- Folha de S. Paulo
"Tiraram uma presidenta honesta". A frase, que se refere ao impeachment de Dilma Rousseff, ainda ecoa nas redes sociais. Mas será que é verdadeira? A resposta, óbvio, depende de como conceituamos o termo "honesta".
Se os vazamentos do depoimento de Marcelo Odebrecht à Justiça Eleitoral são fidedignos e se o empresário ainda não aderiu à moda dos fatos alternativos, a situação de Dilma se complica. Pelo relato de "O Estado de S. Paulo", que me pareceu o mais contundente, Odebrecht disse que 4/5 de um total de R$ 150 milhões que o grupo empresarial destinou à campanha de Dilma e de Temer em 2014 vieram via caixa dois e que a petista tinha a dimensão desses valores.
No aspecto anedótico, não dá mesmo para comparar o caso de Dilma com o de Sérgio Cabral, por exemplo. Não se tem notícia de que a ex-presidente tenha adquirido uma bijuteria com dinheiro sujo, enquanto o ex-governador, a julgar pelo que saiu na imprensa até aqui, usava recursos oriundos de corrupção para manter um estilo de vida nababesco, comprando coleções de joias, ternos italianos, uma privada polonesa (não me perguntem o que ela faz) e, suspeita-se, até um iate de 75 pés.
No Brasil, é frequente traçarmos essa divisão entre políticos que roubam para enriquecer e aqueles que aceitam dinheiro irregular apenas para financiar suas campanhas. Até admito que possa haver uma diferença moral entre os dois tipos, mas me parece problemático considerar desonestos só aqueles que sucumbem às tentações e se convertem na caricatura mesma do político corrupto.
Se vamos qualificar como honestos e éticos políticos que aceitam recursos ilícitos desde que limitados à campanha, chancelamos uma ideia ainda mais perversa, que é a de que dirigentes são livres para escolher quais leis vão respeitar e quais vão descumprir. Fazê-lo significaria negar todo o sistema de freios e contrapesos que caracteriza a democracia.
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