O Estado de S. Paulo
Com a perda da âncora fiscal, um dólar ao redor de R$ 5,50 já seria lucro para o País
Desde o início do ano, o dólar acumula uma
alta ao redor de 17% e, no auge do estresse, chegou a atingir R$ 5,86. Com o
risco para a inflação e para os próximos passos da política monetária no
Brasil, a pergunta que muita gente anda fazendo é se a moeda americana vai
devolver os ganhos recentes em relação ao real.
Como o câmbio é a variável macroeconômica mais difícil de prever, em razão dos diversos fatores que influenciam o seu comportamento, a resposta nem de longe é simples. O dólar volta para R$ 5,30, como estava na reunião do Copom em junho? E se recuar para R$ 5,55, a cotação de referência utilizada pelo Banco Central na reunião da semana passada, já seria suficiente?
A maioria dos analistas acredita agora que o
dólar pode recuar ante o real. Isso particularmente depois que o Federal
Reserve (Fed) sinalizou que pode começar a cortar os juros americanos em
setembro, o que pode melhorar as condições de liquidez globais, com os
investidores mais propensos a buscar aplicações em países com juros elevados, a
exemplo do Brasil.
Por outro lado, os últimos indicadores de
atividade nos
Estados Unidos vieram bem mais fracos do que
a projeção de analistas, deflagrando o temor de uma recessão. Mesmo que o Fed
acelere o corte de juros até o fim do ano – os investidores estão precificando
pelo menos quatro reduções – para evitar uma piora muito acentuada do mercado
de trabalho e da economia americana como um todo, o temor de uma recessão
levaria a uma corrida para o ativo considerado refúgio do risco: os títulos do
Tesouro americano. E essa busca por proteção poderá compensar uma fraqueza do dólar
diante de cortes de juros pelo Fed.
Todavia, um dos principais fatores para
avaliar se o câmbio no Brasil volta a se apreciar é a percepção do risco
fiscal. E, nos últimos meses, é cada vez maior a falta de credibilidade do
arcabouço fiscal. Mesmo que o governo Lula consiga entregar a meta deste ano,
mirando a sua banda inferior, de déficit primário de até 0,25% do PIB, o
sentimento prevalente no mercado é de que o governo vai acabar descumprindo o
arcabouço fiscal em 2025 e 2026. Ou porque poderá mudar novamente a meta de
2025, que já foi reduzida para déficit zero, ou porque decida mudar o parâmetro
de crescimento real das despesas de 2,5%. Some-se a isso a percepção de que, em
2025, a gestão do BC será mais leniente com a inflação.
Com a perda da âncora fiscal, caso o governo
não faça ajustes estruturais nos gastos públicos, um dólar ao redor de R$ 5,50
já seria lucro. O fato é: o dólar mudou de patamar.
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