Folha de S. Paulo
Governo americano diz que risco de PIB menor
não vai parar revolução reacionária
Três das maiores companhias aéreas dos Estados
Unidos disseram que estão vendendo menos passagens. Os três principais
índices de Bolsas recuaram
para níveis de setembro de 2024. Podem ser níveis ainda altos, talvez
exagerados. Mas nas ações está parte gorda da poupança das famílias. Uma baixa
mais duradoura causa sensação de empobrecimento e, pois, redução do consumo.
Quase não há dia em que não se leia algum indicador indireto ou setorial de
que a
confiança do consumidor caiu e aparece menos em lojas e restaurantes;
de que as
encomendas das empresas estão menores. Não é de hoje que inadimplência e
endividamento estão em níveis suspeitos. Emprego e investimento recentemente
dependeram muito do gasto público, que agora em tese será cortado.
Em um mundo que não vivesse sob o espectro de Donald Trump,
tais indícios não
causariam tanta apreensão. Jerome Powell, presidente do Fed, o Banco
Central dos EUA, não deu bola. Disse que esses indicadores antecedentes e
similares muitas vezes não indicam nada. Mas talvez Powell tenha apenas tentado
levar o mercado no gogó, evitando chancelar baixas de juros precoces.
Se é cedo para saber até do efeito dos impostos de importação de Trump
(quantos, onde, por quanto tempo, de qual tamanho), que dirá do resto da
política econômica. Nada se sabe de impostos, do que será feito dos enormes
déficits e dívida americanos, da independência do Fed, da confiança dos
credores externos na dívida pública, do que seria a grande desregulamentação.
Por ora, sabe-se apenas que o desmonte
estatal é desordenado, amador, conduzido por um oligarca autoritário e que
ajuda a derrubar consumo e confiança econômica (entre servidores,
universidades, outras instituições e empresas contratadas pelo governo).
O debate sobre o desaquecimento da economia americana é também uma discussão
sobre o risco de desordens maiores, conflitos econômicos e quem sabe guerras,
frias ou quentes. Uma economia em baixa ou sob risco de baixa maior vai fazer
com que Trump recue, por medo de perder eleições, ou se torne ainda mais
violento, dentro e fora dos Estados Unidos? Vide o que fez com a Ucrânia.
Joe Biden perdeu a eleição também por causa
da baixa recorde da confiança dos consumidores, diminuída fato de os salários
terem tido ganhos mínimos e tardios sobre a inflação recorde em quatro décadas.
É discussão quase banal sobre a influência de algum aspecto da economia sobre
resultados eleitorais.
No caso de Trump, o buraco fica mais para
baixo. Desta vez, variações
de preços, renda, emprego e Bolsas podem afetar um programa
reacionário de revolução institucional e cultural nos Estados Unidos e de
desmantelamento do que restava de ordem política e econômica no mundo.
Elon Musk vai
cumprir a promessa de despejar dinheiro em distritos eleitorais que podem
passar para democratas ou republicanos recalcitrantes? Trump tentaria medida
mais agressiva contra as instituições? Começaria guerra diversionista? Parece
exagero, mas ser realista hoje significa aceitar que alguém vai querer o
impossível.
A perda de ritmo da economia americana será tema de discussão inconclusiva pelo
menos até o final de abril, quando deve sair a primeira medida do PIB do
primeiro trimestre. Mas economia
será o menor dos problemas, nos EUA, pelo mundo e aqui também.
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