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O que diz a Constituição é quase letra morta
Fica combinado assim: este é o governo que mais emprega militares da ativa e da reserva desde o fim da ditadura de 64, mas nem por isso as Forças Armadas o apoiam ou com ele se confundem. As Forças Armadas são uma instituição do Estado.
O fato de serem militares todos os ministros com gabinetes no Palácio do Planalto não quer dizer nada, tampouco que o presidente seja um ex-capitão afastado do Exército por indisciplina, e o vice-presidente um general da reserva.
Há quase 3 mil militares em demais escalões da administração pública federal – só no Ministério da Saúde, comandado por um general de brigada, são mais de 20. Fez-se uma versão branda da reforma da Previdência só para beneficiar os militares. Mas, e daí?
Quer dizer nada. Como nada quer dizer um reajuste salarial que está sendo concedido aos oficiais das três armas no momento em que falta ao governo dinheiro para gastar com a pandemia que já matou quase 73 mil brasileiros e infectou mais de 1,8 milhão.
Por sinal, quando assumiu o Ministério da Saúde como ministro interino, o general Eduardo Pazuello, especialista em logística, herdou 14 mil mortos dos que o antecederam no cargo. Tentou esconder os números sobre mortos e contaminados.
Não se acanhou de regulamentar o uso da cloroquina no tratamento de doentes, embora no resto do mundo a droga tenha sido desprezada porque não serve para a cura do vírus. A remessa de remédios e equipamentos aos Estados também não funcionou.
Do contrário, o coronel, braço direito do general, não teria orientado governadores e secretários de Saúde a irem às compras mesmo pegando preços superfaturados. Aconselhou-os a pagarem o quanto for, denunciando depois os vendedores à justiça.
É por tais razões que as Forças Armadas reagiram com uma dura nota assinada por seus três comandantes, além do general que é ministro da Defesa, à crítica do ministro Gilmar Mendes de que o Exército associou-se ao genocídio do Covid-19.
“Comentários dessa natureza, completamente afastados dos fatos, causam indignação. É uma acusação grave, além de infundada, irresponsável e, sobretudo, leviana. O ataque gratuito a instituições de Estado não fortalece a democracia”, diz a nota.
Gilmar não atacou o Exército. Atacou o governo por associar sua imagem à imagem do Exército na política genocida de combate ao coronavírus. O Ministério da Defesa pedirá à Procuradoria-Geral da República “a adoção de medidas cabíveis” contra Gilmar.
Há poucos meses, os militares se revoltaram com a comparação feita pelo ministro Celso de Mello, colega de Gilmar no Supremo Tribunal Federal, entre o momento que o Brasil atravessa com o momento que antecedeu a ascensão do nazismo na Alemanha.
Se apenas o governo tivesse ficado furioso com a comparação feita por Celso e a crítica feita por Gilmar, seria compreensível. Mas por que as Forças Armadas reagiram tão mal às palavras dos dois ministros se elas nada têm a ver com o governo?
A continuarem a tomar as dores de um governo que não apoiam nem representam, reforçarão as suspeitas de que o apoiam, sim, de que com ele se identificam, e de que essa história de “instituições do Estado”, como está na Constituição, não passa de letra morta.
Sem vacina contra o coronavírus, adeus carnaval!
Doença ameaça a folia
Quem disse primeiro foi o prefeito Bruno Covas (PSDB), de São Paulo: carnaval vai depender do recuo da pandemia. Depois foi ACM Neto (DEM), prefeito de Salvador. Agora, Mangueira, Imperatriz Leopoldinense, Vila Isabel, São Clemente e Beija-Flor, escolas de samba do Rio, anunciaram: sem vacina, adeus desfile.
ACM Neto acha difícil esperar até agosto para que se tome uma decisão a respeito. “Antes disso, muitas ações de investimento terão que ser adotadas, bem como liberação de recursos para as agremiações”, explica. “E se o vírus não for detido? E se a Justiça, mais adiante, proibir o carnaval? O prejuízo será grande”.
No caso das escolas de samba do Rio e de São Paulo, elas dependem da mão de obra voluntária ou paga para a confecção das fantasias, adereços e carros alegóricos. São meses a fio com centenas de pessoas trancadas nos barracões. Não há como separá-las para evitar que se contaminem. E aí? O que fazer?
A José Maria da Silva Paranhos Júnior, o Barão do Rio Branco, atribui-se a frase: “Existem no Brasil apenas duas coisas realmente organizadas: a desordem e o carnaval”. E morreu aos 66 anos de idade às vésperas do carnaval de 1902. O presidente Hermes da Fonseca transferiu a folia para o início de abril.
Foi o ano de dois carnavais. O primeiro depois da missa de sétimo dia de Rio Branco. O segundo, na nova data marcada pelo governo ainda de luto. Parecia impossível haver carnaval em 1919 porque no ano anterior a gripe espanhola dizimara 50 milhões de pessoas no mundo. No Rio, cadáveres foram recolhidos nas ruas.
Pois se brincou carnaval, sim, em 1919 – e que carnaval! Conta a história: “Os desfiles das grandes sociedades tiveram a doença como tema. Os Fenianos exibiram um carro com caveiras que representavam a “dançarina espanhola”, cercada de pierrôs, arlequins e colombinas”.
Marchinha que fez sucesso dizia: “Quem não morreu da espanhola, quem dela pôde escapar, não dá mais tratos à bola, toca a rir, toca a brincar”. Segundo o escritor Nelson Rodrigues, “a espanhola trouxera no ventre costumes jamais sonhados. E, então, o sujeito passou a fazer coisas, a sentir coisas inéditas e demoníacas”.
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