Apesar dos níveis baixos do desemprego, país não assiste a um aumento descontrolado de salários
A taxa de desocupação no Brasil voltou a cair em fevereiro. Feitas as correções sazonais, ela chegou a 5,6% da população ativa, um novo recorde de baixa na série do IBGE.
Esse número surpreendeu o economista Fabio Ramos, da Quest, que acompanha em detalhe o mercado de trabalho no Brasil. Nas suas palavras, "veio um novo piso. Ceder de 10% para 8% não foi difícil. E foi rápido, cerca de 1% a 2% de queda por ano. Mas esperávamos que a desocupação ficasse estável quando chegasse a 6% da população ativa. Mas continua cedendo, agora na velocidade de 0,5% ao ano".
Ele refaz agora suas previsões: "Ainda em 2012, o crescimento do emprego pelo Caged vai igualar o número de brasileiros que chegam ao mercado de trabalho e, nesse momento, o desemprego vai se estabilizar". Apesar dos riscos, termina seu comentário dizendo que "não cederá dos 5,5%!".
Vida de analista de economia -no Brasil e no mundo- é assim mesmo: surpresas constantes e coragem para recalibrar suas previsões. Mas vou continuar a trazer as observações do Fabio. No relatório que elaborou a partir dos dados do IBGE divulgados ontem, ele destaca ainda os seguintes pontos.
A redução do desemprego veio quase que exclusivamente pelo lado dos serviços. A indústria patina e, se não for revertido o quadro, vai começar a desempregar. Mas, apesar dos níveis baixos do desemprego, não estamos assistindo a um aumento descontrolado de salários. Eles crescem a uma taxa anual real da ordem de 3,5%, que é alta, se não houver ganhos de produtividade da mesma magnitude.
No caso da indústria, as importações de produtos intermediários têm minimizado esse aumento de custos do trabalho. Por isso a taxa de câmbio é uma âncora fundamental para manter a inflação dentro da banda do Banco Central.
Já no setor de serviços, em que os aumentos salariais são superiores à média, o aumento de preços tem sido o caminho escolhido pelas empresas para manter suas margens de lucros. Não por outra razão a inflação para esses produtos tem corrido próxima a 9% ao ano.
Como a geração de novos empregos está crescendo 2,5% ao ano nos últimos meses, a massa total de salários na economia cresce acima de 6% ao ano. Com o crédito bancário ainda em expansão -embora a taxas bem mais reduzidas- e a voracidade do brasileiro pelas compras, o consumo das famílias vai sustentar expansão de pelo menos 3,5% para o PIB.
Mas volto a lembrar que, para chegarmos a um crescimento médio da ordem de 3,5% neste ano, será preciso que, no fim do ano, a economia se expanda a taxas superiores a 5,5% ao ano.
Por isso seria de muito bom-senso o governo moderar seus estímulos à economia, como escrevi na minha coluna anterior.
Para ter uma visão sobre a velocidade de retomada da atividade via consumo, listo abaixo as taxas anuais de aumento do salário real nos meses a partir de setembro do ano passado: -0,4%, -0,7%, -0,4%, +0,8%, +0,7%, +0,9%.
Essa brusca variação no salário real nesse período está associada à inflação de 2011 acima de 6,5% ao ano e à deste início de 2012, próxima a 4% ao ano.
Mas, ao longo dos próximos meses, uma inflação mais elevada vai reduzir os ganhos reais dos salários, com a média do ano convergindo para os 3,5% citados acima.
Finalmente, gostaria de comentar os riscos e os efeitos positivos associados a uma taxa de desemprego tão baixa e à baixa qualificação profissional dos brasileiros que estão no grupo dos "sem ocupação".
Os riscos são claramente ligados a aumentos salariais acima dos ganhos de produtividade das empresas e a pressões de custo que se seguem. Do lado positivo, gosto
de mencionar o fato de que -pela primeira vez em muito tempo- as empresas estão sendo obrigadas a oferecer a seus funcionários e a terceiros cursos de especialização profissional.
Essa mudança de comportamento pode acelerar a melhoria da qualificação profissional do brasileiro sem depender do governo, que sempre se mostrou lento e ineficiente nesse campo.
Luiz Carlos Mendonça de Barros, 69, engenheiro e economista. Foi presidente do BNDES e Ministro das Comunicações (governo Fernando Henrique Cardoso).
FONTE: FOLHA DE S. PAULO
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