Negar gravidade da atual crise fiscal é
inadmissível
O Globo
Brasil tem segundo pior rombo nas contas
públicas entre 23 países emergentes e desenvolvidos
Num grupo de 23 economias emergentes e
desenvolvidas, o Brasil aparece com o segundo pior resultado nas contas
públicas. No levantamento que considera receitas, gastos e também despesas
com os juros da dívida, apenas Bolívia tem desempenho pior, segundo análise do
banco BTG Pactual. Esse foi o quadro registrado nos dois últimos anos e deve se
repetir em 2025.
A previsão para os próximos 12 meses é que os
bolivianos continuarão em primeiro lugar no ranking dos piores, mas conseguirão
reduzir o tamanho do déficit. Por aqui, o cenário é de elevação. Há
metodologias diferentes para determinar o quadro fiscal de um país. A que
determina a trajetória da dívida pública é justamente a que leva em conta o
pagamento de juros. Quanto maior o rombo a cada ano, mais alto o endividamento.
É essa a métrica acompanhada pelos investidores. Deveria ser também o principal
ponto de atenção do governo federal e dos congressistas.
Tentativas de ilusionismo ou negação não mudaram nem nunca mudarão a realidade. O desempenho brasileiro é ruim sob qualquer ângulo. O resultado é pior que a média dos emergentes, dos desenvolvidos e da América Latina. A previsão do BTG Pactual para este ano é de um déficit de 8,6% do Produto Interno Bruto (PIB). No México, Colômbia, Peru e Chile, o percentual deverá ser inferior a 4%.
Confirmada a manutenção do rombo das contas
públicas e da despesa com juros da dívida, o endividamento em relação ao PIB
crescerá 14 pontos percentuais ao longo do atual mandato do presidente Luiz
Inácio Lula da Silva. Para um país com uma dívida alta como o Brasil, o cenário
é um tremendo problema. Por isso a insegurança no mercado financeiro e as altas
repetidas do dólar. Insinuar que as esquinas da Avenida Brigadeiro Faria Lima,
em São Paulo, estão cheias de especuladores trabalhando contra o país é terraplanismo
econômico.
Na semana passada, o ministro da
Fazenda, Fernando
Haddad, antecipou que o governo deve ter fechado 2024 com um déficit de
0,1% do PIB. O cálculo do ministro usa metodologia que não inclui as despesas
com os juros da dívida. Na análise do resultado fiscal, a Fazenda também retira
fatores extraordinários. Eventos como os gastos com as enchentes do Rio Grande
do Sul não são considerados. O esforço pode ser válido, mas o incrível é que,
com todas essas ressalvas, o governo não conseguiu equilibrar as contas. O
percentual antecipado por Haddad se encaixa nas regras fiscais somente porque
há uma tolerância de déficit de até 0,25% do PIB.
A comemoração desse resultado dá a medida do
baixo nível da discussão fiscal no Brasil. O endividamento, é bom não esquecer,
segue subindo. A se confirmarem as últimas projeções da Instituição Fiscal
Independente (IFI), criada para ampliar a transparência das contas públicas e
ligada ao Senado Federal, a dívida chegará a 86% do PIB no ano que vem, 91% em
2027, mais de 100% em 2030 e 116% em 2034, o horizonte das estimativas. Quanto
mais elevada, maior o custo de rolagem. Neste ano os gastos com juros devem passar
de R$ 1 trilhão. Diante de tantas evidências, negar a gravidade da crise fiscal
é inadmissível. É hora de medidas à altura dos desafios. O ajuste deve ser
amplo para ter efeito. Governo e Congresso devem sanar essa dívida com o país.
Petrobras precisa acabar com a defasagem de
preços de combustíveis
O Globo
No exterior, diesel custa 23% a mais. Sem
correção, petroleira repetirá erros do governo Dilma
Quando Magda
Chambriard substituiu Jean Paul Prates no comando da Petrobras no
ano passado, temia-se que a intervenção do governo na empresa aberta de capital
misto seria pesada. A suspeita era que práticas do tempo de Dilma Rousseff na
Presidência da República fossem retomadas. Infelizmente, os preços baixos dos
combustíveis nos postos de gasolina são mais uma confirmação dos piores
temores. O real vem perdendo valor ante o dólar, e o barril de petróleo ficando
cada vez mais caro. Com esse quadro, uma gestão responsável levaria à elevação
dos valores cobrados nas bombas. Não na Petrobras do governo do presidente Luiz
Inácio Lula da Silva.
