sábado, 31 de maio de 2025

Onde o tempo não passou - André Gustavo Stumpf

Correio Braziliense

Políticos de todos os quilates e ideologias carecem de uma atualização de seus conceitos políticos. Precisam ser contemporâneos de seu tempo

O debate da ministra Marina Silva com os senadores, antes e além das questões pessoais ou eventuais grosserias, demonstrou algumas verdades. O governo não se mobilizou para defender sua ministra do Meio Ambiente. Ela foi jogada às feras e ficou só. Os senadores não conseguiram conduzir um questionamento coerente, do que derivaram os ataques pessoais. Por último, a ministra perdeu a oportunidade para expor os motivos pelos quais até hoje não autorizou o asfaltamento da BR-319, a rodovia que liga Manaus a Porto Velho e, por consequência, ao resto do país. Uma boa oportunidade perdida por todos, inclusive pelo governo Lula, que vive na corda bamba. Não consegue defender a ministra nem avançar nas questões ambientais. Fica estacionado no discurso de boas intenções. 

Aliás, a esquerda brasileira não percebeu que o tempo passou. Recentemente, no âmbito da disputa interna pela presidência do PT, as palavras de ordem voltaram ao passado: reclamações coléricas contra as taxas de juros, contra a gestão do Banco Central (cujo presidente foi nomeado pelo presidente Lula), a concentração de renda e a especulação imobiliária. O partido precisa de inimigos externos óbvios, capazes de ser explicitados numa palavra de ordem diante da massa. Uma espécie de grito de guerra. Mas o grupo continua sem demonstrar preocupações com o desenvolvimento nacional, nem fixar metas de um governo razoavelmente organizado. No quesito educação, o pessoal do Ceará deveria apresentar avanços notáveis, mas o governo do PT não entregou nada do prometido. O índice de analfabetismo continua elevado.

Nos anos de governo militar, era relativamente simples fazer oposição ou mobilizar a opinião pública. Bastava denunciar os desvios cometidos pelos generais, falar da absurda dívida externa e da submissão aos bancos estrangeiros e da permanente interferência do Fundo Monetário Internacional (FMI) na vida do país. O Brasil importava todo o petróleo que consumia. Havia um monstrengo chamado conta-petróleo, que era o custo de manter o país funcionando pelo esforço de importar milhões de barris por dia. O país chegou a adotar racionamento de combustível no governo Geisel. Naturalmente, a inflação atingiu níveis estratosféricos.

É preciso perceber que o país melhorou em diversos aspectos. A dívida externa desapareceu, a inflação foi contida, o petróleo jorrou na área chamada de pré-sal (hoje o país exporta mais de 1 milhão de barris/dia) e avançou na administração pública por intermédio das reformas promovidas pelo governo Fernando Henrique Cardoso. O PSDB, curiosamente, desapareceu da política nacional, o que é um sinal gritante de que a política nacional se reduziu ao confronto entre dois extremos. Nenhum deles tem propostas para melhorar a vida brasileira. O governo anterior errou na vacina, na relação com os brasileiros, não soube vencer a eleição e cometeu uma tentativa estabanada de golpe de Estado. Seu filhote perambula pelos Estados Unidos correndo o chapéu e pedindo apoio do governo Trump para interferir na política interna brasileira. 

 A globalização modificou a maneira de produzir e consumir no mundo ocidental e provocou um espetacular crescimento de países do oriente. A área do Oceano Pacífico passou a ser a região mais rica do planeta. Superou o Atlântico. Os anos sessenta e setenta produziram enormes conglomerados financeiros e industriais, enriqueceram nações antes pobres e fizeram os empregos mudarem de país. A principal consequência no terreno da política foi o surgimento de uma direita violenta, reacionária e agressiva. Donald Trump, que persegue universidades com a mesma violência que expulsa estrangeiros, é o símbolo deste momento.

Aquela esquerda surgida no Brasil após a Assembleia Constituinte perdeu o sentido. A explosão do agronegócio modificou as relações pessoais, trabalhistas e contratuais no campo. O fazendeiro opera em dólar, negocia em bolsas no exterior e compra implementos agrícolas sofisticados. Goiânia, hoje, é a capital brasileira da soja. Cidade rica e bonita. Não é por acaso que o governador de Goiás é candidato à Presidência da República.

Políticos de todos os quilates e ideologias carecem de uma atualização de seus conceitos políticos. Precisam ser contemporâneos de seu tempo, época da comunicação instantânea, de grandes ameaças à terceira guerra mundial, de diplomacia difícil e de um mundo interligado pelos computadores. E da duvidosa facilidade da inteligência artificial. Os brasileiros gostam de progresso. O governo do presidente Lula não entregou o que prometeu. Distribui benesses com objetivo de se cacifar para o grande embate da eleição de 2026. Esqueceu suas promessas, inclusive que não iria elevar impostos.

 

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