religião”.
O bombeiro também teve seus acessos de lucidez. No fim do debate de sexta, ele avisou: “Nação brasileira, isso aqui é um grande teatro. Isso aqui é uma grande mentira. São só promessas. São os mesmos de sempre que estão na política há anos”. Pode ter sido tarde demais para o alerta. Já passava de meia-noite, e boa parte da audiência tinha ido dormir.
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