O último reajuste da gasolina ocorreu no
distante mês de julho. O do diesel aconteceu há mais de um ano, em dezembro de
2023. Nesta semana, a defasagem dos preços internos em relação aos externos na
gasolina chegou a 14%. No diesel, derivado que o país mais importa, atingiu
23%.
À primeira vista, a estratégia de segurar os
preços dos combustíveis pode parecer atraente. O transporte de cargas por todo
o país — do preponderante rodoviário ao ferroviário — é movido a diesel.
Portanto qualquer alteração nas refinarias resulta em aumento de custos aos
transportadores. Num efeito cascata, as altas são repassadas para os varejistas
e logo chegam aos bolsos dos consumidores. Em pouco tempo, as alterações são
sentidas nos índices que medem a inflação de diferentes tipos de alimentos em supermercados
e produtos industrializados nas lojas.
Essa costuma ser a preocupação de quem ocupa
o Palácio do Planalto, um dos raros pontos de concordância do atual governo com
o de Jair Bolsonaro. O problema é que a defasagem praticada pela Petrobras, a
maior empresa do mercado local, traz efeitos indesejados. No caso de companhias
menores e bem geridas, inibe as importações, podendo causar até
desabastecimento. Na Petrobras, a diferença de preço significa prejuízo ou
endividamento.
Quando Pedro Parente assumiu a empresa em
2016 com a missão de saná-la, a dívida beirava os R$ 690 bilhões em valores de
hoje. Era, na época, o maior endividamento entre as petroleiras. A conta
deixada por Dilma pela política de represar os preços dos combustíveis era
estimada em mais de R$ 90 bilhões. Felizmente, a situação atual é bastante
distinta. A petroleira tem obtido receitas elevadas com as vendas externas de
petróleo e seu endividamento está sob controle. Mas é uma irresponsabilidade
voltar a trilhar o caminho da má gestão.
Em 2023, o presidente Lula decidiu “abrasileirar” a metodologia usada para determinar os preços. O dólar, moeda em que o valor do barril é cotado, deixou de ser a única referência. Entraram no cálculo itens como volume de produção e custos de transportes. Tudo em nome de reduzir a volatilidade. Mesmo com todas as modificações, o problema acabou chegando. A questão da defasagem está à espera de solução. Em fevereiro, os preços subirão, mas a causa é o aumento da alíquota de ICMS.
Conta de juros dispara e exige esforço fiscal
maior
Valor Econômico
Diante da aceleração do endividamento, o
governo teria de se comprometer a não apenas frear os gastos, mas também a
obter superávits primários relevantes logo
O governo conta centavos para obter um
déficit fiscal que seja o mais perto possível do zero, enquanto que a conta
quase trilionária de juros cresce aceleradamente. Nos doze meses concluídos em
novembro, o déficit nominal do setor público atingiu 9,5% do PIB, ou R$ 1,11
trilhão. No ano até novembro, os juros consumiram R$ 918,2 bilhões, ou 7,85% do
PIB, R$ 205 bilhões a mais que no mesmo período de 2024. Para conter a
inflação, em boa parte impulsionada pelos gastos públicos, o Banco Central
apontou que elevará a taxa Selic em 1 ponto percentual nas duas reuniões até
março, até 14,25%. Pelas expectativas dos investidores, a taxa não para por aí
e ultrapassará 15%.
Nesse ritmo, e se nada for feito, o Brasil,
que não tinha até há pouco uma crise fiscal no horizonte, começará a flertar
com uma.
Uma comparação com 25 países emergentes e
desenvolvidos, feitas pelo BTG, colocou o déficit nominal brasileiro, que
contabiliza os juros e o saldo entre gastos e receitas, em segundo lugar, atrás
apenas da Bolívia (Valor,
ontem). Para o banco, o rombo total das contas chegou a 7,8% do PIB em 2024 e
subirá a 8,6% em 2025. Esses números são substancialmente maiores que os 4,2%
de média dos países da América Latina ou dos 5,7% da média dos países
emergentes. Como a dívida bruta do Brasil já era maior que a dos demais
emergentes (87,6% do PIB ante 70,8% da média, segundo o FMI, que tem critérios
contábeis distintos do BC brasileiro), o aumento da carga de juros é um
desastre que poderia ser evitado.
