O Globo
A proposta é que a regra a ser apresentada
pelo governo considere uma hipótese de despesa prevista para 2023 de R$ 1,98
trilhão
Em artigo anterior, discutimos qual deveria
ser a atitude que o governo deveria ter acerca do chamado “extrateto”, na regra
que deverá propor ao Congresso nos próximos meses. Com vistas a colaborar nesse
debate, este é parte de um conjunto de três artigos com ideias a esse respeito.
O artigo de hoje versará sobre o “X da questão”, ou seja, qual deveria ser o valor X do teto no ano inicial de referência, que a sugestão aqui feita é que seja 2024. Em nosso próximo encontro, trataremos da proposta de regra de variação do teto de 2025 em diante.
Para que o leitor tenha uma ideia mais
precisa do que está em jogo, tomemos como referência o ano de 2022. Nele, houve
cinco números-chave em jogo, no critério dito de “valor pago”: i) a despesa, de
R$ 1,799 trilhão; ii) o teto, de R$ 1,681 trilhão; iii) as despesas sujeitas ao
teto, de R$ 1,642 trilhão; iv) a chamada “margem”, ou seja, o que poderia ter
sido gasto dentro do teto e não foi, correspondente à diferença entre (ii) e
(iii), ou seja, R$ 39 bilhões; e v) o “extrateto”, que é a diferença entre o
que foi gasto na prática e o valor das despesas sujeitas ao teto, que se
referem a um universo parcial do gasto total, levando em conta as exceções.
Este item é então o resultado de subtrair
da despesa (i) o item (iii), subtração essa que nos dá o resultado de R$ 157
bilhões.
Deixando de lado possíveis despesas futuras
que continuariam a ser excepcionalizadas na rubrica de “créditos
extraordinários”, isso significa que o teto futuro deveria ser razoavelmente
superior ao atual, pelo fato de medir coisas diferentes, uma vez que o atual
não contempla uma série de exceções tratadas como parte do “extrateto” e que,
na regra futura, seriam levadas “para dentro” do teto.
Assim, esse princípio, se tivesse sido
adotado em 2022 deveria levar, grosso modo, a um teto que corresponderia à
despesa observada de R$ 1,799 trilhão, mais a margem que não foi gasta de R$ 39
bilhões e que poderia ter sido gasta, soma essa que dá um total de R$ 1,838
trilhão.
A proposta é que a regra a ser apresentada
pelo governo considere uma hipótese de despesa prevista para 2023 de R$ 1,98
trilhão e sinalize para um valor inicial de referência de 2024, com quatro
componentes:
• a inflação esperada para 2023, de 6%;
• um crescimento real de 1%;
• um ajuste preventivo de 0,5% para dar
conta de possíveis diferenças entre a inflação prevista e a observada; e
• um plus da ordem de R$ 20 bilhões, para
regularizar o valor do fluxo de precatórios, desfazendo a aberração cometida
com a “PEC dos precatórios” de 2021, batizada na época pela imprensa como “PEC
do calote”.
O resultado dessa multiplicação é uma
despesa em 2024 de R$ 2,150 trilhões. Assim, sugere-se que a proposta
legislativa enviada pelo Executivo ao Congresso explicite esse teto global de
despesa em 2024.
Considerando uma possível despesa de R$ 10
bilhões com créditos extraordinários, um PIB em 2023 de R$ 10,5 trilhões e,
para 2024, parâmetros de crescimento do PIB e de variação do deflator implícito
de 1,5% e de 5,0%, respectivamente, teríamos em 2024 um gasto potencial de R$
2,160 trilhões e um PIB estimado em R$ 11,190 trilhões.
Em outras palavras, o gasto seria de 19,3 %
do PIB, exatamente o mesmo patamar de 2018, no final do governo Temer.
A diferença é que, naquela oportunidade, a
receita líquida do governo central foi de 17,6% do PIB, enquanto em 2022 já
tinha alcançado 18,9% do PIB, mesmo sob a gestão liberal de Paulo Guedes, razão
pela qual faria sentido aspirar a ter como objetivo conservar esse valor em
2024, o que nos deixaria com um déficit primário da União de 0,4% do PIB,
passível de virar superávit ainda no atual governo.
A partir daí, seria necessário postular um
crescimento do gasto modesto e inferior ao da economia, para voltar a reduzir
paulatinamente a relação gasto/PIB, como entre 2016 e 2022.
Continua no terceiro e último capítulo,
daqui a duas semanas.
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