Economista elogia equipe do novo governo, mas alerta que não se deve ‘frustrar as expectativas’
Luciana Dyniewicz / O Estado de S. Paulo
Eleitor de Lula em 2022, o economista
Eduardo Giannetti alerta o novo governo para o fato de que as expectativas dos
consumidores, investidores, trabalhadores e empresários definem o resultado da
economia. “A economia é uma espécie de meteorologia em que a previsão do tempo
afeta o próprio tempo. O que as pessoas acreditam que vai acontecer acaba se
materializando porque as pessoas passaram a acreditar nisso”, diz.
Portanto, acrescenta, é preciso ter cuidado
para não frustrar as expectativas dos agentes, pois isso pode resultar em crise
econômica. “Não se pode enfrentar essas crenças muito enraizadas no mercado,
especialmente no mercado financeiro.
(Essas crenças) não podem ser afrontadas de
maneira grosseira. Elas têm de ser respeitadas”, afirma.
Conselheiro econômico da hoje ministra do
Meio Ambiente, Marina Silva, quando ela era candidata à Presidência, Giannetti
diz que os sinais que o governo vem dando na área econômica, até agora, são em
geral positivos. Ele pondera, porém, que o anúncio de um pacote para reduzir o
déficit fiscal, feito na última quintafeira pelo ministro da Fazenda, Fernando
Haddad, não é suficiente para firmar as expectativas de que o problema fiscal
será resolvido.
A seguir, leia trechos da entrevista.
Como o sr. analisa os ataques à democracia
do domingo passado?
Foi uma baderna inconsequente, sem
organização política ou ação estratégica. Uma coisa desarticulada, perpetrada
por pessoas muito despreparadas e desnorteadas em relação ao que se poderia
esperar de uma ação desse tipo. Olhando para frente, acho que tem dois vetores.
Reforça o capital político do presidente Lula, e isso é algo de que ele pode,
pelo menos no curto prazo, se beneficiar. Ao mesmo tempo, tem um risco de
desviar o foco do início do mandato das questões que são realmente relevantes,
especialmente na economia. Mas tenho a impressão de que o governo está atento a
essa ameaça.
Essa tentativa de golpe em Brasília terá
impactos econômicos?
Não vejo um impacto duradouro. Mas o
ambiente internacional vai acompanhar como as instituições brasileiras reagem e
se essa ocorrência é isolada ou se é parte de alguma coisa que terá
continuidade.
Se começarem a se repetir manifestações com
esse grau de destruição, vai pesar.
Em entrevista ao ‘Estadão’ depois do
primeiro turno, o sr. disse que ajudaria muito se o novo governo tivesse uma
‘excelente equipe econômica que despertasse credibilidade e atraísse capital
externo’. Como avalia a equipe econômica?
É uma boa equipe. O secretariado é de
perfil técnico, o que acho positivo. Agora, quanto mais se estuda economia,
mais se entende a centralidade das expectativas nos resultados e no
comportamento da economia. Tanto as expectativas do mercado financeiro, que são
mais nervosas e de curto prazo, quanto as expectativas dos agentes da economia
real – empresários, consumidores e profissionais – são importantes.
Tem havido ruído. Já se falou em rever a
reforma trabalhista.
Acho que isso existiu mais no início da transição. Da posse para cá, tem havido um compromisso maior com declarações apontando na direção daquilo que ajuda a formar expectativas positivas. Agora, se o enunciado não for corroborado por ações, não é suficiente. Tem de mandar os sinais certos e tem de mostrar que esses sinais estão consistentes com as ações. Imagine um médico que chega em uma tribo précientífica com uma vacina. Se ele chegar e disser: ‘Tudo que vocês acreditam é feitiçaria e eu tenho uma picadinha que vai resolver o problema’, é capaz de a tribo ficar enfurecida e expulsar o médico. Se esse médico chega na tribo com a mesma vacina e fala: ‘Tudo que vocês acreditam é consistente com essa vacina que eu quero dar para vocês. Ela é complementar’, ele não hostiliza as crenças vigentes. Deixa as pessoas acreditarem e até dá um alento: ‘Vocês acreditam nisso, é importante...’ E dá a vacina. Não se pode enfrentar essas crenças muito enraizadas no mercado, especialmente no mercado financeiro. (Essas crenças) não podem ser afrontadas de maneira grosseira. Elas têm de ser respeitadas.
*Economista e cientista social, Giannetti é
doutor em economia por Cambridge e membro da Academia Brasileira de Letras
Um comentário:
Excelente matéria! Gianetti é uma dos maiores escritores e economistas brasileiros, com visões e análises muito interessantes e confiáveis!
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