Jair Bolsonaro enfatiza o embate ideológico contra inimigos já apeados do poder
Como o petista Luiz Inácio Lula da Silva, sua nêmesis, o presidente Jair Bolsonaro (PSL) se pretende uma ruptura. Verdade que Lula, mais megalômano, se apresentava como uma guinada na história nacional de cinco séculos. Bolsonaro, empossado nesta terça (1º), anuncia uma reviravolta na democracia das últimas três décadas.
Populista, a exemplo do rival, o novo mandatário precisa de vilões a combater, reais ou imaginários. Ao discursar, transformou um ataque tresloucado durante a campanha em uma conspiração derrotada de forma épica. “Quando os inimigos da pátria e da ordem tentaram pôr fim à minha vida, milhões de pessoas foram às ruas.”
Os pronunciamentos —primeiro ao Congresso, depois ao público aglomerado em frente ao Planalto— apelaram ao embate ideológico e, infelizmente, pouco ou nada adiantaram da agenda de governo.
Bolsonaro, de fato, é uma novidade na história recente: um líder popular de retórica abertamente conservadora, que fala em Deus a todo momento, promete valorizar a família e combater a agenda de gênero. “O povo começou a se libertar do socialismo, da inversão de valores, do gigantismo estatal e do politicamente correto.”
Além da pauta assim chamada progressista, ataca de modo genérico a desordem econômica produzida nos anos de gestões social-democratas, o avanço da criminalidade e a corrupção associada ao loteamento político do Executivo.
Não deixa de ser uma maneira eficaz de capitalizar insatisfações gerais com vícios da administração pública nacional —a propensão ao gasto além das possibilidades, a baixa qualidade dos serviços de Estado e a dificuldade de formar coalizões em meio à proliferação de partidos fisiológicos.
O que não se sabe é como as bandeiras serão convertidas em políticas de governo. De forma consciente ou não, Bolsonaro alimenta a ilusão perigosa de que a redenção depende somente de destronar esquerdistas ou velhos políticos.
Entretanto os petistas foram apeados do Planalto há mais de dois anos; Lula está preso e inelegível. A política econômica já tem buscado o equilíbrio orçamentário e a redução do intervencionismo estatal, contra ferozes resistências; a política externa já se distanciou da Venezuela e do antiamericanismo.
Nem existem os poderosos inimigos da retórica presidencial, nem faz sentido algum tipo de ruptura. Há diagnósticos consistentes das mazelas nacionais e propostas em discussão avançada ou postas em prática no aparelho do Estado.
O sucesso do novo governo dependerá da boa convivência democrática —em particular com o Congresso, como Bolsonaro demonstrou reconhecer na posse. Que o mandatário saiba, com realismo, promover a prometida renovação dos acordos políticos em busca das reformas de fato prioritárias.
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