Renan
Calheiros prega reeleição de Davi pela “estabilidade”
O
bordão é da Dona Bela, a “moça intocada” vestida de colegial, que se atirava ao
chão com histeria, depois se levantava, embicava os lábios e revirava os olhos
com aquele ar de quem comeu e gostou, na Escolinha do Professor Raimundo.
Mas
também saiu dos versos do malemolente Genival Lacerda, cantor de “ele tá de
olho é na butique dela”. Até hoje, o quase nonagenário paraibano se sacoleja em
shows pelo Nordeste, ao som de:“ você só pensa naquilo; você só pensa naquilo;
você só pensa naquilo, meu bem; você só pensa naquilo”.
Da
turma de Chico Anísio ou do xote nordestino, poucas vezes o bordão da comédia e
do forró serviu tanto para definir os bastidores de Brasília como nos últimos
dias.
Todos
os comensais negam, mas somente uma pauta fazia salivar os participantes da
rodada de jantares dos últimos 20 dias em Brasília, nas residências do
presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), da senadora Kátia Abreu (PP-TO), e
do ministro do Tribunal de Contas da União (TCU) Bruno Dantas: a sucessão na
Câmara e no Senado.
Sobrava
algum espaço para discutirem a sabatina do desembargador Kássio Marques,
indicado para o Supremo Tribunal Federal (STF), e com menos interesse, a vacina
da Covid-19. O coronavírus não é mais prioridade para os políticos, que após
meses de isolamento, voltaram a Brasília e renunciaram às máscaras nesses
encontros gastronômicos para matar a fome de articulação política ao vivo,
depois de tanto debate online.
Como
consequência desse desinteresse pela pandemia, normalizaram-se as notas
oficiais lacônicas, em que o político informa que se infectou, mas passa bem.
Nenhum deles menciona uma tomografia de pulmão, um eletrocardiograma, um
monitoramento médico diário ou uma discreta perda de olfato ou paladar.
Menos
de uma semana após o evento na casa do ministro Bruno Dantas, para reconciliar
Maia e Paulo Guedes, dois convidados vieram a público informar que se
infectaram, mas passam bem: o ministro da Secretaria de Governo, Luiz Eduardo
Ramos, e o líder do MDB no Senado, Eduardo Braga (AM).
Rodrigo
Maia, recém curado da covid, estava, teoricamente, com os anticorpos nas
alturas. Por isso, não se preocupou em receber a oposição para um jantar um dia
após a reunião na casa de Dantas.
Segundo
um dos presentes, Maia pediu à oposição apoio a candidatos que estejam
comprometidos a “valorizar a instituição”. Nesse rol, citou nominalmente seus
aliados: o vice-presidente da Câmara, Marcos Pereira (Republicanos-SP), o autor
da proposta da reforma tributária e líder do MDB, Baleia Rossi (SP), o deputado
Marcelo Ramos (PL-AM).
Para
arrepio do líder do Centrão, Arthur Lira (PP-AL), principal adversário de Maia
na sucessão, o presidente incluiu na lista de candidatos de seu grupo dois
nomes do PP: o relator da reforma tributária, Aguinaldo Ribeiro (PB) e a
deputada Margarete Coelho (PI). Aguinaldo é competitivo, mas a cúpula do PP
fechou com Lira. A ideia é contemplar Aguinaldo com outro posto. Eventualmente,
um ministério no ano que vem.
A
referência de Maia a Baleia Rossi embaralha um dos cenários no Senado. Se ao
fim, o Supremo proibir o presidente da Casa, Davi Alcolumbre (DEM-AP), de
disputar a reeleição, o caminho estaria aberto para um emedebista, pela
prerrogativa de representar a maior bancada.
Todavia,
o Centrão não endossaria o retorno da hegemonia do MDB na cúpula do
Legislativo. Uma das leituras é que Baleia sendo contemplado com a eventual
aprovação da reforma tributária ao menos na Câmara, Braga teria o caminho livre
para tentar o comando do Senado.
Segundo
outro participante do jantar na casa de Maia, ele se declarou convencido de que
não deve ser candidato, caso a reeleição seja franqueada para os titulares das
duas Casas.
A
fonte ressalva, entretanto, que Maia não poderia afirmar o contrário em
público. Nos bastidores, contudo, a recondução da dupla Maia-Alcolumbre
entusiasma o mercado, em nome da estabilidade institucional e da garantia de
continuidade das reformas.
Nas
conversas reservadas, o senador Renan Calheiros (MDB-AL), que ganhou novo
protagonismo com a interface com Guedes, tem pregado justamente essa tese. A
interlocutores que o ouviram nos três jantares de que participou - dois na casa
de Kátia Abreu, um na de Bruno Dantas - o ex-presidente do Senado disse que
apoia a reeleição de Alcolumbre em nome da estabilidade institucional e
democrática.
Renan
argumenta que num cenário em que a democracia esteve por um fio - até os
caciques se deixarem levar pela crença de que domesticaram o presidente Jair
Bolsonaro - a reeleição de Alcolumbre, um interlocutor reconhecido do Palácio
do Planalto, é a garantia de dois anos de harmonia institucional e da defesa
das reformas necessárias ao ajuste fiscal.
A
coluna apurou que aliados de Alcolumbre fizeram essa tese chegar a ouvidos de
ministros do Supremo, que julgarão a legitimidade constitucional de sua
eventual reeleição.
Um
senador bem informado pondera, entretanto, que apesar do aparente favoritismo
de Davi, há três grupos distintos organizados sobre a sucessão na direção da
Casa.
O
primeiro grupo está comprometido com Alcolumbre, que já dividiu espaços na Mesa
Diretora e nas presidências das comissões.
Um
segundo grupo, que este senador chama de “ingênuos”, estaria convencido de que
o Supremo agirá com responsabilidade para impedir a “aventura constitucional”,
de autorizar a reeleição do presidente no meio da legislatura.
O
terceiro grupo seria formado por senadores que fazem “jogo duplo”. Fingem que
estão com Alcolumbre, tentam iludi-lo desse compromisso, mas dia e noite estão
dedicados à procura de um plano B.
Contudo, mesmo este grupo se inclina para Alcolumbre quando bate o receio de que a ausência de um segundo nome competitivo abra caminho para um tertius de espírito intrépido, disposto a aventuras como processar o impeachment de um ministro do STF, ou instalar uma “CPI da Toga”.
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