quarta-feira, 12 de março de 2025

A revolução de Trump e a economia - Vinicius Torres Freire

Folha de S. Paulo

Governo americano diz que risco de PIB menor não vai parar revolução reacionária

Três das maiores companhias aéreas dos Estados Unidos disseram que estão vendendo menos passagens. Os três principais índices de Bolsas recuaram para níveis de setembro de 2024. Podem ser níveis ainda altos, talvez exagerados. Mas nas ações está parte gorda da poupança das famílias. Uma baixa mais duradoura causa sensação de empobrecimento e, pois, redução do consumo.

Quase não há dia em que não se leia algum indicador indireto ou setorial de que a confiança do consumidor caiu e aparece menos em lojas e restaurantes; de que as encomendas das empresas estão menores. Não é de hoje que inadimplência e endividamento estão em níveis suspeitos. Emprego e investimento recentemente dependeram muito do gasto público, que agora em tese será cortado.

Em um mundo que não vivesse sob o espectro de Donald Trump, tais indícios não causariam tanta apreensão. Jerome Powell, presidente do Fed, o Banco Central dos EUA, não deu bola. Disse que esses indicadores antecedentes e similares muitas vezes não indicam nada. Mas talvez Powell tenha apenas tentado levar o mercado no gogó, evitando chancelar baixas de juros precoces.

Se é cedo para saber até do efeito dos impostos de importação de Trump (quantos, onde, por quanto tempo, de qual tamanho), que dirá do resto da política econômica. Nada se sabe de impostos, do que será feito dos enormes déficits e dívida americanos, da independência do Fed, da confiança dos credores externos na dívida pública, do que seria a grande desregulamentação.

Por ora, sabe-se apenas que o desmonte estatal é desordenado, amador, conduzido por um oligarca autoritário e que ajuda a derrubar consumo e confiança econômica (entre servidores, universidades, outras instituições e empresas contratadas pelo governo).

O debate sobre o desaquecimento da economia americana é também uma discussão sobre o risco de desordens maiores, conflitos econômicos e quem sabe guerras, frias ou quentes. Uma economia em baixa ou sob risco de baixa maior vai fazer com que Trump recue, por medo de perder eleições, ou se torne ainda mais violento, dentro e fora dos Estados Unidos? Vide o que fez com a Ucrânia.

Joe Biden perdeu a eleição também por causa da baixa recorde da confiança dos consumidores, diminuída fato de os salários terem tido ganhos mínimos e tardios sobre a inflação recorde em quatro décadas. É discussão quase banal sobre a influência de algum aspecto da economia sobre resultados eleitorais.

No caso de Trump, o buraco fica mais para baixo. Desta vez, variações de preços, renda, emprego e Bolsas podem afetar um programa reacionário de revolução institucional e cultural nos Estados Unidos e de desmantelamento do que restava de ordem política e econômica no mundo.

Elon Musk vai cumprir a promessa de despejar dinheiro em distritos eleitorais que podem passar para democratas ou republicanos recalcitrantes? Trump tentaria medida mais agressiva contra as instituições? Começaria guerra diversionista? Parece exagero, mas ser realista hoje significa aceitar que alguém vai querer o impossível.

A perda de ritmo da economia americana será tema de discussão inconclusiva pelo menos até o final de abril, quando deve sair a primeira medida do PIB do primeiro trimestre. Mas economia será o menor dos problemas, nos EUA, pelo mundo e aqui também.

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