quarta-feira, 27 de fevereiro de 2019

Discurso antipolítica de Bolsonaro emperra aprovação da reforma, diz Rodrigo Maia

Para presidente da Câmara, governo só tem o PSL na sua base e perderia na CCJ se a votação fosse hoje

Joelmir TavaresFlavia Lima | Folha de S. Paulo

SÃO PAULO - O presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), disse nesta terça-feira (26) que um dos obstáculos para o presidente Jair Bolsonaro aprovar pautas como a reforma da Previdência é o seu discurso antipolítica. Segundo ele, se a votação da reforma ocorresse hoje na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça), o governo perderia.

“O problema é que o presidente está refém do discurso dele de campanha”, disse Maia em seminário do banco BTG Pactual, na capital paulista.

Para o deputado, é improdutivo o discurso de contrapor “nova política” e “velha política”, que contribui para uma erosão das relações com os congressistas.

“A questão é construir uma aliança. A gente não pode menosprezar a política, criminalizar a política em todos os momentos”, continuou.

Segundo Maia, até o início de junho ou a primeira quinzena de julho, os parlamentares estarão prontos para votar a proposta, mas para isso é preciso uma boa articulação.

“Se a gente sabe que é um processo de construção, por que pressa em instalar a comissão se vou ter isso organizado lá para a segunda quinzena de março? Vamos dar tempo ao tempo para que as coisas se organizem e para que 15 dias não representem derrota da reforma da Previdência”, afirmou.

Segundo ele, o movimento de olhar um assunto de longo prazo com uma ansiedade de curto prazo é coisa do mercado financeiro. “Talvez a pressa possa derrotar a reforma, daí não tem dez anos de economia”, disse.

De acordo com Maia, não é possível saber quantos votos o governo teria hoje para aprovar a reforma porque a sua base está em formação.

“Hoje eu digo que o governo tem o PSL na sua base e não tem mais partido algum”, afirmou. A articulação do governo precisa melhorar, comentou.

Para Maia, não adianta querer colocar o DEM nessa base sem compreender que o partido sozinho não resolve o problema do governo —seria preciso trazer mais 10 ou 12 partidos para aprovar a Previdência.

“Ir sozinho para a base do governo, como sugeriu o Caiado [Ronaldo Caiado, governador de Goiás], é uma precipitação, um erro de avaliação de como forma a base no parlamento brasileiro”, disse.

Maia falou que atender a agenda das bancadas temáticas não significa que eles vão votar a reforma da Previdência e alertou que a nova formação da Câmara tem uma oposição mais forte ao governo do que a existente na gestão passada, de Michel Temer. “O governo precisa olhar o Parlamento com um cuidado grande.”

COMUNICAÇÃO LENTA
O presidente da Câmara também fez críticas à comunicação do governo sobre a reforma, que ele considera estar lenta. “A comunicação precisa ser mais ágil”, afirmou. “Já está muito atrasado.”

“As redes sociais são muito rápidas. A contaminação é quase que instantânea. Eu vejo com muita preocupação esse erro [...], não ter preparado as redes com essa guerrilha”, afirmou Maia.

Para ele, o risco é o de que Bolsonaro perca o controle da narrativa sobre a reforma e se repita a onda de rejeição que impediu Michel Temer (MDB) de aprovar sua reforma para o sistema de aposentadorias.

“O que vai mobilizar a sociedade, e a sociedade mobilizar os deputados, são as redes sociais. E, se o governo não for rápido, a gente acaba contaminando como acabou contaminada a reforma do Michel Temer.”

Ele acrescentou: “E nós temos a melhor estrutura de comunicação de WhatsApp, que é a estrutura do PSL do presidente Bolsonaro. A gente não pode perder a oportunidade de utilizá-la”.

EFEITO DE MILITARES SERÁ NULO
Maia disse também que a proposta de reforma dos militares vai ser encaminhada depois do Carnaval e que é importante aprovar pelo menos uma idade mínima para que eles não se aposentem tão jovens.

Do ponto de vista fiscal, disse ele, a proposta dos militares deve ter um efeito nulo porque virá acompanhada de uma reorganização salarial para as Forças Armadas.

“Também não acho que o general de quatro estrelas, por tudo que passou e se preparou, ganhar R$ 22 mil e o teto do serviço público ser R$ 39 mil (...) não me parece uma equação correta. Mas a gente sabe que não tem como fazer essa reorganização da noite para o dia senão quebra o Estado.”

Em relação ao serviço público, disse ele, dois temas vão resultar muita pressão: a idade mínima de aposentadoria para os servidores públicos que entraram antes de 2003 e a questão das alíquotas de contribuição progressivas, que já dizem ser inconstitucional.

“Mas é difícil alguém defender a alíquota de quem ganha lá embaixo ser igual a de quem ganha o topo”, disse.

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