Se
a esquerda não brigasse contra ela mesma nas eleições, não seria a esquerda
Com
a mesma sem cerimônia com que comentava futebol no rádio ou instruía jogadores
da seleção brasileira à beira do gramado, João Saldanha respondeu ao convite do
Partido Comunista, para que se candidatasse a prefeito do Rio, em 1985, dizendo
que não tinha “um terno preto” para usar na campanha.
O
terno preto era uma sutil estocada nos prefeitos anteriores, todos biônicos,
como se dizia na época, empossados depois da fusão da Guanabara com o antigo
Rio de Janeiro, em 1975 —a cidade do Rio passando a ser a capital do novo
estado. Marcos Tamoyo, da Arena, foi disparado o pior deles, páreo duro com o
atual Marcelo Crivella,
mas este ainda leva muita vantagem.
“Eu
não sou candidato. Até porque a lagoa é do estado, só o peixe podre é que é da prefeitura.
O Theatro é Municipal, mas quem manda é o estado. Eu vou fazer o quê? Pegar o
lixo? Eu não quero esse cargo”, disse Saldanha, cobrando mais autonomia para o
município.
Pressionado
por velhos companheiros do Partidão, ele aceitou ser o vice na chapa encabeçada
por Marcelo Cerqueira, advogado de presos políticos: “Quero ajudar um bocadinho
a provar que as forças da chamada esquerda podem se juntar”.
Mas as forças da esquerda não estavam tão unidas assim. A vontade de Cerqueira e Saldanha, da coligação PSB-PCB, era derrotar Saturnino Braga, do PDT brizolista, que acabou confirmando o favoritismo na eleição. Hoje impera o fogo amigo entre as candidaturas de Marta Rocha (PDT), Benedita da Silva (PT) e Renata Souza (PSOL), que juntas somam 21% das intenções de voto, segundo o Datafolha. O líder das pesquisas, Eduardo Paes, tem 30%.
Quanto
ao lixo, era uma blague de João Saldanha. Cuidar dele nunca foi um encargo
menor, quanto mais numa metrópole. Crivella tornou-se inelegível, em decisão do
TRE-RJ, porque sujou a Comlurb, a empresa de limpeza pública, praticando abuso
de poder.
*Alvaro Costa e Silva, jornalista, atuou como repórter e editor. É autor de "Dicionário Amoroso do Rio de Janeiro".
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