Ainda que faltem pormenores essenciais e sejam muitas as pontas desamarradas, desta vez se viu determinação e consistência nas decisões dos chefes de Estado da área do euro.
Até há alguns dias, problemas até menos importantes do que os tratados inundavam de dúvidas os mercados, porque os dirigentes políticos estavam paralisados e preferiam empurrar a crise com a barriga. Agora se viu que a vontade política dentro do bloco pode ser acionada mesmo que espoquem questões mais graves, como a eventualidade da suspensão de pagamentos pelo governo da Itália.
Três entre as maiores incertezas foram, afinal, enfrentadas. O risco de pânico vinha subindo porque estava em jogo o patrimônio de quase uma centena de bancos enfileirados em dominó. Apesar do corte de 50% da dívida grega em carteiras privadas, providenciou-se o reforço de capital dos bancos. É uma novidade duplamente importante. Primeiro, porque o risco de colapso sistêmico foi reconhecido e identificado. (Há somente três meses, "rigorosos testes de estresse" o ignoravam). Em segundo lugar, as autoridades trataram de bloquear ameaças de naufrágios de grandes instituições financeiras. Não está claro de onde sairão os recursos que garantirão boa saúde aos bancos, mas já se viu que não serão tolerados novos casos Lehman Brothers. Ainda nesse capítulo, faltou dizer qual tratamento será dado aos títulos da Grécia em carteira de não bancos, como seguradoras e fundos de pensão e de investimento.
A segunda fonte de aflição e estresse nos mercados era a falta de poder de fogo do Fundo Europeu de Estabilidade Financeira (EFSF, na sigla em inglês). Conta com 440 bilhões de euros ainda não totalmente integralizados, dos quais só 250 bilhões de euros estão disponíveis para cobrir eventuais novas urgências. O presidente Nicolas Sarkozy avisa que o fundo será alavancado em até 1,3 trilhão de euros para que possa prestar socorro em outras oportunidades. Falta explicar como essa engenharia financeira será implementada e como os emergentes contribuirão para isso. Varejos desse tipo ficaram para ser definidos na reunião do Ecofin, entidade que reúne ministros de Finanças do euro.
A terceira grande incerteza, agora equacionada, é a questão da Grécia. Além do corte de 50% da dívida com os bancos, serão liberados 130 bilhões de euros já previstos para fechar as contas públicas. Uma pergunta ainda à procura de resposta está em saber até que ponto o precedente será evocado para facilitar a vida financeira também de Portugal, Irlanda, Itália e Espanha. Se os gregos se deram bem, por que não os outros?
Os principais focos de incêndio foram extintos, pelo menos por enquanto. Agora é preciso ver como esses pacotes serão desenrolados sem que apareçam diabos demais nos seus detalhes, onde costumam se esconder.
E que fique entendido: as falhas estruturais da área do euro estão todas aí. A principal foi a construção de uma união monetária sobre 17 sistemas fiscais tão diferentes entre si. Ainda não há conserto nem para essa distorção nem para as dela derivadas. A diferença é que hoje há melhor percepção dos problemas, os governos parecem mais bem mobilizados para impedir a expansão dos rombos. Nesta quinta-feira, o presidente do Conselho Europeu, o belga Herman von Humpuy, avisou que serão retomadas, em dezembro, as discussões sobre a revisão dos tratados da União Europeia. E este pode ser um bom recomeço
CONFIRA
Os mercados responderam com euforia às decisões da área do euro, como indica o desempenho de algumas bolsas, mostrado no gráfico.
Pressupostos mantidos. A Ata do Copom divulgada nesta quinta mostra que o Banco Central continua apostando na deterioração da economia global, na queda ou na estabilização dos preços das commodities e na moderação do mercado de trabalho no Brasil. Pelo menos as duas primeiras hipóteses terão de ser revistas, caso as decisões tomadas pelos dirigentes do bloco do euro sejam consolidadas nas próximas semanas.
Fonte: O Estado de S. Paulo
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