A espalhafatosa mobilização do governo com a concepção de uma nova política de preços para a Petrobras acabou tendo desfecho melancólico. Depois de ter dado alento a expectativas de grandes mudanças, a montanha, mais uma vez, pariu um rato.
O que afinal se anunciou foram aumentos de 4% para a gasolina e de 8% para o diesel, que implicaram reajustes da ordem de metade dessas taxas nos preços cobrados na bomba. Mais do que isso não foi possível. Para poder alardear que "a inflação está em queda" o governo tem feito o que pode e o que não pode para manter a taxa de variação do IPCA abaixo dos 5,84% observados em 2012. E, nesse empenho, pouco importa se a queda, além de insignificante, tiver de ser obtida com repressão de preços. O que hoje se vê é um processo inflacionário cada vez mais assimétrico, em que preços livres têm aumentado a taxas anuais da ordem de 7% a 8% e preços administrados, a pouco mais de 1%.
A expectativa de que a nova política daria início à reversão da fragilização financeira da Petrobras revelou-se completamente infundada. As prioridades da campanha eleitoral falaram mais alto. Tal desfecho já seria deplorável, mesmo que se tratasse somente de mais uma evidência do imediatismo inconsequente que tem pautado a condução da política econômica. Mas, infelizmente, tem explicações ainda mais preocupantes.
O que se notícia é que, nas negociações entre a Petrobras e o governo sobre a questão, teria ficado claro que o Planalto nem mesmo está convencido de que é, de fato, desejável que preços internos de combustíveis estejam alinhados aos preços externos. Aparentemente, viceja na Presidência da República resistência doutrinária à busca desse alinhamento, calcada no argumento de que o combustível produzido no Brasil não tem nada a ver com o preço do petróleo fora do país (conforme escreveu Claudia Safatle, em 29 de novembro, no "Valor Econômico"). E de que o petróleo é extraído e refinado no Brasil por trabalhadores que ganham em reais ("Valor Econômico" de 2 de dezembro).
São argumentos estapafúrdios, que denotam retrocesso preocupante no entendimento da cúpula do governo sobre questões básicas envolvidas na política de preços de combustíveis. Já há muitos anos parecia ter sido clara e definitivamente entendido, tendo em conta a lógica de formação de preços de bens transacionados internacionalmente, que os preços internos de derivados deveriam ser de alguma forma vinculados aos preços externos desses produtos. Exatamente como ocorre com outras commodities — como trigo, soja, alumínio ou celulose — em decorrência do livre funcionamento dos mercados.
É importante notar que, embora a política de alinhamento de preços internos de derivados aos preços externos tenha sido abandonada há anos, o abandono decorreu de improvisações e tentações imediatistas e populistas, e não de qualquer resistência doutrinária explícita à ideia de que, em princípio, o alinhamento era desejável.
A vinculação dos preços internos aos externos tem a virtude de dar, a consumidores e produtores, noção clara do que de fato custa à economia tornar disponível uma unidade adicional do produto. Ao tornar decisões sobre quanto consumir de um determinado bem, cada consumidor deve estar exposto a um preço que reflita corretamente o custo para a sociedade de sua decisão de consumo. É esse custo de oportunidade que cada consumidor deveria ter em conta ao decidir quanto consumir.
Como petróleo e seus derivados são : bens transacionados internacionalmente, o custo para a economia de se tornar um barril o mais disponível é dado pelo seu preço externo. Se o barril tiver que ser importado, por razões óbvias. Se for produzido internamente, porque poderia ser exportado ou permitir importar um barril a menos, caso não fosse consumido.
É lamentável que, a esta altura, exatamente quando o país está em vias de se tomar um grande exportador de petróleo, tenha prosperado no Planalto visão tão equivocada da política de preços de combustíveis.
Rogério Furquim Werneck é economista e professor da PUC-Rio
Fonte: O Globo
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