As condições macroeconômicas vêm piorando lenta e firmemente no Brasil. Minha percepção é de que isso vai se consolidar ainda mais ao longo do ano. Os gráficos acima ilustram o que foi dito. Comecemos pelo setor externo; a balança comercial vem se enfraquecendo repetidamente, pois de um saldo de quase US$50 bilhões em 2007, atingimos US$ 14 bilhões para os 12 meses terminados em fevereiro.
Na MB, projetamos um número de US$ 7,5 bilhões para o ano de 2013, decorrente da ampliação do déficit do petróleo (inclusive por conta de mais de US$ 4 bilhões em compras internadas no ano passado, mas só registradas neste exercício), do contínuo enfraquecimento das exportações de manufaturados (que caíram 19% em fevereiro frente o mesmo período do ano passado) e de uma expansão mais modesta da receita da venda de produtos básicos ao exterior, em razão de menores cotações.
O possível colapso cambial da Argentina, a difícil situação da Venezuela na área externa e a significativa piora no cenário europeu reforçam nossa percepção, inclusive reduzindo o estímulo ao crescimento do PIB. Ao mesmo tempo, o déficit de conta corrente vem piorando significativamente, como se vê no gráfico 1. Nos 12 meses terminados em fevereiro, o déficit já atingiu US$ 63,5 bilhões e o próprio Banco Central projeta US$ 68 bilhões para este ano.
Nós, na MB, trabalhamos com um déficit de US$ 72 bilhões. Certamente esse número ainda é financiável sem grandes dificuldades, mas, pela primeira vez, o déficit não será coberto pela entrada de investimento direto, que projetamos encerrar o ano com US$ 55 bilhões, inferior aos US$ 63,7 bilhões apurados nos 12 meses encerrados em fevereiro.
O enfraquecimento contínuo da nossa competitividade e a menor atratividade do País como o destino de investimentos levam a essa situação.
A segunda área onde a tendência de piora é evidente é a da inflação. O gráfico número 2 mostra a contínua elevação dos preços desde meados do ano passado, tendo o IPCA-15 em 12 meses atingido 6,4% em março. Pior que isso é a contínua elevação do índice de difusão, segundo o qual 75% das 365 categorias de preços e serviços tiveram elevação neste mês. E não é uma elevação qualquer, pois nada menos que 30% de todas as categorias de preços subiram mais de 10% nos últimos 12 meses. Ou seja, estamos falando de uma elevação generalizada de preços.
Finalmente, a política fiscal é cada vez mais expansionista e mais opaca. O festival de truques contábeis já passou há muito tempo do razoável, e é responsável, por exemplo, por uma ressalva no balanço no BNDES, exigido pelos auditores, como mostrou o Estado nesta semana. Ao mesmo tempo, o verdadeiro orçamento paralelo em que se transformaram os restos apagar do Tesouro Nacional tomam de muito pouco valor a estatística do resultado primário como indicador válido da política fiscal. É por isso que, como muitos outros analistas, olhamos para a evolução da dívida bruta como indicador da sanidade das finanças e, neste caso, há uma piora evidente, como se vê no gráfico número 3.
Não é de surpreender que a confiança do consumidor esteja francamente em baixará vários meses, a despeito da reduzida taxa de desemprego que temos até agora. Do lado da produção, a confiança da indústria também não decola (gráfico 4). É por isso que a perspectiva de elevação dos investimentos é cada vez menor, exceto pela forte recuperação da demanda de caminhões em virtude da grande safra agrícola atual. O teto para o crescimento do PIB continua em 3%.
A qualidade da política econômica vem caindo, assim como a da regulação. É bastante evidente que a antecipação da campanha presidencial recém-ocorrida só piora esta trajetória, uma vez que todas as ações de política econômica passarão antes pelo critério de impacto eleitoral. Dois exemplos dão abundantes evidências dessa proposição, a saber, a política, anti-inflacionária e a questão das tarifas de energia elétrica.
A administração de preços passou a ser o centro da política anti-inflacionária e depois da cesta básica parece que virão medidas tentando evitar elevação das tarifas de ônibus. Ora, no ambiente de alta mais ou menos generalizada de preços e custos,- essas medidas são claramente inócuas no que tange à redução da inflação.
Os cigarros representam um caso que vale a pena observar; no IPC do IGP-M de fevereiro, o item despesas diversas subiu 17% (em 12 meses), resultado de uma elevação de 30% dos cigarros no período. Apenas para lembrar, essa elevação deveria ter ocorrido em dezembro de 2011, mas não ocorreu para evitar que a inflação do ano ultrapassasse os 6,5%.
Mesmo no caso de reduções de impostos que sejam definitivas, a desoneração tem um efeito limitadíssimo sobre a dinâmica dos preços, pois ocorre uma vez só e, em geral, não é totalmente repassada ao varejo. Isso porque as empresas têm enfrentado uma elevação generalizada de custos e uma redução persistente de margens, algo que todas as análises de balanço de empresas abertas e fechadas revelam. Dessa forma, a redução de imposto é rapidamente compensada por alguma elevação de custos recentemente ocorrida.
É por isso que a frenética sucessão de pacotes administrando preços não produz efeitos significativos sobre a inflação. É o fracasso de uma visão "contábil" da inflação, ilustrada num artigo recente de um entusiasmado analista que disse que, se não fosse o choque agrícola do ano passado, a depreciação do real em relação ao dólar e os aumentos de 25% a 40% nos fretes rodoviários, a inflação de 2012 teria ficado abaixo de 4,5%!
A questão dos preços de energia elétrica ilustra a perda de qualidade na política econômica, pois, para evitar o repasse dos custos decorrentes do uso das térmicas (que levaria a uma elevação de algo como 12% nas tarifas, com potenciais problemas eleitorais), as autoridades de área estão fazendo barbaridades regulatórias, tão bem ilustradas no recente artigo de Cláudio Sales aqui no Estado (10/03).
Em suma, estamos mesmo presos a uma armadilha de crescimento baixo, à qual tenho me referido mais de uma vez neste espaço.
Fonte: O Estado de S. Paulo
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