sábado, 17 de junho de 2023

Carlos Alberto Sardenberg - Fazer o quê? E como?

O Globo

Primeiro, é preciso saber quais são as propostas. Segundo, quando se sabe, qual prevalece. E terceiro, quem será nomeado para tocar as coisas

No início deste mês, dava-se como certo que a ministra do Turismo, Daniela Carneiro, seria demitida nesta semana. Não foi. Na próxima, o presidente Lula vai para a Europa, de modo que a ministra, também deputada federal pelo Rio, pode ganhar mais alguns dias, se escapar neste final de semana. Estaria o governo avaliando a política para o turismo? Teria a ministra fracassado em apenas cinco meses de governo?

Ingenuidade.

Há uma intensa discussão sobre o futuro desse ministério, mas ninguém, entre amigos e adversários da deputada, fala sobre programas para desenvolver o turismo interno ou para atrair mais estrangeiros para este belo país.

Tem mais. Daniela Carneiro integra o grupo político liderado por seu marido, prefeito de Belford Roxo, o Waguinho. O casal, com ligações à direita, apoiou Lula nas últimas eleições — e o presidente é muito grato. Logo, se a questão não tem nada a ver com turismo, tem muito a ver com a compensação que se dará ao grupo de Waguinho. Algo numa área parecida? Algo a ver com viagens? Aeroportos? Nada. Especula-se que o prefeito e sua mulher estejam interessados na gestão dos serviços de saúde do Rio. Mais exatamente, nos grandes hospitais federais. São cinco grandes. Problema: estão sob controle do PT.

De novo, não se fala de políticas para melhorar a eficiência dos hospitais, reduzir as filas de espera, coisas assim. Nos bastidores da disputa, comenta-se que essa área da saúde tem mais capilaridade e, sobretudo, muito mais verbas, contratos de prestação de serviços, compra de equipamentos e medicamentos. (Aliás, como registrou Bernardo Mello, do GLOBO, dois diretores desses hospitais, indicados pelo PT, já foram exonerados, depois de reportagens do jornal e da TV Globo, levantando questões de administração.) Repararam? A ministra tem apenas cinco meses de gestão. Os diretores, nem isso. Não daria para avaliar nenhuma política séria.

Na última reunião ministerial, Lula disse a seus auxiliares que não queria mais saber de ideias novas, mas da aplicação de propostas já definidas. Quem tem propostas? O ministro Fernando Haddad, certamente. Tem conseguido desenvolver seus programas, mas não sem enfrentar surpresas dentro do próprio governo. Ele vinha repetindo que seu objetivo é reduzir os incentivos fiscais, quando o vice-presidente e ministro da Indústria, Geraldo Alckmin, anunciou um programa de concessão de incentivos para a indústria automobilística. Haddad ainda se salvou de uma goleada feita de gols contra. Conseguiu limitar o programa de Alckmin, mas teve de entregar algumas centenas de milhões de reais.

A questão dos incentivos aparece em dois temas cruciais para o governo e para o país: a reforma tributária e o arcabouço fiscal. Qual linha prevalecerá? É a pergunta que se fazem senadores e deputados. Na verdade, uma questão mais ampla: o governo e suas bases apoiam que projeto de reforma dos impostos? São dilemas que prejudicam o funcionamento do governo. Primeiro, saber quais são as propostas. Segundo, quando se sabe, qual prevalece. E terceiro, o mais importante, quem será nomeado para tocar as coisas.

Considerem a disputa aberta entre ambientalistas e desenvolvimentistas. Estes querem os investimentos na indústria do petróleo, incluindo a exploração do óleo na Margem Equatorial, ao longo da foz do Amazonas, e na construção de ferrovias e estradas, de apoio ao agronegócio, que passam pela Amazônia. Ora, a preservação da floresta é compromisso firme de Lula, local e internacional. E os ambientalistas, liderados por Marina Silva, demonstram muita firmeza. Parece que o presidente tentará conciliar as posições.

Muitas escolhas precisam ser feitas, e logo. O governo está para anunciar uma nova versão do Programa de Aceleração do Crescimento — e ali deverão constar os investimentos e financiamentos prioritários. Aí veremos. Aliás, saberemos também o nome. PAC lembra Dilma. E está meio queimado. É outro dilema. O de menos.

 

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