O alto déficit nominal de países próximos do
Brasil no ranking, como Índia (7,8%), China (7,4%), Estados Unidos (7,3%) e
África do Sul (6,2%), não significa que as situações são comparáveis ou que não
haveria problemas em exibir resultados negativos dessa magnitude. A taxa de
juros real brasileira (descontada a inflação) é muito elevada, a segunda maior
do mundo, acima de 8%. A Índia pode ter um déficit quase semelhante, pois se
financia pagando 2,43% de juros. A China, cujo déficit é crescente, tem taxa perto
de zero. A África do Sul paga 4,48% e os Estados Unidos, 1,65%.
Até o governo petista apresentar seu novo
regime fiscal, havia o temor dos investidores de que a dívida bruta fosse
crescer sem controle. Houve certo alívio depois que, pelo novo regime, foi
prometido um superávit primário de 0,5% em 2025 e de 1% em 2026, último ano do
mandato de Lula. Mas já em abril a desconfiança voltou, para não sair mais do
horizonte. As metas foram mudadas, o superávit foi reduzido a 0,25% do PIB a
ser alcançado apenas em 2026. Como o governo tem mirado a margem de tolerância
de 0,25 ponto percentual para baixo, o governo Lula poderá passar seus quatro
anos de governo sem reduzir em um único centavo a dívida bruta (R$ 9,1 trilhão,
ou 77,7% do PIB) e sequer conseguir levar as contas primárias ao azul.
Dessa maneira, sem economias necessárias de
um superávit primário, o endividamento bruto está evoluindo rapidamente,
embalado por taxas de juros que já eram altas e se tornarão ainda mais elevadas
ao longo deste ano. Para impedir que a dívida continue crescendo, o governo
teria de produzir um superávit primário de pelo menos 1,5% - há avaliações de
que seria preciso mais, 2,5%. Na metade do mandato de Lula, a dívida bruta já
aumentou 6 pontos percentuais do PIB. Pelas projeções da Instituição Fiscal Independente
do Senado, ela chegará a 86,1% em 2026 e atingirá 100% em 2030. Nessa
progressão, não haverá espaço para juros civilizados e o mais provável é que
haja problemas para refinanciamento dos débitos ao longo do caminho.
Na comparação com os países emergentes, o
Brasil é um dos países que mais arrecadam - 39,3% do PIB em 2024, ante uma
média de 27%. Mas isso não é grande vantagem já que é um dos que mais gastam
(incluindo juros), 46,2% do PIB, comparado à média de 32,6% do PIB, segundo
estatísticas do Fundo Monetário Internacional (FMI).
A escalada dos juros coloca o governo diante
do dilema entre fazer um aperto para equilibrar as contas e suas ambições
eleitorais. Mas ela também aflige o setor privado e os investimentos. A empresa
de avaliação de riscos Fitch informou ontem, por exemplo, que na última vez em
que a taxa Selic subiu acima dos 13% as notas de crédito das empresas
brasileiras foram reavaliadas na proporção de 5 rebaixamentos para uma
elevação. Como os empréstimos seguem a taxa básica, o endividamento aumentará e
o risco de emprestar se elevará, aumentando os prêmios.
Diante da aceleração do endividamento, o
governo teria de se comprometer a não apenas frear os gastos, mas também a
obter superávits primários relevantes logo. As despesas não incluídas no
cômputo das metas fiscais se somam à dívida e, ainda que seja importante quase
conseguir zerar o déficit primário, como pode ter ocorrido em 2024, isso está
se tornando irrelevante diante da escalada dos juros e dos estragos na inflação
provocadas pelo câmbio, que e parte se move pela fragilidade fiscal crescente.
Os custos eleitorais de uma inflação em alta deveriam também entrar nos
cálculos do governo.
Cessar-fogo
em Gaza é passo importante, mas não garante a paz
Folha
de S. Paulo
Mundo
deve celebrar acordo entre Israel e Hamas; são muitos os desafios no Oriente
Médio e com Trump na Casa Branca
Com
um atraso de longos meses, o
anúncio nesta quarta-feira (15) de um cessar-fogo na Faixa de Gaza deve
ser recebido com alívio pela comunidade internacional. Os desafios para a paz
no pântano geopolítico do Oriente Médio,
porém, são muitos e complexos.
