Aras pré-anistiou e Gonet
vai ajudando a postergar juízo criminal
O primeiro turno das
eleições municipais confirmou que Bolsonaro sobrevive
como ator influente e capaz de forjar eleitos pelo país. Não sabemos a exata
medida dessa influência antes do resultado do segundo turno, mas a conclusão é
incontornável.
Depois do mais radical
período de delinquência governamental em muitas gerações, tudo que o sistema de
Justiça brasileiro conseguiu realizar, em relação ao líder do movimento, foi
declarar sua inelegibilidade por oito anos em razão de ataques à urna em reunião
com embaixadores e do uso político das comemorações do Bicentenário. O TSE não se
pronunciou sobre outros crimes eleitorais. O PGR nem sequer
provocou o STF a
julgar crimes comuns.
A falta de responsabilização
justa e robusta de agentes que evisceraram as capacidades de o Estado executar
políticas públicas e atentaram contra o regime democrático é convite a que
essas práticas se repitam. O argumento é tão trivial quanto correto. Está em
todas as cartilhas da resistência democrática contra a terceira onda global de
autocratização da qual o Brasil não se apartou.
Não é surpresa que, por baixo do alarde sobre "punição exemplar" pelos crimes de 8 de janeiro, nessa simulação teatral de uma heroica "recivilização" dos radicalizados, o STF tem se esmerado mesmo é em punir peixes pequenos. A investigação de militares, políticos e empresários segue na gaveta.
Lambaris vão caindo na rede,
tubarões continuam nadando. E o STF se orgulha da corajosa façanha. Não deixa
de ser fiel à tradição do Judiciário brasileiro, para quem sempre foi mais
fácil punir quem carece de força política, econômica e social; mais difícil
punir quem frequenta as suas rodas de convívio real e simbólico, quem pode
pagar o arsenal de chicanas advocatícias geradoras de atraso, prescrição e
impunidade.
Importante entender que a
anistia a Bolsonaro, pelo menos em parte, já aconteceu. O primeiro operador
dessa anistia não declarada foi Augusto Aras,
por meio de arquivamentos alegando de falta de provas (apesar dos quilos de
provas produzidas pela CPI) ou a
não tipicidade criminal da conduta (como a ideia de que presidente é agente
político "sui generis" e não comete prevaricação).
Gonet, atual
PGR, precisaria de vontade, coragem e criatividade jurídica para reabrir e
questionar a "coisa julgada" do que Aras trancou. Mas há outra lista
de acusações criminais que Aras não pôde arquivar. Envolve peculato, falsidade
ideológica, atentado violento contra o Estado de Direito, tentativa de golpe de
Estado, organização criminosa. Não é modesta a xepa do fim da feira criminal.
Alexandre
de Moraes, em seus inquéritos, acumulou poder cautelar para interferir
no extremismo político. E em práticas nem tão extremistas assim. Um poder
excessivo, excepcional e perigoso, mas que não inclui o poder de denunciar
criminalmente.
Para que o STF possa julgar
Bolsonaro, Gonet precisa denunciar. Ele declarou, dia desses, que iria
"deixar para depois da eleição". Diz não querer se meter na política.
Se bobear, vai também esperar a eleição americana. Não percebeu que, ao desobedecer
dever funcional de denunciar um investigado assim que as provas estejam
maduras, interfere decisivamente na política e sonega do eleitor informação a
que tem direito.
2 comentários:
Muito bom! "Lambaris vão caindo na rede, tubarões continuam nadando." Perfeito!
Verdade.
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