Por Claudia Safatle | Valor Econômico
BRASÍLIA - As notícias são boas, mas não permitem enxergar longe. A economia ensaia a recuperação, mas a geração de empregos vai demorar um pouco mais para acontecer. A retomada da atividade é cíclica, oriunda da ampla capacidade ociosa acumulada pela maior recessão de que se tem informações no país. Daí a se transformar em um ambiente onde os investimentos serão os protagonistas do crescimento, vai uma distância considerável.
Para isso, será preciso vencer novos "rounds" de uma luta que apenas começou, com a aprovação de reformas constitucionais. A que instituiu o teto para o aumento do gasto público para os próximos vinte anos foi importantíssima, mas será letra morta se não for aprovada a PEC da Previdência. A reforma da Previdência, porém, não é suficiente para restabelecer a política de geração de superávits primários das contas públicas, sem o que não se garante a redução da dívida bruta como proporção do PIB, que é o objetivo final da política fiscal.
O governo do presidente Michel Temer, reformista, termina no fim de 2018. Em outubro do ano que vem o país vai eleger um novo mandatário. Quem for escolhido dará os contornos da política econômica que será trilhada e disso dependerá um novo ciclo de crescimento e desenvolvimento econômico.
Caminhos alternativos foram seguidos e levaram à desastrosa queda de cerca de 7% do PIB em dois anos e à contração de mais de 9% do PIB per capita de 2014 para cá. Um retrocesso irrecuperável. É hora de perseverar em uma agenda que desobstrua a livre iniciativa dos embaraços macro e microeconômicos, oxigene a atividade produtiva com a concorrência e a abertura comercial e dê horizonte de solvência ao endividamento público.
A devastação de biografias decorrente da operação Lava-Jato resultou em uma gama de candidatos à Presidência da República "sub judice", abrindo a possibilidade de um temido roteiro de aventuras políticas. Essa incógnita no quadro político pode gerar um outro complicador, se a retomada dos investimentos for adiada para 2019, quando se saberá se o presidente eleito levará adiante ou não um programa de reformas que eleve a produtividade da economia e recoloque o país no rumo da prosperidade.
A sucessão presidencial é, hoje, uma grande incerteza para os investidores pelo receio de que populistas de esquerda ou de direita possam ser vitoriosos.
É praticamente um consenso entre os economistas do governo e do setor privado de que haverá, neste ano, crescimento ainda que modesto e uma performance um pouco mais animadora em 2018. A expectativa é de que a retomada da atividade seja bastante gradual, mais forte no segundo do que no primeiro semestre, chegando ao fim do exercício com uma taxa anualizada de uns 2,5%. Para 2018, a expansão do PIB é estimada em algo em torno desse mesmo patamar.
Vencida a recessão, a inflação tende a ficar bem comportada nos próximos anos. As expectativas do mercado, registradas na pesquisa Focus do Banco Central, estão abaixo da meta de 4,5% para este ano (4,04%) e para 2018 (4,32%) e ancoradas na meta até o ano de 2021. O governo deve, inclusive, reduzir a meta de inflação a partir de 2019, retomando o processo de desinflação paralisado desde 2005.
Os juros básicos da economia (Selic) podem, finalmente, cair para a casa dos 8,5% este ano, levando as taxas reais para níveis bem mais módicos de forma sustentável. E há a expectativa de que o Comitê de Política Monetária (Copom) acelere o cortes de juros na reunião de maio.
Para os 14,2 milhões de brasileiros desempregados durante a severa recessão, essas são notícias positivas mas que ainda não lhes darão conforto. É sabido que o mercado de trabalho é o último a se deteriorar em um processo recessivo e é, também, o último a melhorar na retomada da economia. Duas reformas recém aprovadas, a que regula a terceirização e a trabalhista, devem reduzir o custo do emprego para as empresas, mas isso não significa que elas vão voltar a contratar no curto prazo. Uma questão importante que emerge nesse cenário é sobre se os empregos voltarão antes das eleições presidenciais de 2018. Isso fará toda a diferença na campanha sucessória.
Conta-se, também, com a possibilidade de uma modesta recuperação do consumo das famílias, até agora retraídas pelo elevado endividamento e pelo receio do desemprego. Mesmo quem não ficou desempregado teve medo de gastar e, com os primeiros indícios de que há uma recuperação em curso, esse temor deve se dissipar. Ademais, a queda acelerada da inflação nos últimos meses está produzindo uma recuperação real de salários que pode embalar um aumento da vendas de bens e serviços.
O crédito, que desabou nos últimos anos - de 54% do PIB em dezembro de 2015 para 48,6% do PIB em março último - começa a dar sinais de vida com a redução da taxa de juros e do endividamento das famílias. Os indicadores são incipientes, mas os sinais são positivos. Em março o estoque de empréstimos e financiamentos cresceu 0,2% se comparado a fevereiro. Os juros médios do crédito livre e os spreads bancários tiveram uma leve queda, em um primeiro movimento de alívio desde que a taxa Selic começou a cair, em outubro de 2016. Mesmo assim, não se espera incentivos à atividade pela expansão do crédito, que deverá crescer este ano bem abaixo da inflação.
Se a desalavancagem das famílias está em estágio avançado, o mesmo não se pode dizer sobre o endividamento das empresas. Foram várias renegociações de dívidas bancárias e, como disse uma fonte oficial, "a cobra ainda vai ter que digerir o mamute". Isso, associado à queda da rentabilidade por conta dos aumentos reais de salários bem acima dos ganhos de produtividade, também pode atrasar a expansão dos investimentos.
O impulso de crescimento, portanto, tende a vir do afrouxamento monetário, da aprovação de ajustes e reformas e do progresso nas concessões de obras de infraestrutura.
O reequilíbrio das contas públicas será o grande desafio para os próximos anos. A dívida pública bruta prossegue em trajetória ascendente. Bateu recorde de 71,6% do PIB em março e deverá crescer para 72,4% em abril. Esse, que é o principal indicador de solvência do país, vai demorar um par de anos para bater no teto e começar a cair. Projeções oficiais indicam que em 2019 a dívida estará próxima a 80% do PIB.
Reverter esse sinal exige a recuperação da política de superávits primários e, para isso, o governo terá que cortar despesas hoje obrigatórias e, dependendo do comportamento das receitas tributárias, elevar impostos.
Do lado das contas externas, a situação é confortável. O superávit comercial garantiu um déficit de apenas 1,1% do PIB em doze meses até março. A taxa de câmbio flutua ao redor de R$ 3,10 e deve permanecer valorizada ao longo do ano.
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