Juliana Elias, Rodrigo Pedroso e Denise Neumann
SÃO PAULO Assembleia dos metroviários de São Paulo na semana passada decidiu adiar para esta semana uma eventual greve
A inflação mais alta e atividade econômica ainda fraca têm dificultado as negociações salariais de diversas categorias neste começo de ano. As consequências aparecem no menor ganho real, mas também no atraso das negociações entre sindicatos e empresas, que, em muitos casos, estão levando de um a dois meses. No período março a maio, um terço dos acordos salariais coletivos registrados no Ministério do Trabalho não pagou aumento real, uma mudança em relação aos anos anteriores, quando mais de 90% das negociações era concluída com reajustes acima da inflação.
Em parte das categorias que já concluíram as negociações para os salários de 2013, os reajustes deste ano foram maiores que os do ano passado, mas a diferença serviu basicamente para cobrir a inflação - em abril do ano passado, o Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC), índice de preços do IBGE usado como base na maioria dos contratos, acumulava variação de 4,88% em 12 meses; em abril deste ano, já estava em 7,16%.
Como consequência, no trimestre março-maio, um terço de 60 convenções coletivas de trabalho protocoladas no Ministério do Trabalho não garantiu aos trabalhadores aumento real ou ele foi inferior a 0,1%. O levantamento considerou categorias cuja data-base fica entre março e maio e descontou a inflação pelo INPC, mais usado nas negociações salariais. Neste período, a maior parte das categorias com acordos registrados pertence ao setor de serviços (incluindo transporte e construção), mas um terço é de trabalhadores na indústria, ainda que a maioria seja de pequenos sindicatos.
Entre os 60 acordos, a maioria dos dois terços que conseguiram aumento real acertaram um percentual acima da inflação inferior a 1% (reajustes com 0,2% acima da inflação já foram considerados como ganho real) e uma parcela menor (15) garantiu reajuste real acima de 1%. Outra novidade dos acordos desse período foi a volta dos reajustes escalonados. Entre os 60 acordos, oito pagaram reajustes maiores para os menores salários e menores para os mais altos.
Entre as categorias sem aumento real este ano estão calçadistas de Sobral e vestuário em Juazeiro, ambas no Ceará, metalúrgicos de pequenas e médias empresas de Campo Grande, no Mato Grosso, calçadistas do interior de Pernambuco, asseio e conservação no Amazonas, químicos do interior de Minas Gerais, entre outras. Os reajustes menores já refletem no rendimento médio. De acordo com o IBGE, em abril deste ano ele era 1,6% maior que em igual período do ano passado, quando foi 6,2% superior ao de um ano antes.
"Percebemos que as negociações estão demorando mais para sair neste ano, reflexo da inflação alta, que puxa os ajustes para cima, e também de uma atividade mais baixa", disse Ana Maria Castelo, coordenadora de pesquisas na área de construção da Fundação Getulio Vargas (FGV), e que acompanha as negociações dos sindicatos do setor em sete capitais. No Rio de Janeiro, por exemplo, o aumento para os trabalhadores da construção, que foi de 9% no ano passado, passou para 9,5% neste ano, e, em São Paulo, foi de 7,47% para 8,99%. Em Salvador, houve atraso de três meses, e o aumento de 9% só saiu em março e praticamente repetiu os 8,93% do ano passado. Em todas estas cidades, no entanto, o ganho real foi menor que em 2012.
"Este ano foi muito mais difícil. Os patrões disseram que a economia cresceu pouco, e que as vendas do setor desaceleraram", disse Antonio Ramalho de Souza, presidente do Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias da Construção Civil em São Paulo (Sintracon-SP), A primeira proposta do sindicato patronal foi de um reajuste de 5%, abaixo da inflação. "Fizemos uma advertência de greve no fim daquele mês e marcamos uma paralisação geral para 13 de maio. No dia 10 fechamos o reajuste", relata.
O mesmo aconteceu com os trabalhadores da indústria de artefatos de borracha de Americana, em São Paulo: o aumento, com data-base em junho, foi de 6,17% no ano passado, e neste ano será de 9,1%. Nos dois casos, o aumento sem a inflação foi de 2%. "As negociações foram mais difíceis neste ano", contou Edinelson Azevedo de Souza, vice-presidente do Sindicato da Borracha de Americana e Região (Sindborr), que representa os 2.500 funcionários da Goodyear.
Em São Paulo, a ausência de um acordo com o Metrô e a Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM) pode levar os trabalhadores das duas empresas à greve. Além de uma recomposição de 7,3% da inflação até abril, o sindicato que representa os 9 mil funcionários do Metrô paulista pede um ganho real de 14,15%, com base no aumento de produtividade dos últimos três anos. Na outra negociação, a CPTM oferece - e já negociou com dois sindicatos - um reajuste de 6,97%, o que, segundo a empresa, garante aumento real de 1% pelo Índice de Preços ao Consumidor (IPC) da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe).
No caso do setor de energia, a perda de receita das companhias com a redução das tarifas de energia elétrica, em janeiro, tem tornado o pleito sindical mais difícil. "A inflação não é a nossa preocupação. Discutir recomposição da inflação é coisa do passado, isso tem que ser automático. A nossa preocupação é o ganho real", diz Carlos Reis, presidente do Sindicato dos Eletricitários de São Paulo (Stieesp), que representa 8 mil trabalhadores no Estado, entre eles os da Eletropaulo, Cteep, Furnas e Elektro. "O faturamento dessas empresas caiu na faixa dos 30%. Elas estão mais resistentes, dizem que estão apertadas", explica Reis.
O Stieesp pede um ganho real de 4%, além da recomposição dos 6,68% da inflação em 12 meses até abril, segundo o ICV, do Dieese. As negociações são feitas por empresa, e ainda estão em andamento.
A previsão do Sindicato dos Eletricitários de Campinas é que o reajuste aos trabalhadores de todo o setor elétrico paulista neste ano fique abaixo dos 7,7% registrados no ano passado, apesar da inflação mais alta este ano. Segundo Gentil Teixeira de Freitas, presidente do sindicato, o cenário para a negociação salarial "está mais duro". "Resolvemos unir todas as categorias do setor. Além de a economia ter crescido pouco ano passado, as geradoras vão querer usar a diminuição na tarifa da energia elétrica para baixar o reajuste. As distribuidoras devem ir pelo mesmo caminho, mas dizendo que o resultado foi afetado pelo acionamento das térmicas, mais caras", afirma.
Quem destoou da maioria foram os motoristas de ônibus da cidade de São Paulo. O acordo foi considerado "mais fácil de ser obtido do que ano passado" por Nailton Francisco de Souza, diretor do sindicato da categoria. O acordo permitiu aumento real de 3,53%, acima do 1,5% obtido em 2012.
Para Souza, a entrada da Prefeitura nas negociações ajudou no acordo. "Como também haverá o reajuste nos preços das passagens, a prefeitura mostrou, em um estudo técnico, a viabilidade do aumento pedido pela categoria. Apesar de a negociação ser direta e não envolver o poder público, neste ano houve interferência para evitar uma paralisação", afirma.
Valor Econômico
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