sexta-feira, 24 de fevereiro de 2017

BC pode acelerar e estender ciclo de baixa dos juros – Editorial | Valor Econômico

O Banco Central vislumbra a possibilidade de uma queda mais intensa dos juros no atual ciclo ou estender o período de distensão monetária indo mais longe do que previa no início do ciclo. Não são coisa semelhantes e têm implicações de curto prazo diferentes, mas indicam que o BC tateia a possibilidade de levar a taxa de juros ao menor nível possível compatível com a inflação ancorada e estável.

Enquanto que a intensidade da queda dos juros - aumentar a magnitude do corte para além de 0,75 ponto percentual - possa ser feita no futuro próximo, a extensão do ciclo de baixa se aproxima de um experimento de tentativa e erro, pois envolve variáveis não observáveis e para as quais há dispersão significativa na mensuração - a taxa de juro de equilíbrio e o produto potencial.


O Comitê de Política Monetária reservou os últimos parágrafos de seu comunicado após a reunião que derrubou a taxa Selic para 12,25% para contemplar a expectativa do mercado, que sugere haver muito espaço para a queda dos juros, e insinuar um limite a esse movimento. Segundo o Copom, a "possível intensificação do ritmo de flexibilização monetária dependerá da estimativa da extensão do ciclo, mas, também, da evolução da atividade econômica, dos demais fatores de risco e das projeções e expectativas de inflação". Já a extensão do ciclo "dependerá das estimativas da taxa de juros estrutural da economia brasileira, que continuarão a ser reavaliadas ao longo do tempo".

No jargão, para atingir determinado "orçamento" de juros se pode caminhar mais ou menos rapidamente, de acordo com as condições dadas. Mas esse "orçamento" pode ser maior e seu estado ótimo seria o juro de equilíbrio - a taxa mantém a inflação estável com um crescimento igual ao potencial.

O "orçamento" do Copom pode coincidir com a baliza dos cenários de referência do mercado, nos quais a inflação atinge 4,2% e 4,5%, respectivamente este ano e em 2018, com taxa Selic de 9,5% e 9% - isto é, com juro real na casa dos 4,5%. Os cálculos variam muito, mas para vários analistas o país já teria atingido a taxa de equilíbrio nesse nível. Que é alto, embora metade do que foi de 2002 a 2004 (9,3%) e inferior ao de 2005-2008, de 8,8%, segundo paper de técnicos do Fundo Monetário Internacional ("Variação temporal da taxa de juros neutra: o caso brasileiro"). Para o período 2010-2013, eles apontaram taxa de 3,5%, muito baixa para o Brasil, mas, ainda assim, a maior taxa entre 25 países emergentes.

Muitas variáveis influenciam na taxa de juro de equilíbrio: a política fiscal, o nível de poupança doméstico (quanto maior, menor o juro neutro), o histórico de inflação e de sua volatilidade, a penetração do crédito, o nível de risco do país, políticas que afetem o mecanismo de transmissão da política monetária e juros internacionais.

A taxa neutra de juros caiu ao longo do tempo porque o país conseguiu domar sua dívida pública, o risco-país desabou e a política fiscal, até 2011 pelo menos, foi responsável, enquanto que os juros nas economias avançadas foram a zero. Tudo mudou, porém, desde 2011, a começar pela inflação desancorada, pela irresponsabilidade fiscal, pela elevação descontrolada da dívida pública e pelos estímulos de crédito público.

E em que nível estaríamos agora? "As políticas fiscais e creditícias anticíclicas elevaram novamente a taxa de juro neutra", escreveu o presidente do BC, Ilan Goldfajn, em 2011 ("A longa travessia para a normalidade: os juros reais no Brasil"). Nele, Ilan constata que estimar o juro de equilíbrio é um exercício inseguro. Mas isso não deve amarrar as mãos do BC. "O melhor que a autoridade monetária pode fazer é conduzir a política monetária de forma pragmática, avaliando continuamente o impacto de suas ações sobre a economia", disse. Ilan então dava ênfase à uma politica fiscal conservadora, que buscasse "redução permanente da taxa de crescimento dos gastos correntes". Diante da pouca precisão das estimativas das taxas naturais de juros, "os desvios da inflação esperada (ou da inflação efetiva) em relação à meta e as variações da taxa de desemprego são as variáveis que devem ter peso maior nas mudanças da taxa de juros".

Dessa forma, o BC vai continuar jogando cautelosamente os juros para baixo, podendo até mesmo acelerar os cortes mensais Mas, além disso, está corretamente, olhando mais à frente do que o cumprimento de uma meta de inflação ainda alta, de 4,5%.

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