- Folha de S. Paulo
Como a maioria dos brasileiros, assisti, domingo passado, pela televisão, à votação, na Câmara dos Deputados, do processo de impeachment contra a presidente Dilma Rousseff. Ao contrário do que, desonestamente, procurara afirmar José Eduardo Cardozo, advogado-geral da União, não se tratava de julgar a presidente e, sim, de admitir ou não o cabimento legal do processo de impeachment contra ela, o que finalmente foi aceito após uma discurseira que começou às 14h daquele dia e terminou depois da meia-noite. O processo agora se encontra no Senado, onde, só então, o impedimento da presidente será aceito ou não. Mas, naquela mesma madrugada, mal terminara a votação, já estava na televisão o advogado Cardozo "demonstrando" que o pedido de impeachment não tem cabimento.
Confesso que há muitos anos não assistia a um espetáculo tão constrangedor quanto foi o daquela noite, quando os deputados petistas e seus aliados procuravam demonstrar, sem qualquer argumento plausível, que se tratava de um golpe contra a democracia brasileira. Referiam-se a Dilma e a si mesmos como exemplos de defensores da democracia burguesa contra a qual, pelo menos da boca para fora, sempre batalharam. Não me consta que esse seja o regime social com que sonham o PCdoB, o PSOL e o PT. Mas na hora de livrar o próprio pescoço, vale tudo.
Na verdade, a presidente Dilma incorreu na prática de crime de responsabilidade ao usar o dinheiro de instituições sob controle do Tesouro Nacional para financiar projetos sociais que garantiriam sua reeleição em 2014.
Isso ficou provado mediante investigação feita pelos auditores técnicos do Tribunal de Contas da União (TCU), entre outubro e dezembro de 2014. Foi baseado nela que Hélio Bicudo, Miguel Reale Jr. e Janaina Paschoal deram início ao processo de impeachment contra Dilma, aprovado no último domingo pela Câmara Federal e agora entregue ao julgamento do Senado Federal. Não se trata, portanto, de nenhum golpe, de nenhum procedimento antidemocrático e, sim, pelo contrário, de uma ação que visa defender os princípios constitucionais do Estado brasileiro.
E daí a discurseira demagógica daquele domingo na Câmara Federal. Sem qualquer argumento de fato pertinente, os petistas (e os aliados que lhes sobraram) insistiam na tese falaciosa de que a presidente Dilma Rousseff estava sendo vítima de um golpe. Nenhum deles se atrevia de fato a expor suas razões, uma vez que aquelas afirmações eram destituídas de fundamento. Já no dia anterior, o advogado-geral da União tentara, no Supremo Tribunal Federal, anular o relatório do deputado Jovair Arantes e, consequentemente, o processo do impeachment, mas foi fragorosamente derrotado por oito votos a dois.
Assim, no mato sem cachorro, vendo os membros de sua base aliada passarem para o lado dos defensores do impeachment, o que lhes restava mesmo era o argumento do golpe. Enquanto isso, os opositores do governo Dilma -mesmo aqueles que foram seus aliados até a véspera- alegavam que, não apenas ela cometera crime de responsabilidade como, ao mesmo tempo, conduzira o país a uma crise econômica e política jamais vista.
A verdade é que, se por outra razão não fosse, Dilma Rousseff não tem condições de se manter presidente da República, uma vez que há tempos já não governa. De fato, ela e o PT encontram-se num beco sem saída, conforme se tem visto, desde que ela assumiu seu novo mandato presidencial.
Depois de mentir durante a campanha, teve que, ao tomar posse, admitir que deveria fazer, no plano da economia, o contrário do que prometera. Por isso chamou, para o ministério da Fazenda, Joaquim Levy, economista que pensa exatamente o contrário do que o PT e ela própria sempre defenderam. Resultado: diante da pressão dos petistas, teve o ministro que deixar o governo, agravando ainda mais a situação. Com isso, a inflação cresceu, o desemprego triplicou e o país parou de vez.
Resta a pergunta: independente de impeachment, convém ao país manter no governo uma presidente que já não governa? Com a palavra o Senado Federal.
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