quinta-feira, 30 de janeiro de 2025

Fim de ciclo de corte na taxa americana indica juros mais altos em todo o mundo - Míriam Leitão

O Globo

O encerramento do ciclo de corte de juros nos Estados Unidoscom a manutenção da taxa básica entre 4,25% e 4,5%, tem um efeito sobre os juros mundo afora. Isso porque os juros americanos são uma espécie de patamar mínimo de juros global, explica o economista Thiago Moraes Moreira, professor do Ibmec-RJ. Como o dólar e os títulos públicos americanos (os Treasures) são considerados os investimentos mais seguros do planeta, quando a taxa básica da economia americana se estabiliza em patamar considerado alto para o padrão local, indica que os juros tendem a ficar mais altos nos demais países para poderem atrair capital para seus respectivos mercados. No Brasil, a estimativa de consenso é que a Selic chegue a 15% ao fim do ano, mas já há quem fale até em 17%, diz Moreira.

- Os juros mais altos são perigosos para a economia global, inflação com juros altos levam à desaceleração da economia, seja por redução de investimentos ou do consumo das famílias, ou pelos dois. Se ultrapassarmos os 15% aqui no Brasil haverá uma desaceleração grande da economia, que pode levar o PIB a crescer 0,5% ou até zero, depois de uma alta que deve ultrapassar 3,5% em 2024, e o desemprego pode voltar à casa de pelo menos 8%. É difícil competir com juros reais de 10% e os investimentos serão reduzidos, assim como o crédito ao consumidor ficará mais caro. Fica difícil convencer alguém a investir, quando sem risco nenhum um título público lhe garante 10% - diz o economista.

E acrescenta:

- A política de Trump, de aumentar tarifas, como disse que fará com Canadá, México e China, e deportação de imigrantes tem um impacto inflacionário, o que deve manter os juros nos EUA mais altos.

Moreira ressalta que, apesar do discurso de parte do mercado de que o crescimento da economia vem sendo "anabolizado" pelo gasto público, até aqui o gasto privado vem crescendo praticamente o dobro do que se registra no gasto público:

- O mercado tem uma hipersensibilidade às declarações do governo e pode autorrealizar a profecia de fiscal e inflação descontrolados, se continuar com essas previsões de juros chegando a quase 20%. A verdade é que até aqui o governo não se mostrou irresponsável pelo lado fiscal. O gasto que mais vem crescendo é o privado, 7,5% contra 4% do gasto público. O discurso de parte do mercado é que a economia está "anabolizada" pelo gasto do governo, mas esse não é o fato. A Selic, estabelecida pelo Copom, é apenas um ponto na curva de juros, mas o mercado financeiro forma a chamada “curva de juros” e pode fazer com que a expectativa de alta cresça e autorrealizá-la.

E o aumento de juros, como ferramenta para conter a inflação, não é remédio para todos os problemas. No caso dos alimentos, grupo que mais pesou para que a taxa superasse a meta, é muito pouco afetado pela alta da Selic. Influenciada por efeitos climáticos mundo afora, quebras de safra, como aconteceu, por exemplo, com o café, pelo efeito do câmbio, a inflação de alimentos precisa de outros remédios que não estão no cardápio do Banco Central:

- Os antídotos para a inflação de alimentos são outros e terão de vir do governo, como informou de forma atabalhoada o ministro. Imposto é um caminho, mas também a discussão de margens com os vendedores, pois a lucratividade nesse setor é muito relevante. Não à toa o governo andou conversando com a Abras. O incentivo à maior concorrência nas redes varejistas de alimentos é uma alternativa - diz Moreira, do Ibmec-RJ.

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