O Estado de S. Paulo
O tarifaço do presidente Donald Trump,
acompanhado das suas iniciativas isolacionistas, levou alguns analistas a
concluir que o processo de globalização está em inexorável retração.
É uma afirmação apressada e temerária, até
porque a pretensão do governo dos Estados Unidos não é acabar com a
globalização, mas impor mudanças numa economia de abrangência global.
A globalização não começou ontem. Quando Alexandre, o Grande, conquistou o Oriente Médio e a Ásia, por volta do ano 320 a.C., toda essa região foi, de alguma forma, helenizada, e as relações econômicas e culturais passaram a ser compartilhadas entre aqueles povos. Em toda parte se falava grego, como hoje se fala inglês, e construíram-se teatros onde eram encenadas as tragédias de Eurípedes, Ésquilo e Sófocles.
Resultados equiparáveis aconteceram ao longo
do Império Romano, na Rota Chinesa da Seda, com a descoberta da imprensa, com
as grandes navegações e na Revolução Industrial, que espalhou pelo mundo
estradas de ferro, navegação a vapor, fábricas e o telégrafo. De lá para cá, o
processo se aprofundou com a integração da produção e da distribuição, com a
revolução das finanças internacionais, com a criação da internet e a
disseminação dos computadores e, agora, com o uso da inteligência artificial.
Por aí já dá para desconfiar de que apenas
quatro anos de presidência de Trump não serão suficientes para acabar com uma
força histórica de milhares de anos – que acelerou o comércio e o
desenvolvimento econômico.
Como o alvo imediato do tarifaço parece ser a
China, não há de ser uma cultura multimilenar, que passou por tudo, e há muito
aprendeu a esperar, que se agachará diante de uma musculatura que tem prazo
previsível de validade.
Ledo engano do presidente Trump é o de querer
trazer de volta a indústria que migrou para onde as condições de produção
enfrentam custos mais baixos. Seria como querer que a água corra para cima.
Além disso, em quase toda a parte, a indústria deixou de ser o principal motor
de geração de renda nacional.
Sete décadas de protecionismo praticado no
Brasil não melhoraram a competitividade da indústria nem contiveram seu
declínio. E, assim, tenderá a ser globalmente. Atualmente, os serviços devem
ultrapassar os 70% do PIB e o principal fator de riqueza passou a ser a
tecnologia de ponta.
Ninguém tem, hoje, condições de prever como
evoluirão as relações econômicas a partir do cavalo de pau imposto ao resto do
mundo pelo presidente Trump. É provável que a própria dinâmica interna da
economia dos Estados Unidos acabe por trazer de volta a racionalidade da
organização produtiva. Também é provável que o sistema de pesos e de
contrapesos inerente ao regime democrático se encarregue de esvaziar o atual
surto totalitário do governo Trump.
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