A
boa nova veio após intervenção de Donald Trump,
que antes de assumir a Casa Branca colocou Binyamin
Netanyahu contra a parede devido à longa procrastinação do premiê
israelense.
É
sinal do modus operandi do republicano: Netanyahu sempre foi um de seus aliados
mais próximos, mas nem por isso escapou de admoestação em rede social.
Mais
importante, Trump enviou um emissário, o empresário Steve Witkoff, para dizer
que a hora do acordo era agora. Restou ao israelense aquiescer e lidar com a
revolta de sua base de ultradireita religiosa. A boa posição de seu partido em
pesquisas para o pleito de 2026 pode ter influenciado o acordo, entretanto esta
é uma história inconclusa.
O
cessar-fogo —que prevê a libertação gradual dos 98 reféns (talvez apenas 60
deles estejam vivos) tomados pelos terroristas do Hamas em 7
de outubro de 2023— ainda depende de aprovação dos 11 membros do gabinete de
segurança de Tel Aviv, 2 deles sionistas radicais.
Com
isso, abre-se
caminho para o fim da matança em Gaza, que colheu mais de 46,7 mil vidas
segundo o Hamas. Cabe sempre relembrar a responsabilidade dos terroristas
palestinos, com seu hediondo ataque que matou em um só dia quase 1.200 pessoas.
Agora,
os desígnios são maiores, com concessões de lado a lado, embora o futuro de
Gaza seja incerto. O governo americano em ocaso tem um plano envolvendo forças
estrangeiras e uma nova autoridade palestina,
mas não se sabe como Trump agirá.
Por
extensão, o novo Oriente Médio que emerge de mais uma rodada de violência
também tem rota nebulosa. Certa é a derrota estratégica neste momento do Irã, arquirrival
dos EUA e de Israel que
passou duas décadas armando uma rede de aliados em torno do Estado judeu.
Um
por um, quase todos caíram: o Hamas foi trucidado, e o Hezbollah libanês,
idem; a Síria,
que servia de "hub" logístico do terror, viu
a ditadura local evaporar. Restaram apenas os rebeldes houthis do remoto
Iêmen.
A
vitória é cercada de riscos, quando menos porque as capacidades dos
beligerantes se renovam. Tampouco é descartável a ideia de que Israel volte à
carga, findo o drama dos reféns.
A
questão palestina seguirá sem solução, ainda mais sob Trump, que em sua
primeira encarnação presidencial pensou em atacar o Irã e desenhou uma série de
acordos com países árabes que ignoravam o que os cleptocratas de Ramallah
pensavam.
Esse
formato está gasto devido ao sangue derramado em Gaza. A simbólica paz entre
Israel e a Arábia
Saudita pode até voltar à pauta, mas dependendo do ânimo de Trump ante
a teocracia de Teerã.
A
desigualdade nas redações do Enem
Folha
de S. Paulo
Disparidade
entre rede pública e privada no exame evidencia falha do Estado em promover
ascensão social pela educação
Dos
mais de 4,32 milhões de inscritos no Enem de
2024, só
12 obtiveram a pontuação máxima (nota 1.000) em suas redações. Desse
seleto grupo, apenas uma estudante concluiu o ensino médio numa escola pública.
Todos os demais vêm de colégios particulares.
A
escola pública exitosa é um colégio de aplicação ligado à Universidade Federal
de Viçosa (MG) que seleciona alunos por meio de exame. Assim, é um corpo
discente mais elitizado e pouco representativo das instituições de ensino
públicas regulares.
A
queda ante 2023 é significativa. Naquele Enem, 60 estudantes obtiveram a nota
1.000, dos quais 4 eram de escolas públicas.
Esses
dados somam-se a outros indicadores que evidenciam a grande distância que
separa o desempenho de estudantes das redes pública e privada.
Relatório
de 2023 da ONG Todos pela Educação, com
base em números do Sistema de Avaliação da Educação Básica do estado de São Paulo,
mostrou que 75,8% dos alunos do ensino médio do sistema particular tinham
desempenho adequado em língua portuguesa; no público, a taxa era de 37%.
