Blog do Bolivar
Em sua prolongada infância, o PT sempre optou por auferir dividendos políticos e eleitorais sem assumir a correspondente parcela de responsabilidades. Em momentos cruciais, quando sua colaboração era esperada e teria sido importante, ele a recusou, se isolou e não poupou saliva em sua crítica às demais forças políticas.
Fez pior, aliás. Tratou de justificar seu comportamento predatório com um discurso fajuto sobre o que supostamente o diferenciava do “resto”. Seria, em sua própria avaliação, a única agremiação autêntica, pura, ética, revolucionária, voltada para o bem público etc etc – desde Pedro Álvares Cabral.
Não há necessidade de recapitular detalhadamente a história, mas aqui vão – só para ilustrar – alguns episódios.
Em 1982, quando a redemocratização não estava de modo algum assegurada, o partido começou a atacar lideranças de relevo no campo democrático como “farinha do mesmo saco”.
Em 1985, recusou-se a participar da ação institucional que iria finalmente sepultar o regime militar - a eleição de Tancredo Neves -, chegando mesmo a expulsar três deputados que não acataram a diretriz partidária.
Em 1988, recusou-se a assinar a Constituição. Em 1992, após a queda de Collor, negou-se a participar do governo de união proposto por Itamar Franco , e não hesitou em excluir de seus quadros a Sra. Luísa Erundina, que aceitou a nomeação para um ministério.
Em 1994, como todos se lembram, apostou claramente no “quanto pior, melhor”, colocando-se em posição de antagonismo contra a estabilização da economia através do Plano Real.
Outro traço infantil do petismo manifestou-se com mais força – vejam só a ironia – a partir de 2002, justamente após a chegada de Lula à presidência.
Refiro-me ao recurso sistemático à mentira . Sim, todo político mente. Todos os que jamais existiram na face da terra um dia mentiram, com ou sem justificação.
Mas aqui eu estou falando de um traço tipicamente infantil : da mentira transparente, se o leitor me permite um paradoxo. Daquela mentira que se impõe e perdura tão-somente porque há interessados em cultivá-la, ou em agradar quem a cultiva .
De mentiras transparentes, a ilustração definitiva, que todo futuro historiador terá de registrar, é a lenga-lenga da “herança maldita”.
Salvo os muito ignorantes, os de má-fé e os que hajam perdido a sanidade, todos os agentes políticos de nível nacional, todos os partidos e órgãos de governo, todos os economistas e cientistas sociais sabem que o bom andamento do processo político e os avanços econômicos recentes tiveram como pré-condição a estabilização e as reformas encetadas no transcurso dos anos 90.
O terceiro traço a que desejava me referir veio à tona de forma cristalina de alguns meses para cá, em função sobretudo da conjuntura eleitoral.
O petismo parece não compreender que toda força política relevante adquire ao longo do tempo uma identidade peculiar.
Da mesma forma que na vida individual, a identidade não é só subjetiva (aquilo que nós achamos que somos) ; em grande parte ela é também objetiva (aquilo que os outros acham que somos).
Ou seja, as identidades políticas plasmam-se na própria interação, à medida em que as diferentes forças convivem e se influenciam mutuamente.
Vejamos um exemplo : o “controle social da mídia”. Numa perspectiva totalmente subjetiva, o PT e seus militantes podem conferir a esta expressão o significado que quiserem. Mas a identidade politicamente relevante e mais sólida é a outra, parcialmente objetiva : aquela que não se desmancha no ar.
Como indiquei acima, a história do PT caracteriza-se por certas ambiguidades, por percursos não raro sinuosos, por certos padrões de comportamento, enfim. As “bases” que o partido consulta, e como as consulta, o teor das discussões e dos documentos que daí resultam, tudo isso é razoavelmente bem conhecido.
Quando então falam em “controle social da mídia”, como podem os petistas estranhar que outras forças, a começar pela própria mídia, entendam ”controle social da mídia sob o nosso controle” ?
Nas reuniões e declarações desta semana, através das quais o PT (e aliados) vêm tentando recarregar a candidatura Dilma Rousseff, a questão do aborto ganhou destaque.
Tentou-se, por um lado, retirar o assunto totalmente da agenda, ou pelo menos diluir seu impacto eleitoral.
Por outro, a crer em notícias que o governo provavelmente não confirmará, Lula teria “recrudescido” (este verbo é para quem se lembra do general Figueiredo) , fazendo chegar à CNBB um recado inequívoco : ou a hierarquia católica enquadra os prelados que vêm criticando a candidata oficial, ou o governo rompe pura e simplesmente o acôrdo que mantém com o Vaticano.
