As fortes e quase ininterruptas quedas nos mercados indicam que as ações de política monetária são limitadas para relançar a economia
Com mais países na Europa fechando fronteiras e impondo quarentena ampla da população - 100 milhões de espanhóis e italianos - a pandemia de coronavírus traz em si potencial para limitar a produção ao mínimo e reduzir o consumo ao máximo, isto é, causar uma depressão econômica com chances de nova crise financeira. As fortes e quase ininterruptas quedas nos mercados indicam que esse é um cenário plausível e, também, que as ações de política monetária embora tenham um efeito importante são limitadas para relançar a economia. Pelos estragos que o vírus já fez, e ainda fará, está na hora da política fiscal entrar em cena com a força adequada.
O Federal Reserve sequer esperou sua reunião formal de quarta-feira para jogar os juros entre 0% e 0,25%, depois de anunciar garantia de liquidez ao mercado de mais de US$ 1,5 trilhão na quinta. No domingo à noite, reforçou as linhas de swap de moedas com União Europeia, Japão, Canadá, Inglaterra e Suíça, prevenindo a escassez de funding em dólares de instituições financeiras do exterior. Com isto, antecipou a maior parte de sua munição, reeditando o afrouxamento quantitativo com a oferta de compra de títulos de US$ 700 bilhões - US$ 500 bilhões para papéis do Tesouro e o restante para os lastreados em hipotecas. O presidente Jerome Powell descartou cruzar a fronteira para os juros negativos.
A rapidez com que o Fed agiu, elogiável por um lado, suscitou, por outro, mais uma onda de pânico que castigou as bolsas, as moedas e o petróleo ontem. A S&P 500 caiu 11,99% e o Dow Jones, 12,77% com baixas menores mas importantes nas bolsas europeias. O Ibovespa perdeu mais 13,9% e ameaça cair abaixo dos 70 mil pontos. A insegurança não cessou mesmo após todos os principais BCs do mundo agirem na direção esperada pelos mercados, o que sugere também que são insuficientes para reverter os efeitos danosos da pandemia.
O pêndulo, porém, está se deslocando para o lado fiscal da equação de combate ao coronavírus. Não só a política monetária terá de adquirir capilaridade para manter o fluxo de crédito para as pequenas e médias empresas, as mais frágeis, como os recursos do governo terão de chegar aos desempregados e mais difícil ainda, aos trabalhadores temporários que subitamente ficaram sem renda.
Uma das vantagens de juro zero é que os programas fiscais de auxílio a empresas e famílias terão um custo quase parecido, o que é vital diante de uma crise destas proporções. O Banco da Inglaterra e o Tesouro britânico fecharam um dos mais abrangentes pacotes de socorro até hoje. Os juros caíram a 0,25%, o menor desde a II Guerra Mundial, o governo lançou um pacote de socorro e investimentos de 30 bilhões de libras (1,5% do PIB) e foi criado um fundo, com juro perto do zero, para empréstimos às PMEs, que pode chegar a 100 bilhões de libras. Recursos para as necessidades da área de saúde serão ilimitados. As empresas serão compensadas pelas licenças por 14 dias da mão de obra atingida pelo vírus. As regras para essas licenças foram desburocratizadas, ao mesmo tempo em que caiu a 0% a exigência de capital contracíclico dos bancos. O BC inglês estima que será possível obter empréstimos líquidos de 190 bilhões de libras, várias vezes maior do que a disponibilidade em 2019.
Com a economia a caminho da recessão e fustigada pelo vírus, a Alemanha deixou para trás sua feroz ortodoxia e prometeu, via banco estatal, colocar inicialmente € 550 bilhões para amparar empresas e trabalhadores afetados pelo vírus - uma guinada e tanto diante de sua posição durante toda a crise na zona do euro recente.
Os EUA, apesar das estultices de Trump, caminham na mesma direção. No pacote gestado por Congresso e Tesouro, estudam-se medidas de alívio como a suspensão temporária do pagamento dos empréstimos a estudantes, redução ou atraso de quitação de impostos por empresas atingidas e compensação monetária direta para os que perderam emprego em decorrência do vírus.
No Brasil, o BC vai cortar mais os juros e o Conselho Monetário Nacional criou condições mais favoráveis para a renegociação de dívidas com os bancos. O Ministério da Economia acordou para a existência da pandemia e anunciou medidas de alívio envolvendo R$ 147 bilhões entre liberação de recursos (FGTS, antecipação do abono salarial e do 13º salário dos aposentados), diferimento de impostos por três meses para empresas (recolhimento do FGTS e do Simples e de 50% das contribuições do Sistema S). O financiamento à saúde será reforçado em cerca de R$ 9,5 bilhões.
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