Em matemática os
resultados são mais chocantes: 42% e 5,8%, respectivamente.
É
falha grave, especialmente quando se considera que a educação é, ou deveria
ser, o que americanos chamam de "level playing field" —ambiente que
prepara indivíduos para competir em igualdade de condições, ou, ao menos, que
permite o desenvolvimento máximo de aptidões.
Se
o país não consegue manter um nivelamento mínimo, compromete-se a mobilidade
social. É necessário que cada geração tenha perspectivas realistas de
conquistar um futuro mais próspero. O poder público brasileiro, entretanto, não
tem conseguido cumprir essa tarefa essencial para reduzir desigualdades.
Houve
avanços, por óbvio, como a universalização do acesso à educação. Hoje, a maior
dificuldade é a evasão, que
ocorre principalmente no ensino médio.
Em
relação à aprendizagem, observou-se algum progresso ainda concentrado nos anos
iniciais do ensino fundamental. Nessa etapa, quase 70% dos alunos da rede
pública têm domínio adequado da língua portuguesa (nas particulares, 90%).
A
melhoria qualitativa precisa ser a obsessão de todos os gestores em todos os
níveis de ensino. Existem experiências de sucesso em várias partes do país que
podem e devem ser reproduzidas.
Fazê-lo não é só o caminho para tornar o Brasil mais rico, mas um imperativo moral. É algo que devemos às próximas gerações.
Lula escolhe seu inimigo
O Estado de S. Paulo
Novo ministro da propaganda diz que o governo
está em guerra contra as ‘big techs’ porque ‘a mentira nos ambientes digitais
ameaça a humanidade’ – e só Lula, claro, é capaz de salvá-la
Cumprindo rigorosamente o que foi chamado a
fazer, o novo ministro-chefe da Secretaria de Comunicação Social da Presidência
da República, Sidônio Palmeira, anunciou que o governo de Lula da Silva está em
guerra contra as “big techs” para salvar a humanidade.
É o que se depreende do discurso de posse do
marqueteiro, que não tem experiência nenhuma em administração pública nem em
comunicação institucional, mas conhece como poucos os truques da parolagem
eleitoreira e a cabeça de Lula. É a transformação da Secretaria de Comunicação
Social em Ministério da Propaganda.
Inventar um inimigo insidioso para gerar medo
e galvanizar eleitores é uma estratégia manjada no manual do populismo
autoritário. Se “a mentira nos ambientes digitais fomentada pela extrema
direita cria uma cortina de fumaça na vida real, manipula pessoas inocentes e
ameaça a humanidade”, como discursou Palmeira, então urge que se dê total apoio
a Lula, já que o demiurgo petista se apresenta como o líder natural dessa
resistência ao mal existencial causado pelas insaciáveis “big techs”.
Eis aí o lulopetismo em estado puro. Para
essa turma, “embate político” no ambiente digital significa estigmatizar tudo o
que desagrada a Lula, ao governo e ao PT como “fake news”, “desinformação” e,
no limite, “ataque à democracia”, o que beira o ridículo. Isso ficou cristalino
no discurso de Palmeira, sobretudo quando ele afirma que “a população não
consegue ver o governo em suas virtudes” porque, no seu entender, há uma
“cortina de fumaça” causada pelas “fake news” que impede que as informações
sobre as maravilhas do governo Lula cheguem aos brasileiros. Em tom
grandiloquente, o novo ministro atribuiu à comunicação institucional um papel
que ela não tem, qual seja, o de ser a “guardiã da democracia” em face do que
ele classificou como o “faroeste” que, em sua visão, impera nas redes sociais.
Em outras palavras, o governo Lula se
apresenta não só como portador da “verdade” contra as “mentiras” de seus
opositores nas redes sociais, mas também como o xerife que enfrentará os
bandidos no tal “faroeste” da internet. E o presidente já encarnou esse papel,
ao dizer que sancionou a nova lei que proíbe celulares nas escolas para
“enfrentar a revolução da mentira” e das “fake news”, promovida por “gente que
não presta e mente descaradamente”. “É por isso que nós tomamos a decisão de
proibir celular na educação. A gente proibiu para defender as nossas crianças.