Deixemos de lado a tendência de Lula a confundir os interesses eleitorais de sua facção com assuntos que na verdade se situam na esfera do Estado brasileiro – vale dizer, da Nação, dos cidadãos brasileiros tomados em conjunto.
Plasmada durante um longo período, a identidade de um partido normalmente traz embutida uma avaliação de sua credibilidade ou confiabilidade aos olhos dos demais, e de outras organizações existentes na sociedade.
No início deste ano – estou certo de que todos os leitores se lembram disto -, uma papelada que atendia pelo pomposo título de Plano Nacional de Direitos Humanos, resumidamente PNDH-3, aterrisou na mesa da Dra. Dilma Rousseff, à época ministra-chefe da Casa Civil.
Tratava-se de uma extensa lista de propostas colhidas junto a não sei quantas reuniões e conferências realizadas por movimentos e entidades as mais variadas : ”setores da sociedade civil”, segundo o consagrado jargão petista.
O referido rol de propostas incluía a revisão da lei de anistia e a adoção de procedimentos de conciliação, em detrimento da autoridade judiciária em conflitos agrários – além do aborto e da controle social da mídia, já mencionados .
Chancelada pela ministra e por Lula – não farei a maldade de indagar se a terão lido – , a papelada virou anteprojeto e estava pronta para ser enviada ao Congresso Nacional.
E aí, aconteceu o quê ? Ora, aconteceu o óbvio. Contundentes advertências e pressões surgiram nos “setores” afetados : Forças Armadas, agricultura, mídia e Igreja. Mais que depressa, percebendo o provável estrago eleitoral, Lula mandou deixar o dito por não dito.
No entanto, pelo menos dois dos quatro assuntos - o controle da mídia e o aborto – continuaram a fermentar. O ressurgimento da questão do aborto, como vimos esta semana, foi rapidamente atribuído às “baixarias” do PSDB : é outro caso de mentira transparente. No que toca à mídia, até as pedras de minha rua perceberam que isso se deveu em grande parte aos ataques de Lula à imprensa.
Mas há - como venho argumentando desde o início -, uma questão de fundo. Dada a identidade histórica do PT e certas práticas em que ele parece fazer questão de reincidir, o quê, exatamente, os petistas esperavam que acontecesse ? Dilma diz que não disse o que disse. Lula manda deletar as sete ou oito linhas “inconvenientes” do PNDH-3.
E daí ? Os petistas combinaram com os russos, ou estão mesmo imaginando que estão com a credibilidade nas alturas ?
Em sua prolongada infância, o PT sempre optou por auferir dividendos políticos e eleitorais sem assumir a correspondente parcela de responsabilidades. Em momentos cruciais, quando sua colaboração era esperada e teria sido importante, ele a recusou, se isolou e não poupou saliva em sua crítica às demais forças políticas.
Fez pior, aliás. Tratou de justificar seu comportamento predatório com um discurso fajuto sobre o que supostamente o diferenciava do “resto”. Seria, em sua própria avaliação, a única agremiação autêntica, pura, ética, revolucionária, voltada para o bem público etc etc – desde Pedro Álvares Cabral.
Não há necessidade de recapitular detalhadamente a história, mas aqui vão – só para ilustrar – alguns episódios.
Em 1982, quando a redemocratização não estava de modo algum assegurada, o partido começou a atacar lideranças de relevo no campo democrático como “farinha do mesmo saco”.
Em 1985, recusou-se a participar da ação institucional que iria finalmente sepultar o regime militar - a eleição de Tancredo Neves -, chegando mesmo a expulsar três deputados que não acataram a diretriz partidária.
Em 1988, recusou-se a assinar a Constituição. Em 1992, após a queda de Collor, negou-se a participar do governo de união proposto por Itamar Franco , e não hesitou em excluir de seus quadros a Sra. Luísa Erundina, que aceitou a nomeação para um ministério.
Em 1994, como todos se lembram, apostou claramente no “quanto pior, melhor”, colocando-se em posição de antagonismo contra a estabilização da economia através do Plano Real.
Outro traço infantil do petismo manifestou-se com mais força – vejam só a ironia – a partir de 2002, justamente após a chegada de Lula à presidência.
Refiro-me ao recurso sistemático à mentira . Sim, todo político mente. Todos os que jamais existiram na face da terra um dia mentiram, com ou sem justificação.
Mas aqui eu estou falando de um traço tipicamente infantil : da mentira transparente, se o leitor me permite um paradoxo. Daquela mentira que se impõe e perdura tão-somente porque há interessados em cultivá-la, ou em agradar quem a cultiva .
De mentiras transparentes, a ilustração definitiva, que todo futuro historiador terá de registrar, é a lenga-lenga da “herança maldita”.
