sexta-feira, 13 de março de 2009

Uma pequena mostra de um debate civilizado

EDITORIAL
DEU NO VALOR ECONÔMICO


Em debate promovido pela prefeitura de São Bernardo do Campo, a ministra da Casa Civil do governo de Luiz Inácio Lula da Silva, Dilma Rousseff (PT), e o governador de São Paulo, José Serra, do PSDB, partido do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, divergiram polidamente e debateram ideias. Os dois são pré-candidatos de seus partidos à disputa pela Presidência, em 2010. Embora seja muito cedo para se falar em campanha eleitoral, os dois certamente defenderam posições como postulantes ao cargo. Mostraram que é possível um debate civilizado, mesmo com claques de um e outro lado. E que os dois partidos polarizadores do eleitorado podem ter razão e ambos podem estar errados, dependendo do ângulo que se olha o problema.

Serra e Dilma atacaram as administrações federais de seus adversários. Ambos concordaram ao atribuir responsabilidade da contaminação da economia brasileira pela crise internacional à política monetária que se manteve escorada em juros altos. De quem é a culpa pelas altas taxas de juros? Dos governos de Fernando Henrique Cardoso, sustentou Dilma. "Dominamos [o Brasil] a inflação, mas viemos ao longo dos anos, depois do início do Plano Real, com um dos juros mais elevados do mundo", afirmou a ministra petista. "Nossa taxa de juros não era uma das maiores do mundo, é uma das maiores do mundo", rebateu o governador.

Dilma, como representante do governo ou candidata, tanto faz, acenou com uma promessa, meses depois do abalo sísmico mundial e há seis anos do início do mandato de Lula. "Nós iremos baixar os juros básicos e iremos pelo menos criar uma referência para os spreads no Brasil", disse. Ao que Serra retrucou: a redução dos juros já devia ter sido adotada há seis meses. "Não havia risco de inflação que justificasse a política de juros federal, ainda mais depois da crise (...) Boa parte das dificuldades de hoje ocorre porque passamos seis meses sem que houvesse uma política ativa [de redução de juros]", disse Serra.

A ministra petista fez uma outra diferenciação dos governos tucano e petista: "O governo sempre foi parte do problema em todas as crises antes desta. Quando a crise ocorria internacionalmente, via câmbio e saída brutal de capitais, o governo quebrava (...) Agora o governo é parte da solução." A contrapartida da afirmação pode estar no parágrafo acima: a demora de um governo, que seria "parte da solução", de afrouxar a política monetária.

O debate entre os dois pré-candidatos, excluídas as acusações de lado a lado, acaba mostrando que não há discordâncias básicas entre ambos - eles apenas atribuem responsabilidades a seus adversários. Os dois concordam que a política monetária acabou fragilizando uma economia que não seria excessivamente atingida pela crise internacional se o problema tivesse sido atacado de frente logo no início. Existe na afirmação deles, no entanto, algo que aparece no debate apenas de forma velada, sem uma definição clara de posições. Depreende-se, pelo fato de Serra atribuir a Lula a responsabilidade por não ter derrubado os juros em tempo, que ele considera parte da política econômica a política monetária - e isso incluiria um Banco Central integrado ao esforço de política econômica do governo. Da mesma forma, a ministra, ao se referir ao governo anterior, atribuiu ao Executivo a responsabilidade sobre a política monetária. Por essas afirmações, é possível entender que, segundo os candidatos, os governos Lula e FHC abriram mão de prerrogativas de governo.

Para aprofundar o debate, os dois devem colocar, sem reticências, como se faz política monetária integrada à política econômica. A autonomia do BC, embora tenha acontecido de fato, e não de direito, nos governos dos dois últimos presidentes, não frequentou a campanha eleitoral passada, e é recomendável que não se preste a isso. É preciso que não se confunda eventuais decisões equivocadas sobre juros do BC com o princípio de autonomia.

Daqui para a frente, dada a enorme repercussão da crise internacional na economia do país, sentida com o baque do PIB, e a antecipação do processo eleitoral - pela ação principalmente do presidente Lula em favor de Dilma -, vai se acirrar a discussão sobre a política econômica. Um debate eleitoral civilizado que se concentre em temas relevantes para o futuro, nesse momento, será muito importante para o país.

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