A gente proibiu para defender os nossos professores. Para defender a nossa
educação. Nós queremos continuar humanistas, nós não queremos virar algoritmos
nesse mundo.”
Ora, a nova lei não se presta a isso, e sim a
resguardar o processo de aprendizagem, o que inclui, fundamentalmente, o
respeito e a valorização do trabalho dos professores em sala de aula e a
atenção total do aluno ao que ali se ensina, sem distrações.
Para os petistas, contudo, a verdade factual
nunca importou – e, em muitos casos, é considerada um estorvo. Note-se que na
mesma cerimônia em que o ministro Sidônio Palmeira anunciava sua guerra sem
quartel contra a desinformação, seu antecessor, Paulo Pimenta, se referiu ao
impeachment constitucional da presidente Dilma Rousseff como “golpe” – uma
“fake news” que os petistas repetem incessantemente na expectativa de que se
torne verdade. Pimenta se disse “petista raiz”, mas nem precisava.
Já deu para perceber, portanto, qual será a
estratégia do lulopetismo na segunda metade do mandato de Lula: inventar uma
guerra contra os magnatas estrangeiros da internet para que se pare de falar em
inflação, contas públicas deterioradas e dificuldades na articulação política.
Mais uma vez, cria-se a “narrativa” de que a democracia está em risco e que
apenas Lula é capaz de salvá-la. Ou seja, sem ter o que entregar de concreto
como realização de seu governo para reivindicar um novo mandato na eleição de 2026,
resta a Lula a mistificação, sua especialidade.
Não foi por falta de aviso
O Estado de S. Paulo
Proposta de pagamento de dívidas estaduais
criada pelo Senado e sancionada por Lula não agrada a governadores dos Estados
endividados, que mais parecem buscar perdão, e não renegociação
O governo Lula da Silva deve estar
arrependido de ter assentido com a possibilidade de renegociar a dívida dos
Estados mais encalacrados do País. A despeito das generosas condições
oferecidas pela União, os Estados, para surpresa de ninguém, não ficaram satisfeitos.
Querem mais, e é bem possível que consigam, seja via Legislativo, seja com a
ajuda do Judiciário.
Se todos os Estados aderirem ao programa, a
União terá de arcar com até R$ 106 bilhões nos próximos cinco anos. Atualmente,
a dívida está em cerca de R$ 760 bilhões, mas quatro Estados respondem por 90%
do valor e seriam os principais beneficiários da negociação: São Paulo, Rio de
Janeiro, Minas Gerais e Rio Grande do Sul.
O projeto foi elaborado pelo presidente do
Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), que priorizou critérios para atender Minas
Gerais. Mas, durante a tramitação, o Legislativo acatou sugestões dadas por
outros Estados endividados e por aqueles que não apresentavam dificuldades
financeiras, mas que viram no texto uma oportunidade de obter receitas extras
por meio de um fundo de equalização.
Como era previsível, os Estados exageraram. E
o governo Lula da Silva, ainda que tenha mantido a essência gastadora do
projeto, como a possibilidade de reduzir de 4% para zero a taxa de juros das
dívidas estaduais, mantendo apenas a correção pela inflação, acabou por vetar
os trechos mais escandalosos.
Entre eles está o que previa acúmulo de
benefícios entre o programa anterior e o que acaba de ser criado, o que faria
com que a União continuasse a arcar com dívidas estaduais com bancos e
organismos multilaterais. O outro é o que possibilitaria o abatimento das
parcelas com o uso de recursos de um fundo criado na reforma tributária para
incentivo a regiões mais pobres.
Foi o suficiente para revoltar os
governadores – e produzir verdadeiras pérolas. Nas redes sociais, o governador
de Minas Gerais, Romeu Zema, disse que o Executivo federal “quer que os Estados
paguem a conta de sua gastança”, sem mencionar que o Estado ficou anos sem
pagar sua própria dívida.
Em luto, o governador do Rio de Janeiro,
Cláudio Castro, afirmou ser um “dia triste para o federalismo brasileiro”, que
teria sido “golpeado pelas costas”. Cobrou ainda “espírito público” dos
conselheiros do presidente Lula da Silva. “Essa ideia de um único país, um
único povo, foi abandonada definitivamente”, lamentou, omitindo o calote que
deu na União quando privatizou a Cedae.
