quarta-feira, 28 de maio de 2025

O dom de se iludir - Dora Kramer

Folha de S. Paulo

Lula insiste em não ver que o governo leva surras autoinfligidas, das quais a oposição só se aproveita

Não ficou muito claro o que o presidente Lula (PT) quis dizer quando anunciou que a partir de junho vai voltar a "fazer política", percorrendo o país para "combater a canalhice".

Talvez tenha querido dar um aviso aos navegantes de que aquele Lula, que na oposição arrasava quarteirões e na Presidência não dava moleza aos adversários, estará de volta, mostrando com quantos paus se faz um embate de mestre.

Se foi esse o significado de suas palavras, vai ter de começar dando um jeito de não levar um baile de Nikolas Ferreira (PL-MG) a cada trapalhada do governo.

O jovem deputado de primeiro mandato, que antes havia sido vereador durante dois anos, virou referência de temor para o experiente PT em sua quinta estadia no Palácio do Planalto. Um contraste e tanto com Lula pela terceira vez presidente, tarimbadíssimo nas lides da política, às quais já dedica mais da metade de seus 79 anos de idade.

Haveria até sentido em atribuir as dificuldades comparativas a uma questão geracional se o deputado dos temidos vídeos fosse o único combatente em campo. Ele é apenas o mais estridente integrante de uma oposição composta majoritariamente por gente formada na escola de professores que a antiga crônica política chamava de raposas felpudas.

A esses seres matreiros o governo tem fornecido matéria-prima de trabalho com decisões atabalhoadas, declarações inapropriadas, arrogância desmedida e recuos improvisados. Tudo isso embalado numa repetição sistemática de erros que deveriam ter sido aprendidos e corrigidos.

Nenhuma lição parece ter sido tirada dos episódios das blusinhas, do Pix, dos atropelos ao Congresso, da crise no INSS e da confusão do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF). É uma sucessão de surras autoinfligidas, das quais adversários e aliados de ocasião obviamente se aproveitam sem que o governo esboce capacidade de reação.

E Lula acha que vai resolver tudo a partir de junho, quando, anuncia, percorrerá o país para "fazer política e combater a canalhice".

 

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