Folha de S. Paulo
Se não fosse o efeito da trumponomics,
economia americana estaria andando bem
"Talvez as crianças tenham duas bonecas
em vez de trinta bonecas, sabe, e talvez as duas bonecas custem uns dólares a
mais do que custariam normalmente", disse Donald Trump nesta
quarta. As empresas de brinquedos parecem em pânico. Cerca de 77% dos
brinquedos importados pelos Estados
Unidos vêm da China.
Com impostos de importação de pelo menos
145%, não tem negócio. Se a encrenca não se resolver em 60 dias, dizem
empresas, há risco de faltar produto no Natal. Trump, o Nero Laranja, pode ser
também o Grinch.
O caso das bonecas é, claro, metáfora dos problemas que Trump pode ter com o americano comum. Por exemplo, carros, remédios e comida fresca mais caros a partir de maio. Alguns eletrônicos mais caros, pois Trump reduziu o tarifaço sobre esses produtos que vêm da China, como celulares e computadores, mas não acabou com o problema.
Além disso, pode haver menos emprego. Pela
preliminar da empresa ADP, a criação mensal de empregos no setor privado em
abril ficou na metade do previsto e nuns 40% do número de março. Não deve ser
tomado como indício de tendência, porém. Empresas dizem na mídia dos EUA e a
relatórios de bancos que se congelam vagas abertas: não contratam até que a
névoa da guerra
comercial se dissipe.
Trump diz que novos acordos comerciais devem
ser firmados até julho (na verdade, seriam apenas diretrizes de acordos, se
tanto). Com
a China, sem prazo à vista.
Haverá no mínimo um trimestre de incerteza
extensa: confiança do consumidor em baixas de décadas, grandes empresas
projetando números piores e segurando investimento, agricultores
gritando que vão falir, empresas que importam peças e partes dizendo que
não têm como produzir etc.
Piora em inflação e
emprego é facada na popularidade. Na média das pesquisas de Nate Silver, Trump
começou com 51,6% de aprovação e 40% de desaprovação; agora está com 43,8% de
aprovação e 52,6% de desaprovação (em 30 de abril). Vai manter seus planos?
Como bateria em retirada sem dar vexame terminal? Recuos há, todas as semanas,
sob pressão de grandes empresas e da finança.
Isto posto, como dizer algo sobre o PIB, divulgado
nesta quarta? Na maneira americana de divulgar os dados, caiu
0,3% em relação ao do primeiro trimestre de 2024 (taxa "extrapolada"
para um ano). O ritmo médio de 2024 (ante 2023) de 2,8%. No trimestre final
do ano passado, 2,4%. Parece um desastre. Ainda não é, nem de longe. Mas também
não se pode tirar qualquer perspectiva. Se a "trumponomics"
evaporasse hoje, daria para dizer que a economia vai bem.
Um jeito de fazer a conta do PIB é somar
gasto com consumo privado, gasto do governo, despesa de investimento (em novas
instalações produtivas e máquinas etc.), e a diferença
entre vendas para o exterior (exportações) e importações. Tudo mais
constante, o aumento das importações diminui o crescimento do PIB. Nunca antes,
desde 1947, a alta de importações tirou tanto do PIB. É uma aberração causada
por antecipação de compras no exterior. Mas tudo mais está alterado: aumento
enorme de estoques, ainda alguma alta de consumo privado, menor, afetada por
expectativas algo "panicadas". O número do PIB está tão poluído que,
mesmo para o curto prazo de um ano, não quer dizer quase nada.
Muito esquecido: ainda estamos para ver o que Trump vai fazer da política fiscal (gastos e impostos), dos efeitos do desmonte do Estado americano e maluquices extras. Quem sabe uma guerrinha?
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