Mais contido, o governador do Rio Grande do
Sul, Eduardo Leite, anunciou ter recebido “com extrema preocupação e
indignação” os vetos presidenciais e cobrou a manutenção da suspensão da dívida
do Estado por três anos em razão das enchentes que afetaram o Estado no ano
passado.
Por óbvio, nenhum deles destacou as enormes
vantagens da proposta, como pagar um empréstimo sem juros ao longo de 30 anos,
condição que apenas os pais oferecem aos próprios filhos. Tampouco lembraram
que o Tesouro tem emitido títulos a uma taxa média de juros de quase 8% ao ano,
o que significa que as condições anteriores à sanção da lei já são bastante
interessantes.
A julgar pelas declarações dos governadores
Romeu Zema, Cláudio Castro e Eduardo Leite, eles não almejam uma renegociação
de suas dívidas, mas sim o perdão. Para isso, os três prometem mobilizar suas
bancadas na Câmara e no Senado para convencer o Congresso a derrubar os vetos.
Em meio à gritaria, o eloquente silêncio do
governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, expôs um racha no grupo e mostrou
que nem todos estão dispostos a comprar uma briga tão desarrazoada. Todos os
outros 22 Estados e o Distrito Federal não acumulam dívidas tão relevantes, mas
provavelmente vão analisar a possibilidade de aderir.
É bom lembrar a origem desse imbróglio. Tudo
começou com a ideia – provavelmente tida como genial – do Programa “Juros por
Educação”, por meio do qual o governo pretendia reduzir, por cinco anos, as
taxas que corrigem a dívida dos Estados a 2% ou 3% para aqueles que se
comprometessem a criar vagas na educação profissional técnica e a ampliar o
ensino médio integral. Deu no que deu.
Sobra dinheiro nos tribunais
O Estado de S. Paulo
Magistrados do TJ-MT, por exemplo, ganham até
8 vezes o teto, em afronta à Constituição
Este jornal tem noticiado nos últimos dias
que juízes em diversos tribunais de Justiça do País receberam na reta final de
2024 salários e benefícios que, somados, superam em muito o teto dos
vencimentos no funcionalismo público, que é de R$ 44 mil, valor pago aos
ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), conforme estabelece a
Constituição. Parece notícia velha, mas não é: a lei e a moralidade continuam a
ser letra morta quando o assunto é a remuneração de magistrados. Se está
sobrando dinheiro no Judiciário brasileiro, como parece que está, então está
mais do que na hora de realizar cortes e impor aos tribunais o mesmo sacrifício
que o resto da sociedade está fazendo diante da evidente escassez de recursos.
Conforme reportagens do Estadão,
integrantes do Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJ-MT) ganharam até R$ 250
mil – oito vezes o limite constitucional. Lá, todos os 39 desembargadores
receberam contracheques muito além do teto. No Tribunal de Justiça de Alagoas
(TJ-AL), os ganhos chegaram a R$ 438 mil. Já no Tribunal de Justiça de Rondônia
(TJ-RO), um juiz aposentado por invalidez levou R$ 486 mil em razão de direitos
eventuais.
O eventual, aliás, virou rotineiro. Isso
ocorre porque a receita para aumentar os ganhos dos juízes é sempre a mesma:
indenizações isentas de Imposto de Renda permitem o drible ao teto – sempre com
a anuência de conselhos superiores. São os já conhecidos “penduricalhos”, pagos
a título de auxílio para alimentação, moradia e saúde, entre muitos outros. Na
iniciativa privada, a maioria absoluta dos trabalhadores, malgrado ganhe várias
vezes menos que os juízes, banca tudo isso com o próprio salário, já que não
tem direito a qualquer “penduricalho”.
Nos tribunais, há também criatividade
administrativa, como uma “folha corrente”, destinada para os salários-base, e
uma “folha complementar”, para esses “direitos eventuais”. Aliás, a maior
parcela da remuneração dos magistrados do TJ-MT, por exemplo, é depositada na
folha complementar, o que prova que a exceção agora é regra.
Naquela corte, servidores ainda receberam
salários acima de R$ 100 mil por mês, e, em dezembro, foi distribuído um
“vale-peru” de R$ 8 mil para funcionários e de R$ 10 mil para juízes, um
evidente acinte. Após a repercussão negativa, foi solicitada a devolução do
dinheiro.
