O ministro Marco Aurélio Mello frustrou a defesa do ex-presidente Lula sobre a possibilidade de que o STF retomasse hoje o debate sobre prisão em segunda instância, adiado por no mínimo uma semana, a pedido do autor da ação.
Rediscussão adiada
Relator do caso no STF, Marco Aurélio desiste de levar pedido de liminar hoje a plenário
Carolina Brígido e André de Souza | O Globo
-BRASÍLIA- O ministro Marco Aurélio Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF), frustrou ontem a expectativa da defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e adiou em pelo menos uma semana a possível rediscussão na Corte da prisão de condenados em segunda instância. Ele atendeu a um pedido do Partido Ecológico Nacional (PEN), autor da ação, que trocou de advogados e requereu o adiamento por cinco dias para que os novos defensores possam conhecer melhor o processo.
O pedido do PEN era para que a execução da pena começasse depois da condenação confirmada pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), que funcionaria como uma terceira instância. Ao menos cinco ministros devem defender que o tema não seja retomado em plenário. Argumentam que o STF já julgou isso em 2016, quando estabeleceu como marco para prisões a condenação em segunda instância. Por isso, não haveria mais necessidade de se voltar ao assunto.
Enquanto isso, o advogado José Roberto Batochio, que defende o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, informou ontem à noite que prepara dois recursos: os agravos às decisões do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que negou liminar para mantê-lo em liberdade, e do STF, que rejeitou habeas corpus.
PLENÁRIO JULGA HOJE HCS DE PALOCCI E MALUF
A presidente do tribunal, ministra Cármen Lúcia, pautou para a sessão plenária de hoje o julgamento de dois habeas corpus: um do ex-ministro da Fazenda Antonio Palocci e outro do deputado afastado Paulo Maluf. Ela queria que os pedidos fossem julgados antes da liminar do PEN, o que agora acontecerá naturalmente com o adiamento concedido por Marco Aurélio.
As discussões em torno dos habeas corpus devem ser longas. No caso de Maluf, o tribunal decidirá, primeiro, uma questão preliminar: se é possível um ministro, em habeas corpus, derrubar a decisão de outro. O ministro Edson Fachin determinou a prisão de Maluf e, depois, Dias Toffoli colocou o ex-deputado em liberdade. Ainda sobre Maluf, o tribunal também decidirá se cabem embargos infringentes contra a condenação — o que, na prática, daria ao deputado o direito a um novo julgamento.
Ao pedir o adiamento, o PEN informou ao STF que o advogado Antonio Carlos de Almeida Castro, conhecido por Kakay, foi afastado da causa e substituído por outros cinco profissionais. O presidente do partido, Adilson Barroso, disse ter se arrependido de entrar com o processo. O PEN defende que condenados possam recorrer em liberdade até o julgamento de todos os recursos. Com a prisão de Lula, Adilson Barroso, que se define como “de direita”, passou a ser apontado como defensor do petista — e ficou incomodado com essas críticas.
O partido cogitou desistir da ação e também da liminar. No entanto, o regimento interno do STF impede o autor desse tipo de processo, que trata de tema constitucional, de voltar atrás.
— Não pode desistir de ação direta, então não pode desistir de liminar. Pediu, está pedida. Tem várias ações diretas que os partidos pedem e depois desistem. Não cabe desistência. Depois que ingressou, o Supremo que vai julgar — explicou o ministro Alexandre de Moraes.
Se o ministro Marco Aurélio, relator da ação, levar o pedido ao plenário na próxima semana, caberá a Cármen Lúcia decidir se o caso será ou não julgado na hora. Moraes afirmou que, para levar a liminar ao plenário, Marco Aurélio deverá apresentar um fato novo surgido depois de 2016, quando o STF decidiu ser possível iniciar a execução da pena após a segunda instância. Para Moraes, não é um problema o tribunal examinar o assunto logo depois da prisão de Lula.
— Tem que ver qual vai ser a argumentação do ministro Marco Aurélio. Ele trazendo, a argumentação dele com certeza não tem nada a ver com o caso subjetivo (Lula), porque é um caso objetivo (genérico). Tem que ser um fato novo à negativa do tribunal lá atrás. A liminar foi negada. Não é costumeiro se analisar duas vezes a liminar, tem de ter uma questão nova — disse Moraes.
Com a nova rodada de discussões aguardada no plenário do STF, o mais provável é que novos desentendimentos mostrem mais uma vez a Corte dividida. Moraes minimiza as hostilidades recentes praticadas contra ministros do tribunal — manifestadas pela tinta na fachada do prédio de Cármen Lúcia e xingamentos a Gilmar Mendes.
— Vejo com tranquilidade. Já escapei ileso de coisa pior — declarou Moraes, que já foi secretário de Segurança Pública do estado de São Paulo e ministro da Justiça de Michel Temer.
NA CÂMARA, PECS PELA PRISÃO EM 2ª INSTÂNCIA
Em paralelo aos debates no STF, a Câmara dos Deputados ressuscitou o debate no Legislativo sobre a possibilidade de se iniciar a execução da pena após a condenação em segunda instância.
Duas Propostas de Emenda à Constituição (PECs) foram apresentadas na Câmara somente nos últimos 15 dias. O presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ), promete levar ambas à votação. Ambos deixam claro na Constituição que a prisão começará depois da sentença de segundo grau. O relator será Rubens Bueno (PPS-PR).
O deputado Alex Manente (SP), líder do PPS na Câmara e autor de uma das PECs, acredita que a prisão de Lula facilitará a aprovação da matéria no Congresso:
— É uma matéria que depende muito da opinião pública. O caso do Lula agora vai trazer uma facilidade para a PEC tramitar, sem dúvida.
A proposta está na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) e tramita em conjunto com a outra PEC recente sobre o tema, de autoria do deputado Onix Lorenzoni (DEM-RS).
Enquanto deputados comemoram o apoio para apresentar suas PECs na esteira da prisão de Lula, o senador Alvaro Dias (Pode-PR), pré-candidato à Presidência da República, reclama do contrário. Sustenta que colegas retiraram as assinaturas de uma proposta semelhante que ele apresentou, em meados do ano passado, em prol da execução da pena em segunda instância. Os senadores apontados como desistentes da PEC, Regina Sousa (PT-PI), José Pimentel (PT-CE) e Pedro Chaves (PRB-MS), foram procurados pelo GLOBO, mas não retornaram.
Pela proposta de Alvaro Dias, a Constituição trará textualmente a previsão de cumprimento da pena após decisão de segunda instância. Além disso, admite a prisão preventiva e temporária de membros do Congresso se usarem o cargo para a prática de crime. E retira a competência da Câmara e do Senado de sustar andamento de processos contra parlamentares por crimes cometidos após a diplomação. As duas Casas também deixariam de deliberar sobre prisão em flagrante de seus membros.
Outra proposta para permitir prisão após segunda instância, apresentada pelo senador Ricardo Ferraço (PMDB-ES) ainda em 2011, está pronta para ser pautada no plenário desde janeiro de 2015. A PEC prevê que órgãos colegiados da Justiça poderão, ao proferirem condenação, expedir o mandado de prisão, independentemente do cabimento de eventuais recursos.
— O efeito prático é que a pena comece logo a ser cumprida. Fora isso é impunidade. Minha proposta não é circunstancial, está há mais de dois (anos) para ser votada, mas falta vontade política — reclama Ferraço. (Colaborou Renata Mariz)
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