Correio Braziliense
O nome de JK entrou na história do Brasil
pela coragem de mudar o país. Desde então, os políticos se acovardaram
Na noite do dia 21 de abril de 1960, estava com um amigo na Praça dos Três Poderes. Assisti, maravilhado, às festas da inauguração da nova capital do Brasil. Meu pai foi convidado para o baile de gala, que foi realizado no Palácio do Planalto. Eu e um amigo carioca ficamos passeando pela imensa praça ouvindo o magnífico coral de não sei quantas centenas de vozes, os gritos entusiasmados dos candangos. Vi os fogos. Senti a alegria. A festa atingiu seu ápice quando o presidente Juscelino Kubitschek desceu a rampa, atravessou a rua e se jogou no meio da multidão. Foi um suceder de abraços, parabéns, cumprimento, apertos de mão. Uma senhora beijou-lhe os pés.
Essa imagem foi a minha introdução à ciência
política. Brasileiro gosta de empreender, gosta de trabalhar, gosta de emprego.
O presidente JK percebeu que o país vivia de costas para seu interior. E tratou
de impulsionar a integração nacional. Os brasileiros descobriram o Centro-Oeste
e o Norte do país. Até então, viajar a Belém do Pará só era possível por navio
ou avião. O Brasil dos anos sessenta era muito diferente do atual. Tínhamos
Vinicius de Moraes, Tom Jobim, bossa nova, campeonato mundial de futebol,
Garrincha e Pelé. O país era alegre e trabalhava para reduzir suas chagas. Era
mais ingênuo também.
Revi o presidente JK na redação da Veja em
1975. Ele fez uma agradável visita à nossa redação em Brasília, dirigida pelo
inesquecível Pompeu de Sousa. Conversou com cada um dos presentes chamando pelo
nome e, no fim, posou para fotografia com a turma. Ganhou o grupo com base na
boa conversa. Político de excepcional qualidade. Fenômeno raro na história do
país. Só voltei a revê-lo no enterro que saiu da Catedral e foi até o cemitério
cercado por populares e admiradores. Entre eles, meu pai, que na época tinha 60
anos. Ajudou a carregar o caixão por todo o percurso.
Os cinco anos em cinco, slogan daquele
governo, é a síntese de uma obra de gigante focado e determinado. É preciso
lembrar que o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o governo norte-americano
eram contra a realização das metas de JK. Ele não deu bola para a oposição, nem
para militares mal-humorados e foi em frente. Seu nome entrou na história do
Brasil pela coragem de mudar o país. Desde então, os políticos se acovardaram.
Um presidente renunciou, tentando o golpe de Estado. Outro foi deposto por militares,
que ficaram mais de duas décadas no poder e devolveram o governo aos civis com
imensa dívida externa. Foi difícil sair daquela situação falimentar.
Dois presidentes sofreram impeachment e nada
foi feito de substancial para o Brasil avançar. A Constituinte foi uma obra
bonita e sofrida, culminância do trabalho de Tancredo Neves e seu grupo (no
próximo dia 21 de abril, completa-se 40 anos da morte de Tancredo). O
presidente José Sarney tem participação expressiva nesse processo. A partir
daí, o país passou a ser administrado pela ótica populista de um governo que
lança programa atrás de programa para conceder vantagens ao trabalhador, mas
não cria as condições necessárias para a indústria prosperar. O brasileiro
deixou de ser profissão-esperança. Ele agora espera a benesse do governo. Há
uma acomodação com a chamada renda média, que dispensa sonhos de futuro melhor.
O país está estagnado nos discursos dos líderes trabalhistas.
Em tempos recentes, surgiu no país e no mundo
esta extrema-direita que é contra tudo o que se chama moderno. Ex-presidente,
que está hospitalizado, não deu a menor atenção aos vitimados pela covid, não
visitou hospitais nem parentes enlutados e, agora, faz pose de sofredor em
hospital. Pleiteia a anistia, esquecido que tramou contra as instituições e
chegou a planejar assassinato de ministro do Supremo e dos presidente e
vice-presidente da República. O equivalente a ele nos Estados Unidos subverte
as relações econômico-financeiras do mundo. Leva o planeta a um confronto muito
perto de uma guerra real. Provoca os europeus. Ataca as melhores universidades
norte-americanas e expulsa do país quem ele quer. É um autocrata explícito.
Espanta que a democracia norte-americana não seja capaz de resistir a esses
furiosos ataques aos seus conceitos fundamentais. E à própria economia.
É difícil comparar o Brasil de hoje com o de
ontem. Há virtudes e defeitos. Perdemos a ingenuidade. Não temos mais boa
música nem futebol de categoria. Os poetas desapareceram. Os sonhadores,
também. Os políticos profissionais sumiram. Hoje os parlamentares têm valor
porque pertencem à bancada da bala, dos evangélicos, dos agricultores ou de
outro grupo qualquer. Alguns pretendem utilizar o mandato apenas para se
proteger de eventual processo judicial. A política como exercício de poder para
promover o bem público perdeu-se em algum momento no Brasil. O país está órfão
de grandes líderes. Situação, aliás, que aflige o mundo neste momento.
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