Isso tudo ajuda a entender por que o TJ-MT
gasta, em média, R$ 116,6 mil por mês com a remuneração de seus magistrados,
segundo o relatório Justiça em Números 2024, do Conselho Nacional de
Justiça (CNJ). À frente está apenas o Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul
(TJ-MS), com média de R$ 120,3 mil por mês. Isso coloca os magistrados dessas
duas cortes entre os mais bem pagos do País. Ainda assim, alguns deles são
investigados em escândalo de venda de sentenças e foram afastados.
Desembargadores chegaram a usar tornozeleira eletrônica.
Logo se vê que, mesmo tendo salários e benefícios que quase ninguém mais tem no País, há gente insaciável no Judiciário.
Tragédias da chuva seguem a desafiar governos
Correio Braziliense
Os dramas enfrentados pela população durante
os meses de verão tornaram-se tradição. Mas o comportamento do poder público
pouco, ou nada, é alterado
Todos os anos, as tragédias causadas pelas
chuvas intensas de verão se repetem. Os dramas enfrentados pela população
tornaram-se tradição. Mas o comportamento do poder público pouco, ou nada, é
alterado. Ao longo dos meses, as iniciativas para retirar as comunidades de
áreas de risco não ocorrem, e, com a chegada da estação mais quente do ano, a
situação agrava-se cada vez mais.
Em Minas Gerais, o cenário de 2025 é sério e
preocupante. Até agora, as chuvas provocaram a morte de 25 pessoas e 58 cidades
estão em situação de emergência, segundo boletim da Defesa Civil estadual,
divulgado nesta terça-feira. O Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet) havia
previsto chuvas intensas, com grau de severidade, não só em Minas Gerais, mas
também lançado alerta para o Distrito Federal e dezenas de municípios de Goiás.
Além dessas unidades da Federação, outras 12 sofrem com as chuvas intensas.
No DF, os fortes temporais causaram muitos
transtornos aos brasilienses e danos materiais em diversas regiões
administrativas, como queda de muro, alagamento em residências, com perdas de
móveis e objetos, e carro engolido por crateras. Diferentemente de outros
estados, não houve registro de morte decorrente das fortes pancadas de chuvas.
Diante dessas previsões, a Defesa Civil
Nacional, por orientação do Ministério da Integração de Desenvolvimento
Regional, tem estabelecido contato com os governos estaduais, principalmente de
Minas Gerais, São Paulo e Bahia, cujos municípios foram severamente afetados.
Levantamento do Conselho Nacional de
Municípios mostra que, de dezembro até agora, fortes temporais causaram R$ 94,4
milhões de prejuízos aos cofres municipais; R$ 21,1 milhões no setor
habitacional, sendo 2 mil casas danificadas ou destruídas; e R$ 88,6 milhões de
prejuízos ao setor privado, devido aos danos causados na agricultura, na
pecuária, na indústria, no comércio e em outros.
Entre abril e maio do ano passado, o Rio
Grande do Sul enfrentou uma das maiores catástrofes da sua história, provocada
pelos temporais que inundaram 441 municípios (95%) do estado, inclusive, a
capital, Porto Alegre. O episódio de origem natural e antrópica, provocado pelo
El Niño, elevou o volume de chuvas no Sul do país, que foram intensificadas
pelas mudanças climáticas. Ficou constatado que problemas com a manutenção dos
diques de prevenção de enchentes e a ausência de planos de ação voltados para as
mudanças do clima potencializaram os efeitos das enchentes. Mais de 600 mil
pessoas ficaram desabrigadas e 179 morreram.
Embora o negacionismo em relação às mudanças climáticas domine parcela expressiva da sociedade brasileira e mundial, seus impactos vieram para ficar. Essa realidade impõe ao poder público brasileiro uma revisão do modelo de gestão, já criticada pela lentidão de respostas e outras inabilidades. Não dá mais para manter na invisibilidade as áreas de riscos ocupadas pelos mais vulneráveis social e economicamente. Pontes caem, rodovias sem manutenção derretem, encostas desabam, casas com estruturas comprometidas são desmontadas pela força das águas repetidamente. As advertências dos fenômenos climáticos naturais exigem dos governos políticas públicas compatíveis com as transformações impostas pelo novo normal.
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