Conteúdo previsto para o ano não é cumprido por 75% dos professores
Ocimara Balmant
Nas escolas brasileiras, o aluno é promovido de série sem que tenha tido acesso a todo o conteúdo previsto. Dados da Prova Brasil mostram que 75% dos professores desenvolvem menos de 80% do que deveria ser trabalhado no ano.
Os dados foram tabulados pelo Estado a partir do questionário da Prova Brasil 2009, respondido por 216.495 docentes de instituições públicas de todo o País que dão aulas para alunos do 5.º e 9.º ano do ensino fundamental, público-alvo da avaliação.
Os Estados da Região Nordeste apresentam os piores porcentuais de cumprimento do currículo. Nos Estados do Rio Grande do Norte, Alagoas, Ceará e Maranhão, por exemplo, quase 30% dos docentes não conseguem cumprir nem a metade do currículo proposto.
Nesses locais, o índice de professores que conseguem cumprir mais de 80% do conteúdo previsto cai para apenas 10%.
Um reflexo desse ensino incompleto está nos resultados da Prova Brasil. Quanto terminam o 5.º ano, 34,2% dos alunos têm conhecimento de português adequado à série. Em matemática, o índice é de 32,5%. Ao fim do 9.º ano, o rendimento piora ainda mais: apenas 14,7% dos alunos sabem o mínimo em matemática e 26,2%, em português.
"Isso acontece porque os conteúdos são cíclicos, retornam em anos seguintes de forma mais complexa. Se o aluno não o aprendeu bem, não conseguirá acompanhar na série seguinte", afirma Maria Carolina Dias, especialista em Gestão Educacional da Fundação Itaú Social.
Causa. Mas não basta responsabilizar o professor. O não cumprimento do conteúdo, segundo especialistas, reflete problemas complexos da educação brasileira, como a formação deficiente dos docentes, a falta de um acompanhamento pedagógico da escola e, principalmente, a necessidade de que o País implante um currículo nacional coerente e que priorize os conteúdos elementares.
"Não dá para nomear apenas um culpado. A responsabilidade é coletiva. Por isso é que políticas públicas focadas apenas na cobrança de resultados não são suficientes. É preciso investir na estrutura das escolas e no professor", afirma Branca Ponce, professora de pós-graduação em Educação e Currículo da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).
Formação. Na discussão sobre a responsabilidade do professor, o primeiro ponto a ser observado é a falta de repertório, avalia Maria Carolina, da Fundação Itaú Social. "Muitos professores desconhecem o assunto, até porque dão aulas de disciplinas correlatas. Um biólogo que é professor de matemática não vai cumprir o conteúdo simplesmente porque não sabe."
Além disso, diz Carolina, é preciso que os docentes entendam a importância de planejar o trabalho. "Muitos professores abrem o diário e veem na hora o que precisam fazer, não pensam com antecedência. Para que isso mude, é preciso um bom coordenador pedagógico, que acompanhe e tenha uma visão global."
Para a consultora Ilona Becskeházy, a solução passa, obrigatoriamente, pela criação de um currículo nacional. "O currículo é o mapa de navegação de um sistema de ensino. Aqui no Brasil, como não existem essas metas específicas de aprendizagem, fica impossível averiguar que tipo de conteúdo o professor está ministrando e, consequentemente, se o aprendizado do aluno está garantido."
O grande entrave para a definição desse currículo nacional, explica Ilona, é a ideia de que, com ele, acabaria a autonomia do professor. "Em primeiro lugar, currículo não diminui a autonomia. Além disso, a autonomia não pode ficar acima do direito do aluno de estudar."
FONTE: O ESTADO DE S. PAULO
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