Folha de S. Paulo
Projeto que aumenta número de deputados abre
espaço para distorções indesejáveis
O prazo para que o Congresso legisle
sobre uma regra clara para a redistribuição
proporcional das cadeiras da Câmara dos Deputados se encerra no dia 30
de junho. Pressionados pelo calendário, senadores apresentaram pedido de
urgência para a apreciação do PLP 177/2023 e pretendem votá-lo ainda nesta
semana.
O projeto, já aprovado pela Câmara no início de maio, define que a distribuição das vagas entre os estados deve seguir o método das maiores médias, já utilizado no sistema eleitoral brasileiro, respeitados os limites constitucionais de, no mínimo, 8 e, no máximo, 70 deputados por estado. Mais do que isso, propõe que a redistribuição só ocorra após o próximo censo demográfico, previsto para 2030, e aumenta em 18 o número total de cadeiras para a Câmara dos Deputados a partir da eleição de 2026.
O aumento serve como compensação aos estados
que ganhariam cadeiras com a aplicação imediata da regra proporcional, mas
preservando o tamanho atual das bancadas dos estados que perderiam
representação. A justificativa para essa solução foi a alegação de que os dados
do Censo
de 2022 são pouco confiáveis. Esse argumento apareceu especialmente no
discurso dos deputados do Rio
de Janeiro, estado que seria mais afetado pela redistribuição.
O PLP avança ao definir uma regra clara que
pode ser implementada pela Justiça
Eleitoral de forma automática após cada censo. No entanto, abre espaço
para distorções indesejáveis, como impedir a redução das bancadas estaduais e a
ausência de critérios objetivos para definir o número total de deputados.
Nesse ponto, vale mencionar o trabalho
clássico de Rein Taagepera (1972), que propôs uma fórmula simples para estimar
o tamanho ótimo dos legislativos: o número de representantes deveria ser
proporcional à raiz cúbica da população. Aplicando essa lógica ao Brasil,
segundo estimativas do cientista político Bruno Bolognesi (UFPR), teríamos
entre 538 e 577 deputados federais —mais que os 531 propostos no PLP. O
critério busca equilibrar representatividade e eficiência ao evitar que cada
parlamentar represente um contingente populacional excessivo e dificulte a
comunicação entre representantes e representados.
Adotar um parâmetro objetivo como o de
Taagepera permitiria uma discussão mais qualificada sobre a representação
política e o número ideal de cadeiras por estado, o que é indesejado pois
abriria espaço para a revisão dos limites constitucionais de mínimo e máximo, o
que não interessa às elites políticas que se beneficiam dessas amarras.
Sem revisar o teto de 70 cadeiras, qualquer
ampliação na Câmara tende a acentuar a sub-representação de estados mais
populosos, como São Paulo.
Atualmente, a sobrerrepresentação favorece apenas os estados beneficiados com a
representação mínima, mas com a aprovação do PLP também beneficiará Rio de
Janeiro, Paraíba, Piauí, Rio Grande do Sul e Alagoas, que terão suas bancadas
artificialmente infladas.
Há espaço para o Senado aperfeiçoar
o texto. É possível manter o aumento de cadeiras desde que se assegure a
proporcionalidade entre população e representação política, ao menos entre os
estados que estão acima do mínimo e abaixo do teto constitucional.
*Professora na Escola de
Economia de São Paulo (FGV-EESP) e pesquisadora do Cepesp. Doutora em ciência
política pelo IESP-UERJ
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