Salvo os muito ignorantes, os de má-fé e os que hajam perdido a sanidade, todos os agentes políticos de nível nacional, todos os partidos e órgãos de governo, todos os economistas e cientistas sociais sabem que o bom andamento do processo político e os avanços econômicos recentes tiveram como pré-condição a estabilização e as reformas encetadas no transcurso dos anos 90.
O terceiro traço a que desejava me referir veio à tona de forma cristalina de alguns meses para cá, em função sobretudo da conjuntura eleitoral.
O petismo parece não compreender que toda força política relevante adquire ao longo do tempo uma identidade peculiar.
Da mesma forma que na vida individual, a identidade não é só subjetiva (aquilo que nós achamos que somos) ; em grande parte ela é também objetiva (aquilo que os outros acham que somos).
Ou seja, as identidades políticas plasmam-se na própria interação, à medida em que as diferentes forças convivem e se influenciam mutuamente.
Vejamos um exemplo : o “controle social da mídia”. Numa perspectiva totalmente subjetiva, o PT e seus militantes podem conferir a esta expressão o significado que quiserem. Mas a identidade politicamente relevante e mais sólida é a outra, parcialmente objetiva : aquela que não se desmancha no ar.
Como indiquei acima, a história do PT caracteriza-se por certas ambiguidades, por percursos não raro sinuosos, por certos padrões de comportamento, enfim. As “bases” que o partido consulta, e como as consulta, o teor das discussões e dos documentos que daí resultam, tudo isso é razoavelmente bem conhecido.
Quando então falam em “controle social da mídia”, como podem os petistas estranhar que outras forças, a começar pela própria mídia, entendam ”controle social da mídia sob o nosso controle” ?
Nas reuniões e declarações desta semana, através das quais o PT (e aliados) vêm tentando recarregar a candidatura Dilma Rousseff, a questão do aborto ganhou destaque.
Tentou-se, por um lado, retirar o assunto totalmente da agenda, ou pelo menos diluir seu impacto eleitoral.
Por outro, a crer em notícias que o governo provavelmente não confirmará, Lula teria “recrudescido” (este verbo é para quem se lembra do general Figueiredo) , fazendo chegar à CNBB um recado inequívoco : ou a hierarquia católica enquadra os prelados que vêm criticando a candidata oficial, ou o governo rompe pura e simplesmente o acôrdo que mantém com o Vaticano.
Deixemos de lado a tendência de Lula a confundir os interesses eleitorais de sua facção com assuntos que na verdade se situam na esfera do Estado brasileiro – vale dizer, da Nação, dos cidadãos brasileiros tomados em conjunto.
Plasmada durante um longo período, a identidade de um partido normalmente traz embutida uma avaliação de sua credibilidade ou confiabilidade aos olhos dos demais, e de outras organizações existentes na sociedade.
No início deste ano – estou certo de que todos os leitores se lembram disto -, uma papelada que atendia pelo pomposo título de Plano Nacional de Direitos Humanos, resumidamente PNDH-3, aterrisou na mesa da Dra. Dilma Rousseff, à época ministra-chefe da Casa Civil.
Tratava-se de uma extensa lista de propostas colhidas junto a não sei quantas reuniões e conferências realizadas por movimentos e entidades as mais variadas : ”setores da sociedade civil”, segundo o consagrado jargão petista.
O referido rol de propostas incluía a revisão da lei de anistia e a adoção de procedimentos de conciliação, em detrimento da autoridade judiciária em conflitos agrários – além do aborto e da controle social da mídia, já mencionados .
Chancelada pela ministra e por Lula – não farei a maldade de indagar se a terão lido – , a papelada virou anteprojeto e estava pronta para ser enviada ao Congresso Nacional.
E aí, aconteceu o quê ? Ora, aconteceu o óbvio. Contundentes advertências e pressões surgiram nos “setores” afetados : Forças Armadas, agricultura, mídia e Igreja. Mais que depressa, percebendo o provável estrago eleitoral, Lula mandou deixar o dito por não dito.
No entanto, pelo menos dois dos quatro assuntos - o controle da mídia e o aborto – continuaram a fermentar. O ressurgimento da questão do aborto, como vimos esta semana, foi rapidamente atribuído às “baixarias” do PSDB : é outro caso de mentira transparente. No que toca à mídia, até as pedras de minha rua perceberam que isso se deveu em grande parte aos ataques de Lula à imprensa.
Mas há - como venho argumentando desde o início -, uma questão de fundo. Dada a identidade histórica do PT e certas práticas em que ele parece fazer questão de reincidir, o quê, exatamente, os petistas esperavam que acontecesse ? Dilma diz que não disse o que disse. Lula manda deletar as sete ou oito linhas “inconvenientes” do PNDH-3.
E daí ? Os petistas combinaram com os russos, ou estão mesmo imaginando que estão com a credibilidade nas alturas ?
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