Folha de S. Paulo
Parlamentares posam de responsáveis, mas têm
culpa no cartório da dívida e ajudam amigos
Lideranças do Congresso falam de modo solene,
santarrão, oportunista ou hipócrita sobre o conserto das contas do governo.
Dizem que Lula
3 tem de cortar gastos em vez de aumentar impostos, como o IOF.
O governo quer mais R$ 20 bilhões neste ano a fim de cumprir as metas relaxadas de déficit do arcabouço fiscal. Diz que o Congresso não faz sua parte, que prorroga ou cria reduções de impostos para empresas —verdade. Grandes empresas e profissionais de alta renda reclamam de impostos e gastos, mas muitos se beneficiam do esquemão.
Ninguém tem razão. É muita conversa fiada, cada um querendo garantir o seu pirão político ou financeiro.
Governo e Congresso foram
cúmplices na invenção de mais um Orçamento fantasista, como é este de 2025, com
receitas superestimadas e despesas subestimadas. Como deu errado, e não foi por
falta de aviso, o governo está à beira de não conseguir cumprir a meta de saldo
primário deste ano.
O governo gasta R$ 2,3 trilhões por ano. Sob
Lula 3, o aumento da despesa foi de R$ 227 bilhões. Então, R$ 20 bilhões de IOF
é ninharia? Não. Cerca de 92% da despesa, por aí, é obrigatória, determinada
por Constituição, leis e outros inevitáveis. Sobram uns R$ 180 bilhões para
manter a máquina pública, fazer investimentos etc. O investimento, despesa em
obras e equipamentos, levou apenas R$ 62 bilhões nos últimos 12 meses
(excluídas inversões financeiras). Um talho de R$ 20 bilhões equivale a um
terço do investimento anual, pois. Cortar emendas parlamentares, por porcas que
muitas sejam, implica cortar investimento.
Cerca de 74% do total da despesa vai para
gasto social (Previdência
do INSS, Bolsa Família e
outros benefícios sociais, saúde, educação). Com pessoal (salários e gasto
previdenciário), vão mais 17%. O gasto
com servidores teve redução relevante em pouco mais de uma década. Uma
reforma administrativa pode fazer com que a operação estatal se torne mais
eficiente, mas não arruma dinheiro relevante. Dá para arrumar algum, mas muito
longe de resolver o fundamental, cortando exorbitâncias de Judiciário, Ministério
Público e militares. Mas o Congresso não quer bulir com isso
("mexeu com eles, mexeu comigo").
Quem quer mexer no gasto social? O Congresso
sai de fininho, aumenta a despesa, faz favor tributário ou aprova mais gasto
proposto pelo Executivo. Fernando Haddad quis diminuir o aumento da despesa
com Previdência,
saúde e educação (não era cortar), que cresce com reajustes do mínimo ou com o
aumento da receita. Lula vetou. O caldo engrossou e vai entornar em 2027.
Segundo a Receita,
este ano o governo deixaria de arrecadar R$ 544 bilhões por causa de isenções
de impostos ("gasto tributário"), que podem chegar a quase R$ 800
bilhões, sugerem novas contas do governo.
Desde que Lula começou a falar no assunto, seus seguidores e parte da esquerda se agitam com essa conversa muita vez demagógica e desinformada. Seria dinheiro dado a ricos, um pote de ouro no fim do arco-íris. A história é um tanto diferente e enrolada, embora exista aí muita mamata, favor e isenções que causam distorções e ineficiências econômicas bárbaras, além de desigualdades, massa de gasto tributário que cresceu sob governos petistas, aliás, por ação ou omissão. Congresso e amigos não querem botar a mão nessa massa. Mas dá para arrumar dinheiro considerável e justo por aí. Fica para a coluna de domingo.
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