Por Andrea Jubé, Lucas Marchesini, Bruno Peres e Vandson Lima - Valor Econômico
BRASÍLIA - Pressionada pelo ex-presidente Lula e o PT, a presidente Dilma Rousseff decidiu substituir o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, por Wellington César Lima e Silva, que foi procurador-geral da Bahia e é ligado ao ministro da Casa Civil, Jaques Wagner. A mudança ocorre no momento em que a Operação Lava-Jato confirmou que está investigando se Lula teria recebido vantagem "durante seu mandato presidencial" das construtoras envolvidas no escândalo da Petrobras.
Esta é a terceira troca de ministro em 14 meses do segundo mandato de Dilma atendendo a pressões de Lula - os outros foram Aloízio Mercadante, que deixou a Casa Civil e assumiu a Educação, e Joaquim Levy, demitido da Fazenda. Ministro da Justiça mais longevo da história - cinco anos e dois meses -, Cardozo vinha pedindo para deixar o cargo. Na semana passada, teve reunião com deputados do PT e considerou "desrespeitosas" críticas feitas pelos mais ligados a Lula.
Cardozo perdeu o cargo, mas não a confiança de Dilma, que o convenceu a assumir o comando da Advocacia-Geral da União, decisão que desagradou a Lula e ao PT. Seu sucessor, segundo apurou o Valor, vai promover mudanças no comando da Polícia Federal. Para delegados e procuradores, a troca de ministro não afetará as operações em curso.
Avanço da Lava-Jato tira Cardozo do Ministério da Justiça
A presidente Dilma Rousseff anunciou ontem a terceira mudança no primeiro escalão em 13 meses de segundo mandato, desta vez no Ministério da Justiça, num momento em que a Operação Lava-Jato avança sobre o PT e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Dilma nomeou para o cargo o baiano Wellington César Lima e Silva, ligado ao chefe da Casa Civil, Jaques Wagner. O ex-titular da pasta José Eduardo Cardozo assumirá a Advocacia-Geral da União. O próximo passo é a nomeação do novo diretor-geral da Polícia Federal, que caberá ao novo ministro. As posses dos novos titulares das pastas - também foi anunciado Luiz Navarro de Brito para a Controladoria-Geral da União - estão previstas para quinta-feira.
Cardozo é o segundo aliado, amigo e fiel escudeiro que Dilma é obrigada a reacomodar em um cargo de menor expressão após intensa pressão de Lula e do PT. Em outubro, Dilma devolveu Aloizio Mercadante - igualmente próximo a ela - para o Ministério da Educação, a fim de acomodar o então titular da Defesa, Jaques Wagner, mais próximo a Lula, na Casa Civil. Em dezembro, trocou o ministro da Fazenda, nomeando Nelson Barbosa em lugar de Joaquim Levy.
Desde que a Polícia Federal intensificou o cerco contra lideranças petistas e contra Lula - nas Operações Lava-Jato, Zelotes e Acrônimo -, o PT elevou a pressão pelo afastamento de Cardozo. As mudanças na cúpula da PF podem impactar o rumo das investigações. O cargo de diretor-geral da PF, hoje ocupado por Leandro Daiello, é de livre nomeação do ministro da Justiça.
A gota d'água para a saída de Cardozo foi uma reunião com deputados federais petistas no dia 23, no gabinete ministerial. Cardozo disse a interlocutores que se incomodou com manifestações que considerou "desrespeitosas", em especial por parte de deputados mais ligados ao ex-presidente Lula, como Paulo Pimenta (PT-RS) e Wadih Damous (PT-RJ). No encontro, alguns deputados disseram a Cardozo que a falta de comando dele sobre a Polícia Federal tornara-se evidente diante dos episódios recentes.
O fato mais gritante seriam os vazamentos de uma troca de e-mails do marqueteiro João Santana com a presidente Dilma. Em meio à Operação Acarajé, a imprensa divulgou um relatório sigiloso da PF de análise do e-mail de Santana, em que o publicitário encaminha mensagens do ex-ministro Mangabeira Unger pedindo audiência com Dilma.
Na mesma reunião, os petistas cobraram a conclusão do inquérito sobre a descoberta de grampos na cela do doleiro Alberto Youssef na carceragem da PF em Curitiba (PR). E a abertura de investigação pela PF contra o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, que acabou sendo deflagrada na sexta-feira.
No sábado, na festa de 36 anos do PT, Lula queixou-se no discurso de perseguição pela PF e pelo Ministério Público Federal. "Recebi uma intimação de que, a partir de segunda-feira, vão quebrar meu sigilo bancário, telefônico, fiscal. O meu, da Marisa, do meu neto, se precisar até da minha netinha de um mês", ironizou. Dilma aproveitou as mudanças para anunciar também a nomeação de Luiz Navarro de Brito para a Controladoria-Geral da União. A pasta responsável pelos acordos de leniência estava sob o comando de um interino, Carlos Higino, desde outubro, quando Dilma promoveu o então titular, Valdir Simão, para o Planejamento.
A mudança no comando da Justiça repercutiu no Congresso. Senadores da oposição previram o enfraquecimento das investigações da Operação Lava-Jato.
O presidente nacional do PSDB, senador Aécio Neves (MG), destacou que a troca no comando do Ministério da Justiça ocorre justamente no momento em que o PT aumenta suas cobranças ao governo e aprofunda suas críticas à PF. "O país não aceitará qualquer tentativa de interferência na autonomia da Polícia Federal ou de cerceamento das nossas instituições", disse o senador tucano.
O líder do DEM, senador Ronaldo Caiado (GO), afirmou que a insistência do PT, personificada na figura do ex-presidente Lula, para que o ministro da Justiça interfira no andamento das investigações contra o partido "constrange e envergonha o país". Em sua avaliação, o episódio irá revoltar a população e é um incentivo para o engajamento à onda de protestos convocados para o dia 13 de março em todo o país contra o governo Dilma. "A sociedade não vai admitir qualquer golpe contra a Lava-Jato", afirmou Caiado.
Senadores do PT investigados na Operação Lava-Jato, Gleisi Hoffmann (PR) e Humberto Costa (PE), minimizaram a saída de José Eduardo Cardozo da Justiça. Para Gleisi e Humberto, a saída de Cardozo deve-se a questões pessoais e a troca não interferirá no curso das investigações relativas à gestão da Petrobras. "É natural ministros deixarem pastas. Não é o primeiro ministro a ser trocado e não será o último. Ele já estava há bastante tempo e já havia essa vontade de deixar o posto", disse Gleisi. "Ele [Cardozo] já tinha manifestado por três vezes o desejo de sair do Ministério, até por questões de saúde", afirmou Costa.
Ambos rechaçaram uma possível pressão do PT sobre Cardozo, por não blindar o partido nas investigações. "O PT pode ter suas críticas ao governo, posicionamentos políticos, mas jamais houve pressão contra o ministro. Qualquer ministro terá de ter o posicionamento do ministro José Eduardo: a Polícia Federal tem autonomia, inclusive para seus delegados instaurarem inquérito", disse Gleisi, já comentando o perfil do novo ministro. "Um integrante do MP não vai se subordinar a outro comportamento. A sociedade jamais permitiria um retrocesso".
A senadora negou, ainda, que a saída de Cardozo seja uma vitória do ex-presidente Lula e seus aliados, que estariam insatisfeitos com o ministro. "O presidente Lula não disputa vitórias dentro do governo. A presidente Dilma tem sua autonomia para nomear e tirar quem quer que seja como ministro".
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